sábado, 28 de abril de 2012

[Mad Men] 5x06 Far Away Places

"I don't want vacation to end."

Para um episódio que prometia tratar de lugares distantes, o que acompanhamos na verdade foi a influência dessa passagem do tempo para os personagens. Essa sensação de inadequação parece ser o tema que guia a temporada, como expresso na música dos Beach Boys "I Just Wasn't Made For These Times", ou como temos visto nas últimas semanas, com Sally encarando a adolescência, por exemplo, e Pete a idade adulta. Mas dessa vez, a própria estrutura da narrativa parece afetada pelo turbilhão de mudanças. Mad Men tem por costume apresentar contos isolados de seus personagens que normalmente acabam se relacionando entre si através do estilo ou tema, mas nunca a série havia experimentado apresentá-los de modo linear, embora todos acontecessem simultaneamente ao longo de um mesmo dia.

Como em três grandes blocos -- que poderiam até ter sido literalmente isolados, caso os comerciais fossem estrategicamente inseridos entre eles --, Peggy, Don e Roger aparecem enfrentando problemas em seus respectivos relacionamentos. Os três personagens comparados lado a lado criam também um fluxo temporal de continuidade, Peggy imitando o estilo de vida de Don Draper, e este cometendo erros semelhantes aos de Roger. Mas nesse caso, a estrutura pouco fez diferença ao conduzir as histórias, exceto pela viagem de Don, que certamente teria seu ritmo de tensão crescente prejudicado se fosse intercalado com as outras histórias. O misterioso telefonema de Don sob o ponto de vista de Peggy, também não tem grandes desdobramentos depois de revelado seus reais motivos. Na verdade, o episódio peca justamente por não se preocupar tanto assim com as nuanças, sendo óbvio até demais. Mesmo na experiência de Roger e Jane, a primeira viagem de LSD mostrada pela série, os efeitos mais surreais passam rapidamente e logo dão lugar a resoluções concretas, para avançar a narrativa, embora fossem suficientes para John Slattery mostrar toda sua versatilidade, seja encarando as marcas da velhice diante do espelho como vibrando feito criança numa final de beisebol. O casal logo cai na real no chão de seu apartamento (um recurso também utilizado depois na história de Don) e quando verdades acabam vindo a tona, ambos decidem pela dissolução do casamento. É um situação confortável para Roger, que mesmo pagando caro para se livrar de outro problema, parece revigorado quando percebe não adiantar mais continuar se enganando assim.

Já Peggy nunca se sentiu tanto como Don Draper antes, seja na posição que foi colocada de "fachada" criativa da agência diante do cliente da Heinz, como nos costumes de fumar e beber. Vendo seu trabalho sendo rejeitado outra vez, ela adota o discurso de seu chefe e despeja todas as suas frustrações no cliente, dizendo saber melhor do que ele o que sua empresa precisava. Mas é uma estratégia completamente suicida porque como Stan lembra logo em seguida, espera-se que a mulher esteja sempre pronta para tentar agradar. Ela decide então tirar umas horas de folga, e assim como Don Draper, ir ao cinema no meio da tarde, arranjar um encontro casual (e claro, dessa vez oferecer o agrado). Mas talvez tirar um cochilo no próprio sofá da sala de Don, sendo acordada por sua secretária, tenha sido o limite. Peggy só vai cair em si ouvindo a história de Ginsberg sobre sua estranha origem, ter nascido em um campo de concentração. Tudo levava a crer que eles entrariam em um conflito criativo, mas estou achando bem mais interessante essa aparente identificação por ambos se sentirem deslocados, algo que Peggy sempre procurava encontrar em Dawn, Rizzo e tantos outros anteriormente. Embora nas suas escapadas Don sempre voltasse para sua família ao final do dia, Peggy parece mostrar um verdadeiro arrependimento quando chama seu namorado de volta e percebe que precisa contar com alguém para lhe dar suporte.

