segunda-feira, 12 de maio de 2014

[Mad Men] 7x04 The Monolith

"It's not symbolic"
"No, it's quite literal"

Ainda bem que tiveram a decência e nos pouparam de qualquer tentativa de fazer este episódio parecer mais sutil. Já fico com certo pé atrás sempre que Matthew Weiner não assina um dos roteiros da série, achando que não teria aprovado ou por receio de envolver seu nome. Além disso, acompanhando as opiniões durante a semana, pareceu consenso também que este foi o episódio mais fraco da temporada até agora. Até concordo, mas não acho que essa falta de sutileza tenha sido o maior problema, pelo contrário, acho até que Erin Levy utiliza isso muito bem a favor de seu roteiro. Como Don mesmo acaba constatando, fica bem explícito que colocar um computador no lugar da sala que antes era ocupada pela criação significa um triunfo da mediocridade que Cutler prega como nova estratégia para a empresa. É um pensamento que se reflete também em toda sociedade, nesta busca incansável pelo "futuro", que na época era simbolizado pelas viagens à Lua. A consequência disso é o que vemos nas décadas seguintes nas grandes empresas, a competitividade vindo à tona, sempre tentando superar e ser maior que a concorrência, esquecendo de valorizar os talentos individuais. Entre os muitos embates neste episódio, o mais interessante se dá entre Don Draper e Lloyd Hawley, o sócio da empresa encarregada de montar o computador na SC&P. Não apenas seu sobrenome lembra muito o computador HAL do filme 2001 Uma Odisséia no Espaço, como suas conversas são cheias de referências ao filme. Além de temer o computador desde o início, como se fosse uma ameaça para o emprego de todos ali, Don ironiza que Hawley não consegue sequer produzir fogo, e ele atribui isso a um "erro humano". Há outros exemplos, a começar pelo próprio título, mas o importante é como isso funciona de comentário da própria época, um filme tão popular que chegava a ser incorporado nas próprias conversas do cotidiano.

Outro embate, este já bastante esperado, era em relação à volta de Don e sua nova posição na agência, agora tendo de se reportar a Lou. Mas é óbvio que ele não encararia este risco logo de frente, se poderia escolher Peggy para servir como seu escudo enquanto comanda o trabalho de Don. Claro que a posição de Peggy é ainda mais delicada, além de lidar com a desobediência de Don, precisa manter o pulso firme e não deixar que sua criatividade se sobressaia à dela. Mas ainda assim é desastroso como ela lida com toda a situação, mostrando novamente uma certa arrogância que remete cada vez mais aos piores momentos de seu ex-chefe. Quando a aprendiz assume o comando, ela apenas reflete os erros de seu mentor, algo parecido com o que vemos na relação de Roger e sua filha Margaret, que deixou o filho para trás e decidiu aderir a uma comunidade hippie. Ao contrário de Mona, que logo desiste de entender esses lunáticos, Roger até tenta se juntar provisoriamente para conhecer os ideais que regem a comunidade, que contrastam com tudo aquilo que vemos na agência. Mas Roger também se irrita quando vê Marigold fugindo à noite para se encontrar com outro membro hippie, e percebe que esse amor livre não é nada diferente de suas próprias experiências sexuais recente. O final não poderia ser mais literal (e talvez melodramático): Roger tentando obrigar sua filha a voltar e ambos caindo numa poça de lama. Margaret acaba apenas revelando a verdade engasgada por tanto tempo, repetindo os erros de seus pais, agora em um novo contexto.

Na verdade, o que mais me incomoda neste episódio é essa estrutura toda esquemática, uma sucessão de fatos que levam a uma conclusão determinada. Pete, por exemplo, aparece brevemente no começo apenas para conquistar um novo cliente durante o jantar, e a partir daí, em mais uma falta de precisão da comunicação à distância, permitir que Lou envolvesse Don neste trabalho de forma indireta. Já Roger é obrigado a se ausentar da agência justamente para que não tomasse conta de Don e ele chegasse mais uma vez ao limite, quando já bêbado termina aos cuidados de Freddy. Até Cooper tem um comportamento um pouco forçado quando rejeita um potencial cliente que seria trazido por Don, embora isso sirva principalmente para estabelecer essa sensação de indiferença dos outros sócios em relação a Don. Afinal, o fato de ocupar a antiga sala de Lane não é mera coincidência: mostra como seu trabalho e sua criatividade são cada vez mais subestimados por todos e que colocar fim à própria vida certamente seria a solução para grande parte dos problemas. A tal resiliência que Hawley tanto espera dos computadores que instala é a que também se espera de Don, que aliás, não por acaso, passa a maior parte do episódio anterior justamente abandonado na sala agora perdida pela criação. Se já não fossem sinais suficientes, o episódio encerra com a música "On a Carousel", lembrando um dos mais brilhantes momentos da carreira de Don (a apresentação para a Kodak), assim como uma metáfora precisa das inúmeras voltas que sua vida deu, sem nunca sair do lugar. Como Freddie ordena, falando por experiência própria, só resta a Don fazer seu trabalho, se pretende mesmo reconquistar seu valor dentro da agência.

Foto: Divulgação/AMC.


e.fuzii
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segunda-feira, 5 de maio de 2014

[Mad Men] 7x03 Field Trip

"I wish it was yesterday."

Dentre todos os mistérios guardados a sete chaves por Matthew Weiner e sua equipe neste início de temporada, aquele que mais vinha me incomodando era a maneira como Joan e Peggy se portavam em relação a Lou. Porque era tão evidente para mim que ambas não haviam simpatizado com ele, que estava convencido que era questão de tempo até que elas promovessem o retorno triunfal de Don à SC&P. Mas o que vemos neste episódio é justamente o contrário, por pior que Lou possa parecer, a lembrança da última passagem de Don pela agência ainda parece ser traumática demais para as duas. Peggy ainda enxerga no antigo mentor a razão da maioria de seus problemas, não apenas por Ted ter se transferido para a Califórnia, como pela sua própria mudança de comportamento nos últimos meses, quando essa rivalidade na agência se acirrou e deixava Peggy sempre em situações delicadas. Já Joan não nutre a mesma admiração por Don desde que ele dispensou a conta da Jaguar e traiu sua confiança, assim como por manter sempre seu ego à frente de todas as decisões da agência, principalmente na fusão com a CGC. Além disso, Joan é ambiciosa demais para deixar a instabilidade de Don colocar tudo a perder. Na opinião dela, que expõe na sala de reunião junto dos outros sócios, a agência está bem melhor sem ele. Apenas Roger, talvez consciente das vezes que também vacilou, oferece uma nova chance ao seu antigo colega. É interessante como a agência perdeu nesses últimos meses seu diferencial criativo e mudou seu foco para uma área mais estratégica, principalmente por conta de Cutler, que está disposto até mesmo a investir em um computador para aprimorar as pesquisas de mercado de Harry. Devido a sua posição como sócio da agência, a única forma de fazer Don recuar seria através de um contrato de risco com cláusulas exigentes, desde colocá-lo subordinado a Lou até ocupando a sala "mal assombrada" de Lane Pryce. Don aceitar tudo isso prontamente, sem hesitar ou mesmo negociar, deixou muitos se perguntando o porquê dessa decisão, sendo que ele tinha outra boa proposta para escolher. Mas apesar de esperar pelos corredores da agência como se fosse uma visita estranha, parece evidente o quanto Don ainda consegue se impor com sua figura imponente. Por isso, sinto que Don agiu principalmente motivado pela sua autoconfiança, até porque esse tema foi também explorado nas outras duas tramas deste episódio.