A viagem de Don Draper e Megan acaba sendo uma história cheia de contrastes: começa com a promessa de férias fora de época, provavelmente tentando resgatar ainda o frescor inicial de seu casamento, e termina em uma atmosfera noir de tensão e desconforto. As cores super saturadas do restaurante Howard Johnson's dão lugar ao breu de uma auto-estrada. Os delírios de perseguição de Don Draper em seu apartamento voltam dessa vez de modo inverso. Enquanto os papéis de marido e chefe continuam a se confundir, Megan vai se sentindo pressionada a ponto de sua maneira flexível e dócil de encarar a vida (se dar bem com todo mundo, comer de tudo) se transformar em puro inconformismo. Sua paciência se esgota e de forma até cruel chega a sugerir que Don ligasse para a mãe que nunca conheceu. A reação habitual de Don quando contrariado desse jeito, lógico, é sempre fugir. Mas hoje ele não está lidando mais com uma mulher submissa, Megan não precisa esperá-lo, ela pode continuar seguindo sua vida que ele vai acabar deixado para trás. Pelo contrário, aliás, sua posição logo depois de encontrá-la de volta no apartamento é que mostra submissão, de joelhos agarrado ao seu abdômen, como um filho suplicando pelo perdão de sua mãe. E Bert Cooper -- quem diria? -- chega com o choque de realidade final: força Don Draper a terminar seu período de lua-de-mel e voltar a se concentrar em seu trabalho. Enquanto vemos ele de costas na sala de reunião numa posição bem mais tensa do que a usual (como na abertura da série, por exemplo), ele assiste os funcionários circularem, sem ter a menor ideia do que está se passando. Como o Howard Johnson's que Don ficou confinado por quase um dia: era considerado a maior rede americana de restaurantes entre os anos 60 e 70, mas acabou abandonado a beira das estradas, e hoje está reduzido a apenas 3 unidades.

Fotos: Reprodução.

e.fuzii
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quinta-feira, 19 de abril de 2012

[Mad Men] 5x05 Signal 30

"We're supposed to be friends!"

Por mais que fossem duros os golpes sofridos por Pete Campbell ao longo desse episódio, nada soa tão triste quanto esse seu lamento final. Ainda mais vindo de alguém que no decorrer da carreira nunca hesitou em passar a perna em quem fosse preciso para levar vantagem. Já no episódio piloto, Don é categórico ao afirmar que ele nunca seria capaz de substituí-lo porque ninguém simpatizava por ele. Pouco tempo depois, ele tenta chantagear Don com a carta de seu irmão e corre sério risco de ser demitido, só se salvando pela influência de sua família. Nesta temporada, suas atitudes na SCDP também não podem ser consideradas das mais nobres, principalmente em relação a Roger. Joan, enquanto consola Lane e tenta evitar maiores constrangimentos, diz que todos naquela agência já tiveram vontade de socar Pete uma ou outra vez. Por isso, tanto essa ideia de que os sócios da empresa deveriam compartilhar sentimentos de camaradagem, quanto suas investidas na garota que faz aulas de direção junto com ele, mostram uma pessoa ainda tão inocente e frágil, que só poderia resultar na mais profunda desilusão com sua pacata vida no subúrbio. Pete pode ter atingido a idade adulta mas ainda não sabe se portar como gente grande.

Aproveitando a chegada no mercado americano dos carros da Jaguar, um símbolo de virilidade por si só, o episódio reúne seus personagens em ambientes e situações tipicamente masculinas: o jantar de família entre colegas de trabalho, a torcida em um pub assistindo à final da Copa, uma noite de diversão no bordel e, claro, a épica luta travada na sala de reuniões. Tudo isso coloca em discussão o compromisso nas relações dentro e fora do trabalho. É exatamente desse assunto também que trata um dos contos de ficção científica (nada mais que os contos de fada do episódio anterior mas direcionados aos garotos) de Ken Cosgrove: um robô dedicado a manutenção de uma ponte que liga dois planetas. E isso aparece inclusive no pacto secreto firmado entre Ken e Peggy, assim como na relação entre Lane e seu companheiro britânico. Lane enxerga em seu compatriota a chance de conquistar uma conta milionária, tentando assim se livrar do rótulo de avarento da agência. Para isso, ele conta com os conselhos de Roger, que se mostra realmente competente ao tratar do assunto. Porém, por mais que se esforce e procure diversos ângulo para estabelecer uma relação com seu cliente, Lane falha em todas as tentativas. Roger define essa "amizade" como uma maneira estratégica para atrair seus clientes e chega a dizer para Ken que quando seu trabalho é bom, ele satisfaz toda as suas necessidades. Mas a SCDP não vive um grande momento há algum tempo e por isso, aqueles que ainda vivem vinculados a ela tendem a afundar junto, como é o caso de Pete e Roger.