Don decide viajar para Los Angeles no meio da semana para fazer uma surpresa para Megan, mas sua intenção na verdade é oferecer seus conselhos e tentar salvar sua carreira, que parece estar por um fio. Ela, com sua confiança abalada, tem se sujeitado a todo tipo de humilhação para conseguir trabalho. Porém, o que parece terminar mesmo por um fio é seu casamento, depois de Don escolher novamente o momento errado para ser sincero com sua mulher. Don definitivamente não venceria uma eleição dos mais populares da semana na opinião das mulheres. Megan tem certa razão em ficar irritada, principalmente pela postura paternal de Don, tentando tratá-la como se fosse criança em todos os momentos. Para servir de contraponto a isso, temos a primeira aparição de Betty na temporada, sua ex-mulher mostrando como ainda não amadureceu nada. Ela tenta colocar à prova sua teoria de que a recompensa está no ato de criar os filhos, como afirma a Francine logo de início, e decide acompanhar Bobby numa excursão pelo campo. O que parecia ser uma oportunidade para aproximar os dois, torna-se um pesadelo para Bobby, que oferece um de seus sanduíches para uma garota (que por sinal, não tinha) em troca de suas jujubas. Provavelmente ainda confuso sobre as dietas de sua mãe, Bobby acaba punido tendo de comer os doces à força. Se restava alguma dúvida de que Betty era capaz de traumatizar ainda mais seus filhos, acho que podemos considerar superadas.

Foto: Divulgação/AMC.


e.fuzii
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domingo, 27 de abril de 2014

[Mad Men] 7x02 A Day's Work

"Just tell the truth."

Na cena final da temporada passada, quando Don decide aproveitar o ímpeto de sinceridade que havia lhe tomado conta e enfim mostrar a seus filhos o local onde de fato passou a infância, era de se esperar que a relação entre eles, e principalmente com Sally, iria melhorar. Mas não é exatamente o que vemos ao longo deste episódio, após Sally perder sua carteira na cidade e precisar da ajuda de seu pai. Claro que, até pelo curto intervalo de tempo entre as temporadas, uma demonstração de afeto como aquela no final, que parece servir como ponto de virada nesta relação, precisaria vir acompanhada de um desenvolvimento também marcante, como no jantar improvisado em um posto de gasolina à beira da estrada. O mundo de Don continua ainda imerso em tantas mentiras que é difícil até para ele imaginar que bastaria ser sincero para justificar o atraso de sua filha no colégio. Sally mantém seu jogo duro também, ainda chocada por ter flagrado Don e Sylvia há alguns meses, e agora por se deparar com outro homem substituindo seu pai na agência. Não parece simples que Sally volte a confiar no pai, a não ser que ele mesmo tome essa atitude de desfazer os mal entendidos. Quando Don conta que estava sendo punido justamente por dizer a verdade na hora errada, até mostrando certa fragilidade por não saber ao certo o que fazer para consertar a situação, ela começa então a simpatizar novamente. Sally até se motiva a pedir algo para comer, provavelmente ainda agindo sob influência de Betty, tentando controlar seu peso. Quando Don vai então deixá-la na porta do colégio e ela se despede dizendo que lhe ama, ele é tomado pela certeza de ter passado um Valentine's Day mais feliz do que poderia imaginar. Afinal, observando sua rotina atual, nada impediria que ele passasse esse dia com Megan.

É de tamanha ironia acompanhar logo de início esse dia-a-dia de Don, antecedendo o dia dos namorados, em um episódio justamente com esse título. Apesar de programar o relógio para despertar logo cedo, ele só levanta de fato depois do meio-dia e passa o restante da tarde comendo biscoitos direto da caixa enquanto assiste televisão, provavelmente sob o pretexto de pesquisa de mercado. À noite tem de enfim se arrumar para parecer menos patético e receber Dawn, que traz as atualizações da agência, suas correspondências e recados. Sua decisão de permanecer em Nova York portanto, e arranjar um encontro de negócios no mesmo dia, significa muito sobre qual tipo de amor Don busca reconquistar no momento: seu prestígio profissional. Fica muito claro durante esse almoço que ele não deixou de ser valorizado pelo mercado, mas é interessante notar que a história naquela reunião com a Hershey's já começa a se espalhar e que se ele não tomar logo uma atitude em relação às limitações de seu contrato, pode ser tarde demais. Desde o final da temporada passada já imaginava que um dos caminhos mais "trágicos" que a série poderia tomar (que não seria a morte do protagonista com certeza) seria Don virando as costas para seu trabalho no final. Pelo tema desse episódio, principalmente na relação entre pai e filho, seu maior vício de fato são essas mentiras, que a publicidade se apropria de uma maneira tão sutil e elegante. Talvez sua verdadeira salvação esteja em manter controle de sua vida numa forma mais abstrata do que marcando suas garrafas de whisky.

Já na SC&P, acompanhamos desta vez literalmente uma dança das cadeiras entre as secretárias, até chegar numa configuração que atendesse a exigência da maioria. Muito se falou durante toda a semana sobre o racismo no local de trabalho, mas pouco vejo representado nos conflitos entre Lou e Dawn ou Peggy e Shirley. Aquele encontro pela manhã na área de café, ambas trocando seus nomes numa alusão à forma como são confundidas pelos outros, me parece dizer bem mais sobre as dificuldades que enfrentam. Mas para não deixar qualquer dúvida quanto ao preconceito, Cooper é bastante taxativo (ainda que discreto) ao mandar Joan retirar a secretária "de cor" da recepção da agência. Apesar de Lou ser apresentado como antagonista logo nestes dois primeiros episódios, principalmente por sua rispidez com todos que cruzam seu caminho, acho que ele tem certa razão quando não se sente obrigado a lidar com os problemas de Don, ou exige uma secretária que não faça um papel de agente dupla. Já Peggy mostra tantas dificuldades para se relacionar com os outros colegas de trabalho, que não seria inesperado que ela agisse dessa forma arrogante com sua secretária. É mais um episódio terrível para Peggy, e cada vez me parece mais preocupante seu despreparo ao assumir um cargo de responsabilidade. Em Los Angeles, Pete também sofre pela falta de perspectivas para sua carreira, e pela falta de qualquer autonomia na filial da costa oeste. Sua maneira de abstrair dos problemas é procurar por Bonnie a qualquer hora do dia, mas ela não parece ser tão dependente e frágil quanto suas antigas amantes. Bonnie sabe a importância de manter sua independência e conquistar seu próprio caminho, como tantas outras mulheres retratadas neste episódio. Para concluir, é extremamente satisfatório que Joan finalmente seja recompensada com o cargo de gerente de contas, enquanto Dawn assume suas obrigações em relação aos outros funcionários. Mesmo que isso seja motivado por mais uma manobra de Cutler na agência, que se mostra um adversário cada vez mais duro para Roger.