Pete Campbell passa por um verdadeiro inferno astral neste episódio. Sua única intenção com o jantar de casais era receber a visita de Don em sua casa, mas por mais que tivesse insistido, somente Trudy foi capaz de realmente convencê-lo a comparecer. Pete experimenta uma espécie de crise de meia idade precoce, quando percebe que já não tem mais a mesma juventude de um "Handsome", que acaba por confundí-lo com o instrutor do curso antes de conquistar sua garota, nem nunca terá a mesma destreza de Don Draper, que conserta com extrema facilidade a torneira enquanto ele se perde dentro de sua caixa de ferramentas. Até mesmo nos negócios ele não é capaz de corresponder às expectativas do cliente, que busca um tipo de entretenimento que só Roger guarda na manga. Trudy não permite nem que ele tenha um rifle em casa. E para todos aqueles que reclamaram dos sonhos serem óbvios demais nas últimas semanas, dessa vez foi através da intimidade com uma prostituta que Pete revela seu desejo de ser tratado como rei, posto que provavelmente havia sido preparado para assumir desde a infância. Já que não consegue se garantir sozinho, tudo que lhe resta então, é procurar desesperadamente pela aprovação de Don. Mas nem isso ele consegue, já que Don critica sua infidelidade ao saírem da noitada no bordel. Para completar, sua derrota mais dolorosa ainda estava por vir. Dolorosa não apenas pela surra em si, nem pela vergonha diante dos colegas, mas porque ele acreditava que estaria seguro na agência, nunca seria atingido daquela forma. Quando ele diz que os sócios deveriam ser amigos, é porque esperava que eles tomassem alguma atitude e não ficassem apenas assistindo a briga, como se estivessem no pátio do colégio.

Há alguns episódios, Trudy diz que a insatisfação de Pete pode ser revertida a seu favor quando serve de ambição. Mas esse foco exagerado no trabalho significa uma queda ainda mais cruel diante de qualquer revés. A presença de Ken não é a toa, serve como paralelo perfeito de como encarar essa desilusão. Por mais que sua carreira como escritor tenha sido reprovada por Roger, basta certa cautela e adotar um novo heterônimo para manter esse segredo rolando. Ken nunca foi de misturar trabalho com a vida pessoal (no final da temporada passada, ele se recusa a envolver o pai de Cynthia nos negócios), e parece muito confortável assim. Don Draper -- quem diria? -- também serve como exemplo. Nesta sua nova postura despreocupada de encarar o trabalho, ele parece ter feito as pazes não só com seu presente mas também com seu passado, até pela forma como corrige num impulso o sobrenome do assassino do Texas durante o jantar, ou como fala tranquilamente sobre sua infância numa fazenda. A verdade é que quanto mais investem no trabalho, mais insatisfeitos eles se tornam. Resta saber como Pete irá se portar diante disso, já que esses personagens nunca foram adeptos de mudanças bruscas.

Fotos: Reprodução.

e.fuzii
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quarta-feira, 11 de abril de 2012

[Mad Men] 5x04 Mystery Date

"You're not a good man."