Foto: Divulgação/AMC.


e.fuzii
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sábado, 19 de abril de 2014

[Mad Men] 7x01 Time Zones

"He was thirsty. He died of thirst."

E então, todos preparados para o começo do fim de uma era? Certo, pode ser apenas o final da década de 60, mas coincide com a última temporada de nossa adorada série Mad Men. Para tirar proveito de seu prestígio por mais um ano, a AMC tomou a decisão de também dividí-la em duas partes, assim como já havia feito com Breaking Bad. É uma decisão um tanto quanto questionável, mas compreensível, já que o canal ainda enfrenta dificuldades para encontrar uma substituta com tamanho apelo na indústria de entretenimento. Mas não devemos sofrer por antecipação, e sim aproveitarmos agora essa primeira metade de 7 episódios, para então nos despedirmos de vez em 2015.

A sétima temporada começa depois do intervalo mais curto desde o início da série, passados apenas dois meses desde o último episódio, mas mostrando a diferença profunda que as distâncias continentais americanas causaram em grande parte desses personagens. Don Draper leva mais de 5 minutos para aparecer na tela, dentro de um apertado banheiro de avião, se barbeando para encontrar com Megan assim que aterrissasse em Los Angeles. Mas o que vemos depois de desembarcar é um homem com o olhar vazio enquanto desliza pelas esteiras rolantes do LAX, ultrapassado por muitos dos outros passageiros, lembrando não apenas Benjamin Braddock no início de 'A Primeira Noite de um Homem', mas também Jackie Brown, a aeromoça protagonista do filme de Tarantino. Sua estadia na cidade não deixa de enfatizar essa sensação de estranhamento, desde seu primeiro encontro com Megan, em um esvoaçante vestido azul e fazendo questão de assumir o banco do motorista em seu carro conversível. Não apenas ela, mas Pete também parece surpreendentemente adaptado aos ares da Califórnia, recepcionando seu colega com um caloroso abraço. Quem diria que Pete seria um dos únicos a se mostrar realmente feliz neste episódio. O restante dos dias mostram o quanto o casal continua fora de qualquer sintonia, Don se esforçando novamente para agradá-la com presentes caros, e Megan simplesmente rejeitando por estes não se enquadrarem mais no seu novo estilo de vida. Depois do jantar com o agente de Megan, poucas vezes o casal compartilha uma conversa verdadeira, além de evitar qualquer tipo de discussão. Quando finalmente celebram um momento de maior intimidade, Don provoca em sua mulher o nervosismo de uma primeira vez. No retorno a Nova York, Don senta-se ao lado de uma mulher dotada da maturidade e da independência -- com um leve toque de vulnerabilidade -- capazes de atraí-lo como tantas outras de suas amantes anteriores. Com ela a conversa começa a fluir de uma maneira tão surreal, dando sinais claros que parecem servir para fazê-lo refletir sobre sua vida, que desconfiei que tudo pudesse estar ocorrendo dentro da sua própria cabeça. E provavelmente motivado por essas lembranças, ele termina rejeitando sua companheira de vôo. Ainda assim, Don parece tentar finalmente se manter sob controle, sem beber em excesso (afinal é Megan quem volta bêbada após o jantar de comemoração) e sequer acendendo um cigarro ao longo de todo o episódio.

Apesar dessa ausência física nos primeiros minutos, Don tem presença de espírito desde o início através de Freddie Rumsen, que apresenta uma propaganda de relógios diretamente para a câmera como se tentasse não apenas convencer Peggy, mas também o espectador, da veracidade daquele texto. Pela eloquência, pelas pausas e frases curtas, já era possível reconhecer que tratava-se do estilo de Don Draper, tornando-se até desnecessário revelar ao final do episódio que Don conseguia se manter ativo através desses trabalhos freelance de Freddie. Mas a cena também me pareceu importante para estabelecer que ele continuava recebendo seu salário normalmente, embora ninguém tivesse lhe procurado desde então. Essa brilhante ideia para a propaganda obviamente contagia Peggy, que faz de tudo para que seja aprovada por seu novo chefe, Lou Avery. Certamente aquela cena ao final da temporada passada, com Peggy sentada na cadeira de Don, não parece ter apenas nos enganado, mas a ela também, imaginando que agora teria mais liberdade e autonomia na agência. Mas muito pelo contrário, já que Lou se mostra bastante conservador, seguindo à risca a cartilha de sempre agradar o cliente em primeiro lugar. Peggy está desnorteada, sem Don, sem Abe, sem conseguir encarar Ted de volta tão cedo na agência, e termina abandonada em seu apartamento, de joelhos aos prantos. Não sei dizer por que esperava que Don tentaria fazer contato com Peggy até o final do episódio, mas isso não ocorre e ele também termina atormentado, sentando-se sozinho na sacada de seu apartamento, castigado pela congelante noite da costa oeste americana.

Não fica muito claro ainda neste primeiro episódio a situação atual da SC&P, mas pelo inesperado desespero de Ken com a demanda dos clientes -- alguém que até pouco tempo atrás era imune a essas pressões profissionais -- dá para projetar que não é das mais favoráveis. Joan continua sofrendo por não ter seu título de sócia reconhecido pelos colegas, e dessa vez tem de atender a um cliente novato porque Ken se julga experiente demais para lidar com ele. Joan consegue dobrá-lo no final contando com as dicas de um professor universitário, e mostra-se cada vez mais preparada para se tornar uma competente gerente de contas, sabendo agir e procurar pela ajuda das pessoas certas. Já Roger aparece como sempre mais fora do que dentro da agência. No almoço com sua filha, ele parece chegar preparado para mais uma vez salvar o dia assinando um de seus cheques, mas se vê desarmado quando ela revela ter se encontrado na verdade para lhe conceder seu perdão. Com certeza isso trará dúvidas a Roger sobre suas novas experiências, que devem continuar sendo abordadas mais adiante, como as orgias em sua casa e os votos de amor livre a sua companheira de cama. O que me parece realmente curioso é quanto esses personagens se mostram cada vez mais isolados em suas próprias tramas, o que nem sempre me parece ser a melhor opção tanto para ainda desenvolvê-los, como para o andamento da série. Mas enfim, estamos apenas no início, vamos esperar para ver o que nos reservam para essa temporada final.

Foto: Reprodução/AMC.


e.fuzii
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segunda-feira, 30 de setembro de 2013

[Breaking Bad] 5x16 - Felina



 

“I did it for me. I liked it. I was good at it. And... I was... really... I was alive.” – Walter White


 "I want this." - Walt
"Then do it yourself" - Jesse


Quem acompanha o twitter ou qualquer outra rede social, sabe o quanto “Breaking Bad” foi discutida, comentada, elogiada, criticada nesses últimos dois meses. E isso torna a experiência de ver o episódio final um tanto complicada: que tipo de fim eu desejo e imaginei que seria o melhor pra série? Quais, dentre todas as teorias e especulações, estarão corretas? Eu quero um final inesperado ou exatamente da forma que pensei? É melhor amarrar todas as pontas ou será interessante deixar em aberto e terminar de forma ambígua? Como cumprir e até superar expectativas com algo que já discutimos tanto, que já analisamos todas as possibilidades e, principalmente, que vem após uma sequência de episódios não só incríveis, mas que já funcionavam perfeitamente como fim da série?

Não quero discutir muito sobre “Felina”. Imagino que as questões do parágrafo acima serão pretexto pra vários textos de críticos de TV pelos próximos dias. Que muitos fãs ficarão plenamente satisfeitos com o que viram, e outros certamente dirão que a série deveria ter se encerrado com “Ozymandias”. No fim, a reação parece depender muito da preferência pessoal pelo tipo de conclusão que cada um acharia “justa” pra jornada. Particularmente, entenderia o fim trágico e depressivo com o protagonista livre e com outra identidade, deixando um rastro de destruição pra trás, à espera do câncer concluir seu serviço. Mas me parece natural também a necessidade de não deixar pontas soltas, de oferecer uma conclusão mais amarrada e fechada, que satisfaça e até retribua o espectador por ter acompanhado esta jornada – afinal, é uma série de gênero, um conto moral de estrutura narrativa convencional

O que mais me importa é que, felizmente, esta conclusão não sacrificou a lógica interna da série para que fosse mais agradável ao gosto comum, e é mais um grande episódio com tudo o que já estamos habituados: a inteligência visual, a excelência dos atores e do texto, os belos momentos de impacto emocional.

Um dos primeiros comentários que li no twitter assim que terminei de ver o episódio foi uma queixa: ficamos tão acostumados em sermos surpreendidos por “Breaking Bad” e “Felina” nos dá exatamente o que esperávamos. Realmente não somos muito surpreendidos com o que acontece, sendo até previsível: Walt se despede da família, realiza sua vingança e liberta Jesse antes de morrer. O “COMO” acontece também está longe da imaginação fértil de vários momentos chocantes que a série nos deu em todos estes anos. Acredito que isso se deve ao pouco tempo restante para amarrar as pontas. Ao fim de “Granite State” fiquei com a impressão de que seria necessário pelo menos mais dois episódios para concluir tudo, o que faria deste finale algo ainda mais frenético do que vimos nos últimos meses. E aí está a surpresa: é lento e melancólico. Veja o tempo que se leva com a abertura ou com a sequência na casa dos ex-sócios de Walt. Gilligan optou por uma despedida triste e “cansada” (estou escrevendo após ter visto o episódio pela primeira vez, mas uma das sensações fortes foi de ter acompanhado por 50 minutos os últimos passos de um homem que está além da depressão, do desespero, de qualquer sentimento, de vontade e até mesmo de impotência) ao invés de investir na catarse da vingança que esperávamos. Que ainda assim foi satisfatória.


Infelizmente não terei tempo pra discutir muito mais sobre este final. Mas no calor do momento, o que mais me agradou:


- A última abertura da série ser o comentário final da “mão de Deus” que guia a jornada de Walt. Pode ser a mão de Gilligan, ou a sorte a que Jesse se refere alguns episódios atrás. Imagino que deverá irritar os que pedem realismo;

- O plano de deixar dinheiro para seus filhos através dos ex-sócios é uma dessas soluções criativas para situações impossíveis que sempre me fascinou na série. E claro que dará certo. Badger e Skinny são perigosos;

- É uma forma de redenção, mas Walt precisava assumir para Skyler o que já sabíamos. Foram cinco temporadas de negação, foi tocante e imagino que isso fez com que ele salvasse Jesse. Tá, vê-lo como escravo deve ter contribuído também;

- A despedida de Holly é de partir o coração;

- Jack tem um final parecido com o de Hank: um tiro na cabeça enquanto falava (oferecendo dinheiro que o próprio Walt ofereceu em vão pela vida do cunhado);

- Walt matou Krazy-8 na primeira temporada da mesma forma que Jesse mata Todd agora. O que foi o início pra um, é o final pra o outro;

- Minha principal curiosidade era sobre o fim entre Walt e Jesse. Parece clichê, mas é muito apropriado (e bonito) que Walt morra no laboratório, se despedindo do que lhe era tão importante, com o reflexo de sua imagem semelhante a Heisenberg. Melhor ainda que Jesse tenha a oportunidade de matá-lo e não o faz: Walt pede pra que o mate e Jesse cumpre sua promessa de nunca mais fazer o que Mr. White mandar.

Fiquei com uma dúvida em relação à troca final de olhares entre os dois: Jesse escutou a conversa de Walt ao telefone sobre a ricina? Primeira coisa que pensei foi que ele só entendeu naquele momento que Brock não foi vítima do veneno, mas não faz muito sentido (ser envenenado por uma planta dá na mesma, não?). Fato é que a expressão de Aaron Paul pareceu uma espécie de entendimento ou perdão.


Revisitarei o final quando a série deixar de ser o assunto do momento e os ânimos se acalmarem. 





Hélio Flores
twitter.com/helioflores

domingo, 29 de setembro de 2013

[Breaking Bad] Retrospectiva





 
Faltando pouco para vermos o último episódio de “Breaking Bad”, decidi fazer uma retrospectiva destes seis anos de série. A ideia me surgiu agora, então é mais uma percepção geral sobre cada temporada, e a evolução tanto da série quanto do “culto” sobre ela – vejo desde 2008, então tem uma perspectiva de quem acompanhou o crescimento gradativo de fãs. Não tenho o hábito de acompanhar curiosidades, bastidores e teorias sobre séries e filmes, então este resumo é bem mais simples. E por ser de última hora não vem acompanhado de links. Sintam-se à vontade para comentar e acrescentar fatos interessantes.