Após dois episódios consecutivos apresentando sonhos e delírios, podemos ter certeza que Mad Men embarcou de vez nas ilusões de seus personagens. Desejo, terror, trauma e suspeitas pairam sobre suas cabeças, tomando a forma de diversas visitas, algumas bastante esperadas, outras tantas imprevistas, assim como no jogo de tabuleiro que dá nome ao episódio (o comercial na tv que Sally assistia enquanto Pauline falava ao telefone). Dessa vez acompanhamos os pesadelos de Don Draper, que passa a ser perseguido por uma alucinação febril dentro de seu apartamento, um caso antigo que tenta seduzí-lo. Seria a oportunidade ideal para provar que havia mudado, mantendo-se fiel a sua nova mulher, mas por mais que Don tentasse combater seus desejos, tudo que acaba despertando são instintos ainda mais primitivos. Ele chega a estrangular a amante e esconder seu corpo debaixo da cama, acreditando assim ter resolvido o problema em definitivo. Tudo que restam são suas pernas para fora, com um dos sapatos faltando, como na versão obscura de Cinderella contada por Michael Ginsberg aos clientes da Butler. Invertendo os papéis de suas fantasias, Don termina com a consciência limpa porque acredita também que Andrea pediu por isso. É a maneira como ele encara seus instintos, como quando culpava Betty por sua infidelidade, embora hoje Megan censure ele por isso.

Embora seus atos fiquem apenas no campo das ilusões, claramente remetem ao crime bárbaro cometido por Richard Speck naquela semana de 1966, quando assassinou oito estudantes de enfermagem em Chicago. Joyce visita a SCDP trazendo consigo fotos censuradas desse massacre, causando espanto e principalmente uma curiosidade mórbida de todo o pessoal. Menos de Ginsberg, que mostra-se o tempo inteiro horrorizado até enfim sair da sala, enjoado com o comportamento dos colegas, provavelmente ainda despertando memórias do Holocausto. Nada mais irônico Joan aparecer enquadrada dentro do forno logo em seguida. Mesmo que em momento algum esse crime fosse sugerido durante seu reencontro com Greg, acredito que também tenha motivado Joan a revirar traumas oprimidos em seu passado. Finalmente ela confronta o marido por aquele estupro antes mesmo de terem casado, sem grandes escândalos, apenas baseado nas suas lembranças e do próprio público (a cena nem chega a aparecer no recap antes do episódio). Para uma história que sempre se equilibra para não pender demais ao melodrama, foi importante que a decisão de terminar o casamento tenha partido da própria Joan, e não por um simples capricho do destino como muitos acreditavam (no caso, Greg morrendo na guerra). Afinal, a possibilidade de Joan triunfar no ambiente de trabalho enquanto mãe divorciada tem tudo para ser fascinante. Mad Men sempre se destaca pelo cuidado ao tratar de suas fortes personagens femininas (talvez rivalizando apenas com Game of Thrones atualmente) e esse "troco" de Joan, depois de tanto tempo, foi outra prova disso.
Já Peggy acaba faturando uma bolada às custas da negligência de Roger com a conta da Mohawk (esperamos que ele tenha ainda muita grana para sempre se prestar a esse papel ridículo) e tem de trabalhar sozinha até altas horas da noite na SCDP. Depois de se assustar com alguns barulhos pela agência, certamente ainda impressionada com as fotos do crime, Peggy encontra Dawn se preparando para dormir no sofá da sala de Don. Sem chance de voltar para casa por conta do tumulto nos protestos pelos Direitos Civis, Peggy oferece então seu apartamento, e essa visita acaba sendo uma chance de acompanhar o seu desconforto com essa situação. Primeiro porque ela tenta de todas as formas forçar que está entendendo os problemas de Dawn, desde os protestos até sua condição de minoria na agência. Segundo porque Peggy acaba sempre conduzindo a discussão para tratar de si mesma, interrompendo Dawn até por diversas vezes. E para completar, cria-se um impasse no meio da sala quando Peggy hesita em tirar sua bolsa do alcance de Dawn. Embora pareça bem semelhante àquele dilema de Lane no táxi há alguns episódios, nesse caso vejo certa complexidade por tratar do preconceito de uma forma reversa. Afinal, com todo aquele dinheiro, dificilmente Peggy largaria sua bolsa na sala, seja lá quem estivesse dormindo ali. Mas Dawn percebeu que ela hesitou, Peggy percebeu que tinha de dar crédito e agir com naturalidade, e assim sua atitude não poderia ser mais condescendente. Pode parecer um voto de confiança, mas mostra-se acima de tudo um preconceito inato, incapaz de esconder. Dawn ainda não apareceu tratada como deveria, dessa vez servindo apenas como mero embaraço para Peggy, mas espero que explorem ela com maior profundidade ao longo desta temporada.