Vale lembrar que aqui no blog o Eric Fuzii escreveu sobre a série após o fim da segunda temporada, e fiz um texto sem spoilers durante a terceira com o objetivo de chamar a atenção pra ela, com o título “A Melhor Série Que (Quase) NinguémVê”. Na época, nenhum grande site no Brasil comentava a respeito e acho que dá pra dizer que contribuímos pra que uma meia dúzia de pessoas descobrisse a série antes de ela se tornar “moda” (na ocasião, meu texto foi linkado pelo twitter do Legendas.tv, o que resultou em um número considerável de acessos).


Vamos lá (pode ter spoilers, caso você não esteja completamente atualizado):



PRIMEIRA TEMPORADA:


- “Breaking Bad” estreou na AMC em Janeiro, uma semana após “Mad Men” ter vencido o Globo de Ouro de Melhor Série e Ator. O drama dos publicitários nos anos 60 foi lançado seis meses antes e chamou a atenção para a emissora, estreante em séries originais. Talvez por isso o piloto de Vince Gilligan tenha atraído uma audiência respeitável para os padrões do canal, quase 1,5 milhões, e se manteve apenas um pouco abaixo disso pelo resto da temporada – números semelhantes aos de “Mad Men”.

- A temporada tem apenas sete episódios devido à greve dos roteiristas. O que justifica o estranho season finale, que nem traz uma reviravolta ou resolve alguma coisa: apenas a tensão de uma situação entre Walt, Jesse e Tuco no ferro-velho, que é retomada de onde parou no início da temporada seguinte.

- Todo fã fica feliz pela greve, uma vez que o plano inicial era que Jesse Pinkman morresse ao final da primeira temporada. A interrupção forçada e o trabalho de Aaron Paul fizeram Gilligan repensar o destino do personagem.

- O piloto começa com as calças de Walt voando pelo deserto, e logo o vemos de camisa e cueca gravando uma confissão em vídeo e desajeitadamente segurando uma arma. O tom da série já está aí: o homem comum e medíocre em uma situação incomum e extraordinária, filmado de forma tragicômica em que a geografia do lugar terá função narrativa.

- A confissão, os planos do deserto, as calças e até a situação um pouco antes sob outro ponto de vista são revisitados ou referenciados na reta final da série (nos episódios “Confessions”, “To’hajiilee” e “Ozymandias”, respectivamente).

- Há todo um trabalho com a fotografia, direção de arte e figurino que mostram um cuidado especial que a série tem, em especial na forma como faz da química (as ligações, reações e misturas de elementos diversos) metáfora para o modo como a narrativa se desenvolve. Cores específicas são associadas aos personagens e ilustram bem esse tipo de representação (Skyler com azul; Jesse com amarelo; mistura entre as duas cores: verde, que é a cor de Walt).

- Apesar de um protagonista interessante, “Breaking Bad” traz o problema típico de muitas séries: um bom conceito, um grande personagem, mas a dificuldade de preencher mais de 40 minutos de episódio com coadjuvantes interessantes em situações não diretamente ligadas à trama principal: Skyler é a que mais sofre com o tipo de representação que tem, sendo a esposa detestável que mostra como a vida de Walt é patética, mas Hank é tratado como um palhaço grosseiro, enquanto Marie revela-se cleptomaníaca rendendo um drama dispensável. Jesse se beneficia por estar diretamente ligado ao protagonista na trama principal, mas não consegue se destacar nas tentativas de “aprofundá-lo” na relação com sua família.

- Os primeiros episódios trazem o protagonista num dilema moral, que só não é mais interessante por já ser algo, na época, bastante explorado por várias séries (matar ou não outro ser humano?). O momento em que realmente fui fisgado está no quinto episódio, “Gray Matter”, em que a família de Walt faz uma intervenção para que todos desabafem sobre sua recusa em fazer um tratamento. Ali a série explora bem o drama e as complicações que um câncer pode trazer nas relações familiares e, principalmente, em como um homem com uma doença terminal tem uma perspectiva muito diversa daqueles que convivem com ele. Ao mesmo tempo a sequência funciona como justificativa para a escolha que Walt faz, muito melhor que justificar por um trabalho medíocre e uma esposa controladora. Além de ter muito humor inerente às características dos personagens e sem diluir o drama, algo que a série se torna especialista.

- “Bryan who??”, perguntou qualquer pessoa que nunca tinha visto a sitcom “Malcolm in the Middle” quando soube o vencedor do Emmy de Melhor Ator daquele ano. Poucos apostaram em Cranston e até o colocaram como o indicado com menos chances de vitória, por uma série comentada por poucos, e em um ano dominado pelas indicações de “Mad Men” (e, portanto, via favoritismo de Jon Hamm), a sensação que Michael C. Hall tinha se tornado com “Dexter” (disputando pela segunda temporada), o elogiado, exaustivo e único trabalho de Gabriel Byrne na estreia de “In Treatment”, além de James Spader (o bicho-papão da categoria) e Hugh Laurie (ainda se pensava que era questão de tempo que vencesse e naquele ano concorria pelo elogiadíssimo episódio “House’s Head”).

- Além de Cranston, a série venceu o prêmio de Edição pelo “Piloto”. O episódio também deu indicações a Vince Gilligan (Direção) e o oscarizado John Toll (Fotografia). Ambos perderam para “House” (episódio “House’s Head”) e “Mad Men” (episódio Piloto), respectivamente.



SEGUNDA TEMPORADA:


- A primeira temporada completa (13 episódios) da série estreou em março de 2009 e tem início nos apresentando o famigerado urso caolho, boiando na piscina de Walt, único objeto colorido na sequência em preto e branco que abre a premiere. O recurso do flashforward que nos entrega cenas do final de temporada, ao longo dos episódios, como forma de estimular e criar expectativas foi amplamente usado por “Damages” na ocasião, em seus dois primeiros anos. Mas enquanto nela o uso era excessivo (em todos os episódios e em qualquer momento), em “Breaking Bad” o urso caolho surgiu na abertura de apenas quatro episódios, progredindo com revelações um pouco maiores insinuando que alguma tragédia ocorre no fim da temporada.

- O flashforward abre os episódios 01, 04, 10 e 13, cujos títulos, ao serem colocados juntos, dão a dica do que acontece no final: “Seven Thirty-Seven”, “Down”, “Over”, “ABQ”.

- O acidente de avião é um dos eventos que mais dividem opiniões dos fãs. Basicamente a reclamação vem de uma suposta falta de realismo, graças ao absurdo das coincidências. Bobagem: a solução narrativa amplifica a níveis fantásticos uma das ideias básicas da série, de ações pequenas que resultam em reações maiores (o clássico “efeito-borboleta”), e de forma punitiva, dando um sentido kármico à série. Gilligan chamou o acidente de “Lucifer ex machina”, em oposição ao “Deus ex machina”, termo do teatro grego que se refere ao acontecimento inesperado no final da peça com a intenção de solucionar e amarrar pontas soltas da trama. Ou seja, ao invés de salvação, o que temos é punição vinda diretamente do céu por tudo o que Walter White fez.

- Outra queixa diz respeito à sugestão que os flashforwards fazem de que algo acontece com Walt no fim. De fato, em “Down” a sequência termina com um close em óculos parecidos com o do protagonista, enquanto em “Over”, dois corpos estão cobertos e na frente de sua casa. Mas o fato é que poderia ser mesmo Walt: o acidente de avião foi planejado pelos roteiristas desde o início e não havia certeza de uma terceira temporada. A série foi renovada exatamente na semana após a exibição de “Down”. Caso “Breaking Bad” não tivesse mais um ano, poderíamos dizer que Walt pagou com a morte por tudo que fez. E a morte mais espetacular possível para a ocasião.

- A série tem um avanço incrível de qualidade, inclusive resolvendo o problema de coadjuvantes ruins: Hank ganha simpatia e tramas interessantes (os ataques de pânico, a tartaruga-bomba), Jesse é melhor desenvolvido na sua relação com Jane e ganha um episódio especial como “Peekaboo”, e Skyler tem seu próprio dilema moral no envolvimento com Ted ao mesmo tempo em que passa a desconfiar do comportamento de Walt – a antipatia por ela ainda é forte, mas graças a sua caracterização inicial: é uma mulher controladora que se vê perdendo o controle do marido.

- A temporada também mostra que a série não pretende manter um “status quo” que consiste na dupla de protagonistas entrando em confusões e tentando não serem descobertos: a profissionalização da produção e comércio avança consideravelmente com a contratação de um advogado e o contato de Gus Fring para a venda em grande escala.

- Saul, Gus, Hector Salamanca e Mike são os personagens de importância que surgem neste ano. Além de Jane, claro, que não sobrevive. Na premiere também é fabricada a ricina para ser usada em Tuco. Sem sucesso, o veneno ainda não foi utilizado e há até apostas pela internet sobre quem finalmente será a vítima no último episódio da série.

- Raymond Cruz, que interpreta Tuco, seria o “vilão” da série por muito mais tempo e sua morte foi escrita depois que Gilligan soube que o ator trabalhava em “The Closer” (desde o início da série, em 2005) e não poderia ser contratado para mais episódios – o que contribuiu para a caracterização de Gus, personagem que é o exato oposto de Tuco. Da mesma forma, Mike foi criado apenas porque Bob Odenkirk (Saul) não estava disponível para o dia da filmagem da morte de Jane.

- A série começa aqui a se especializar em “cold opens” (abertura antes dos créditos iniciais) inusitadas. Minhas favoritas: em “Negro y Azul”, um vídeo musical, onde um grupo de mariachis canta sobre a nova droga que está agitando o mercado e irritando o cartel (“Falam de um tal de Heiseinberg... esse cara já está morto, só que ainda não sabe”), e em “Better Call Saul”, um primor de escrita onde Badger é preso ao tentar vender metanfetamina para um policial, após uma troca de diálogos e lábia incrível – algo que marcará a caracterização do nosso advogado favorito.

- A partir de “Peekaboo”, há uma sequência de episódios que impressionam, seja pela qualidade e refinamento técnico (a fotografia de “Peekaboo” e “4 Days Out”, por exemplo), pelos diálogos e humor, pelo drama e sensibilidade inesperada (Jesse e o garotinho com os pais viciados), pela violência inusitada (o caixa eletrônico esmagando o viciado, a cabeça de Tortuga em uma tartaruga), pela fina ironia da narrativa ampliando efeitos dramáticos (Walt recebendo boas notícias sobre o câncer quando não só aceitava a morte, como a achava muito bem vinda em “4 Days Out”; a notícia do nascimento de Holly no momento mais inoportuno possível em “Mandala”), pelas frases marcantes (“Stay out of my territoy” em “Over”), pela coragem de não suavizar o protagonista (morte de Jane em “Phoenix”). Sempre me espanto quando vejo alguém dizer que esta é uma temporada inferior às próximas.

- A temporada recebeu cinco indicações ao Emmy, uma a mais que o ano anterior, e de maior importância: Melhor Série, além de Aaron Paul como ator coadjuvante (perdeu para Michael Emmerson, o Ben Linus de “Lost”). O season finale “ABQ” foi indicado pela Fotografia e Edição, vencendo por este último. Junto com o prêmio de Cranston, as mesmas duas categorias que a primeira temporada venceu.



TERCEIRA TEMPORADA:


- Talvez o mais elogiado ano de “Breaking Bad”, a terceira temporada estreou em 2010 também no mês de março, com “No Mas”, episódio que acho injustamente esquecido quando fãs fazem listas dos melhores da série. Dirigida por Cranston, a premiere parece dar um novo (ou mais apurado?) tom à série, flertando descaradamente com o absurdo e o cartunesco, na presença dos gêmeos primos de Tuco, que surgem, na abertura deliciosamente bizarra, rastejando junto a outros mexicanos em direção a uma imagem de Santa Muerte, para quem acendem uma vela em nome de Heisenberg. Não basta apresentar os novos vilões da trama, é preciso apresenta-los de forma diferente, surpreendente, divertida (assim como no episódio seguinte eles descobrem que Heisenberg é Walt com Tio usando uma Tábua Ouija). Memorável também é a sequência em que Walt tenta minimizar a tragédia do acidente provocado por ele, para o ginásio da escola lotado de estudantes – “foi apenas o 50º maior desastre aéreo”.

- Ao contrário da segunda temporada, em que toda a estrutura foi cuidadosamente planejada, Gilligan disse que aqui a trama foi criada aos poucos e com improvisos. A intenção era de ter os gêmeos e Tio como os vilões da temporada, até que os roteiristas perceberam que era impossível mantê-los por tanto tempo, em especial por terem criado personagens tão perigosos. Nasceu assim um dos mais celebrados episódios da série (“One Minute”) e Gus Fring se tornou o principal antagonista na segunda metade da temporada.

- Giancarlo Esposito, aliás, seria contratado para apenas alguns episódios, mas se recusou a voltar, a menos que tivesse mais destaque. Acabou aparecendo em 11 dos 13 episódios.

- Dois pares de episódios de muita tensão e adrenalina são responsáveis por um boca-a-boca repentino dos fãs, que começavam a recomendar a série com ainda mais ênfase: “Sunset” (com a despedida do trailer, quando Hank estava separado da verdade apenas por uma porta) e o já citado “One Minute”; e os dois últimos episódios, “Half Measure” (“RUN”!) e “Full Measures” (com um dos cliffhangers mais incríveis já feitos), que dentre tantas coisas, reforça a natureza da relação de Walt e Jesse.

- Gilligan, aliás, teve que confirmar em entrevistas a morte de Gale, já que muitos ficaram confusos com o movimento de câmera final, cuja intenção era apenas que a arma de Jesse fosse apontada para o espectador, e não que o personagem tivesse mirado em outro local. O autor da série garantiu que não pretendia deixar dúvidas quanto ao destino de Gale.

- Skyler é a personagem que passa por mais mudanças, todas bastante pautadas pela realidade de uma esposa em sua situação (como agir legalmente, até que ponto viver com ou deixar o marido afeta seus filhos, etc). Ao final da temporada é ela quem justificará para Marie o dinheiro que Walt tem e a ideia de um lava-a-jato como melhor empreendimento para lavagem de dinheiro. No entanto, há também “I.F.T.”, em que Walt força sua entrada em casa (e a deixando como vilã aos olhos do filho) e ela se vinga fazendo sexo com Ted e contando depois para ele na célebre frase que encerra e dá título (“I Fucked Ted”). Algo que alimentou ainda mais o ódio de alguns pela personagem e aumentou a discussão sobre misoginia e a forma como o público percebe e lida com personagens femininas.

- Outro episódio marcante da temporada foi “Fly”, em que a série mais uma vez mostrou ousadia e bastante consciência de suas possibilidades com algo bastante teatral e inusitado: apenas Walt e Jesse no laboratório a caça de uma mosca que poderia contaminar toda a produção. Monólogos e reflexões sobre algumas das ideias desenvolvidas pela série, interrompendo a sequência de adrenalina e acontecimentos excitantes rumo ao final da temporada. Houve quem não gostasse, mas é algo realmente especial. Primeiro episódio dirigido pelo cineasta Rian Johnson, que voltaria na quinta temporada para “Fifty-One” e o mais celebrado episódio da série, “Ozymandias”.

- A série ampliou no Emmy o seu número de indicações: sete, incluindo indicações técnicas para “No Mas” (Fotografia e Edição) e “One Minute” (Direção e Edição de Som). Bryan Cranston venceu pela terceira vez e Aaron Paul venceu pela primeira. No Globo de Ouro, a série enfim foi descoberta, mas apenas com uma indicação para Cranston – perdeu para Steve Buscemi, pela primeira temporada de “Boardwalk Empire”.



 QUARTA TEMPORADA:

- O maior intervalo que a série teve entre temporadas, foram 13 meses de espera para vermos o que aconteceria com Walt e Jesse após a morte de Gale. Estreando em Julho de 2011, este quarto ano teve um aumento considerável de audiência, ultrapassando os 2,5 milhões de telespectadores em média. O longo intervalo e o boca a boca gerado pela adrenalina de “Half Measures” e “Full Measures” fizeram com que esta fosse a primeira temporada da série a se tornar evento nas redes sociais. Boa parte dos portais e blogs sobre séries no Brasil também começaram a escrever sobre ela.

- A demora em lançar a temporada talvez tenha relação com as negociações feitas pela AMC com Vince Gilligan. A emissora queria cortar gastos e propôs uma quinta temporada menor para encerrar a série, e a Sony (parceira da AMC na produção) chegou a sinalizar que “Breaking Bad” poderia ser vendida para outro canal, o que exigiria que Gilligan estendesse a trama por mais alguns anos para compensar a compra.  Depois de muita especulação, anunciaram (na semana de exibição do quarto episódio, “Bullet Points”) o fim da série com a renovação dos últimos 16 episódios. No início do ano seguinte, Cranston confirmaria a divisão em duas mini-temporadas.

- A temporada é marcada por mais idas e vindas na relação entre Walt e Jesse, e uma aliança inesperada (mas bem desenvolvida) deste último com Mike e Gus; pelo retorno de Hank às investigações (para quem acompanhou na época, foi uma eternidade: mais de 15 meses desde “Sunset”), resultando em sequências como a do caderno de Gale mostrado a Walt e o grampo no carro de Gus; pelo despertar de Skyler para um lado de seu marido que não conhecia; e pela maior participação de Gus Fring, inclusive eliminando o cartel, o que faz a série explorar novos antagonistas na temporada final.

- Dentre as coisas mais memoráveis e que fãs sempre farão referência, estão as frases “I am the danger!” e “I am the one who knocks!” de Walt, e “Someone has to protect this family from the man who protects this family” de Skyler, além do final de “Crawl Space” e o fim explosivo de Gus Fring.

- O envenenamento de Brock é a solução criativa mais questionável de toda a série. Por um lado, permite a reaproximação de Jesse que faz com que Walt descubra a relação de Gus com Salamanca. Também torna o protagonista ainda mais condenável. Por outro, é uma solução pouco explicada e a primeira vez que os roteiristas usam de um “truque” que engana o espectador com uma reviravolta final. De qualquer forma, os resultados impressionam: a explosão na clínica, a frase final “I won” e como exploram a situação na reta final da série.

- As filmagens se passaram no período em que “Os Vingadores” estava sendo gravado nos mesmos estúdios em Albuquerque. Samuel L. Jackson, fã confesso da série, apareceu no set dos Pollos Hermanos vestido de Nick Fury e sugeriu fazer uma ponta, aparecendo ao fundo de uma cena. Os produtores recusaram.

- Por conta do longo intervalo, a série estreou a temporada após o período para concorrer ao Emmy 2011 e só retornou à premiação no ano seguinte, com 13 indicações, incluindo Anna Gunn e Esposito. Aaron Paul foi o único vencedor, sendo a primeira vez que Cranston perde o prêmio pelo papel (para Damian Lewis, por “Homeland”).



QUINTA TEMPORADA – PARTE 1


- A primeira parte da última temporada estreou em Julho de 2012, com “Live Free or Die”, episódio que bateu mais um recorde de audiência da série, chegando próximo a 3 milhões de telespectadores. Mais quatro episódios da temporada (sendo três da parte 2) estabelecem um novo recorde: “Say My Name”, “Blood Money”, “Ozymandias” e “Granite State”, este último chegando a 6.6 milhões.

- A premiere começa com o primeiro flashforward desde o uso do recurso na segunda temporada (ao menos em relação a eventos futuros da temporada e não do episódio em si, como foi o caso de “Bug” no ano anterior).  Na sequência, mostra Walt com outro nome (Mr. Lambert, sobrenome de Skyler) sozinho em uma lanchonete no dia de seu aniversário de 52 anos, exatamente dois anos após o piloto da série – ele completa 51 anos no quarto episódio da quinta temporada. Com visual diferente, vindo de New Hampshire e comprando uma metralhadora na mão do mesmo homem que o vende uma arma em “Thirty-Eight Snub”. É o único flashforward desta primeira parte.

- Os oito episódios são marcados por um ritmo mais frenético que o habitual visto na série. Isso leva a resoluções mais “fantásticas”, como o magnético plano que destrói as evidências que Hank consegue do escritório de Gus, e um espetacular roubo de metilamina, ao conseguir toda a carga de um trem, perfeito contraste com a primeira temporada, quando Walt e Jesse são filmados (mas não identificados) roubando desajeitadamente um barril da substância.

- Esta compressão de uma temporada em menos episódios (apesar de se tratar da primeira parte, a estrutura é de algo completo) faz com que a série atropele alguns acontecimentos, talvez menos desenvolvidos do que mereciam: é o caso da morte de Mike e de como o último episódio tem que lidar com o império de Walt e sua aposentadoria com um avanço de meses na cronologia, algo nunca antes feito.

- Novos personagens surgem: Lydia, o contato de Gus com a multinacional “Madrigal”, encarregada do tráfico internacional da metanfetamina; e Todd, que substitui Jesse como parceiro de Walt. Ambos caracterizados como pessoas perigosas, ao mesmo tempo de personalidades e comportamentos que não condizem com os crimes que cometem (Lydia é confusa, atrapalhada; Todd é gentil e respeitador).

- Dentre outros destaques, Skyler tirando seus filhos de casa ao se jogar na piscina, o jantar na casa de Walt em que Jesse é convidado (primeira vez que Anna Gunn e Aaron Paul dividem a cena desde a primeira temporada), a morte de uma criança no final de “Dead Freight”, e a divertida solução para se produzir a droga com o laboratório ambulante (Vamonos Pest!). Walt também nunca foi tão arrogante, não se importando quando Mike coloca uma arma em sua cabeça ou como na abertura de “Say My Name”.

- A temporada foi indicada a 13 Emmys este ano, finalmente levando o de Melhor Série. Anna Gunn também venceu, o que significa prêmios de atuação para a série por todos os cinco anos, além do prêmio técnico de Edição para “Dead Freight”. No Globo de Ouro, pela primeira vez foi indicada para a categoria principal, mas perdeu para a segunda temporada de “Homeland”.



QUINTA TEMPORADA – PARTE 2:


- A série chegou ao seu ápice de repercussão a partir da exibição destes oitos episódios finais: no mundo das séries de TV, talvez nunca se viu falar tanto de um único programa, com uma infinidade de textos sobre sua importância, sua filosofia, a moralidade de seus personagens, teorias sobre como será o final e análises sob todo tipo de prisma possível a respeito de tudo que se viu até agora. Humor, vídeos e montagens feitos pelos fãs, entrevistas com elenco e equipe de realizadores ajudam no viral. No twitter, chegaram a registrar mais de 12 mil tweets por minuto sobre a série, após a exibição de cada episódio. Várias pessoas têm feito maratona para estar atualizado a tempo de ver o episódio final com todo mundo. E, claro, textos e comentários negativos têm surgido como nunca, algo natural e necessário no meio de uma adoração exacerbada – “a melhor série de todos os tempos” e “melhor que qualquer coisa do cinema nos últimos anos” são frases lidas à exaustão.

- A sequência de episódios impressiona pela capacidade de surpreender com cada ação dos personagens. A série caminha para a conclusão com um número incrível de reviravoltas, com o já apurado cuidado na realização, o que justifica a excitação generalizada: os episódios não permitem respirar e vão direto na jugular do espectador. É comum ler no twitter comentários que resumem a experiência ao fim de um episódio com sensações como taquicardia, falta de ar e “não vou dormir esta noite”.

- Curiosamente, muito do que acontece os espectadores já previam há muito tempo: Hank descobre a verdade, vai em busca de provas para prender o cunhado, Jesse se volta contra Walt e se alia a Hank, etc. Toda a diferença é que o caminho óbvio (inclusive para a morte de personagens) é traçado da forma mais inesperada e surpreendente. Quando caminha, que atalhos pega, que retornos faz. Tudo cuidadosamente planejado para o máximo de efeito-choque, sem perder a coerência interna.


- O primeiro episódio deste ano, "Blood Money", é dedicado a Kevin Cordasco, jovem de 16 anos, fã da série, que morreu de câncer há alguns meses. Gilligan o conheceu e se ofereceu para contar como tudo acabaria. Cordasco recusou, dizendo que veria o final com as demais pessoas. Gilligan, então, perguntou o que ele gostaria de ver na reta final e o rapaz respondeu que gostaria de saber mais sobre o passado de Walt com a Gray Matter, algo nunca totalmente explicado. Segundo o criador da série, daí veio a ideia para o final de "Granite State".





- O que esperar de “Felina”? Encerrar uma série é sempre algo complicado. Deve agradar aos fãs e cumprir suas expectativas? Deve amarrar todas as pontas soltas ou algo em aberto pode (e deve) ficar? O protagonista deve sobreviver, para que sua história possa ser explorada algum dia novamente? Tudo visto em “Breaking Bad” leva a crer que nada é mais anunciado que a morte de Walt: ele não merece redenção, está em uma missão suicida e o câncer está de volta. Deixá-lo viver faria sentido de alguma forma (em especial por já ter sido bastante punido nos últimos episódios)? E como poderia morrer? Pelas mãos de Jesse, a pessoa que mais sofreu em suas mãos? Ou uma morte digna, fazendo algo bom? Mas isso não seria uma espécie de redenção? E que tipo de final é possível para Jesse, que não pode ser isento de responsabilidade por vários crimes, mas que também a esta altura tem um número de traumas que impede qualquer tipo de felicidade? Skyler e os filhos devem ser ainda mais punidos? Quem morrerá pela ricina: Lydia com seu hábito de tomar chá? Os ex-sócios de Walt da Gray Matter (ainda voltarão ou só foram os catalisadores do fim de “Granite State”)? O próprio Walt após fazer o que tem que ser feito? Ou Marie com sua obsessão por venenos irá cometer seu último ato cleptomaníaco? E Huell, ainda estará num quarto de motel esperando por Hank? Saul já estará em Nebraska e só voltaremos a vê-lo no prequel “Better Call Saul”? Skinny Pete e Badger retornarão para uma despedida?


Descobriremos logo mais e a única certeza é que, para o bem ou para o mal, seremos surpreendidos mais uma vez. A última, por esta série inesquecível.







Hélio Flores