Depois de curtas participações nos episódios anteriores, Sally Draper finalmente ganha uma história para si, tendo de lidar com a companhia da mãe de Henry na mansão mal assombrada por mais tempo do que imaginava. Por causa de sua curiosidade peculiar e a vontade de se envolver na conversa dos adultos, Sally acaba ficando sabendo também dos crimes de Speck, e isso parece enfim chacoalhar seu mundo de fantasias. Se toda criança alguma vez já se sentiu apavorada pelos monstros debaixo de sua cama, Sally busca refúgio justamente debaixo do sofá, provavelmente depois de saber como uma das vítimas se safou da morte. E talvez não exista metáfora melhor para indicar que a garota está finalmente perdendo sua inocência infantil. Os contos de fada começam a deixar de fazer sentido, não apenas para a garota, mas para todos esses personagens. Já dizia que a leveza do início da temporada tinha tudo para ser apenas passageira, e com as declarações de Matthew Weiner de que iremos acompanhar o declínio de Nova York no decorrer dos próximos anos, o massacre de suas ilusões, duradouras como o casamento de Joan, ou ligeiras como os instintos de Don, parece ser apenas o começo.

Fotos: Reprodução.

e.fuzii
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quinta-feira, 5 de abril de 2012

[Mad Men] 5x03 Tea Leaves

Não tem sido tarefa fácil escolher uma foto para ilustrar meus textos nesta temporada de Mad Men. Afinal todo episódio temos algum fato surpreendente que deve ser preservado daqueles que entram aqui por acaso. Na semana passada, era o novo casamento de Don Draper, dessa vez é a aparente obesidade de Betty, que nem com a ajuda dos filhos consegue entrar em seu antigo guarda-roupas -- ironia cruel rebater essa cena com Don facilmente fechando o vestido de sua esbelta mulher logo em seguida. Para incorporar (literalmente) a gravidez de January Jones à série, os roteiristas tiveram de recorrer a essa trama, já que seria pouco provável que Betty engravidasse tão cedo de Henry. É algo que me agrada, principalmente pelo modo como evoluiu ao longo do episódio. Não chega a ser novidade para ninguém acompanhar um personagem encarando a morte através de um diagnóstico de câncer -- já acompanhamos esse tema inclusive na temporada passada com Anna Draper --, mas com Betty isso me parece diferente. Além desta mudança física já ser um golpe na auto-estima de qualquer um, principalmente para quem sempre foi reconhecida pela beleza, a própria ingenuidade e suas tendências infantis colaboram para criar certa simpatia pela personagem. Interessante notar que mesmo Henry sendo um marido mais paciente e atencioso, Betty prefere ser consolada por Don logo que recebe as primeiras notícias. Já é padrão os produtores adotarem algum tipo de metáfora quando retratam o estado psicológico de Betty (o pássaro preso na gaiola, o souvenir) e dessa vez não foi diferente: as folhas de chá do título, que sobram no fundo da xícara após perderem sua função. Enquanto Betty apavora-se com o relato de sua antiga amiga sobre o duro tratamento que está sendo submetida e a má sensação que isso traz, uma vidente aparece propondo-se a ler seu futuro. E sua previsão não poderia soar mais cruel, com palavras de conforto como aquelas que dedicamos a família de alguém que acaba de falecer. Mas tudo não passa de um susto, e o alívio dela está justamente em poder continuar criando os filhos, sem precisar depender de Don (e Megan) ou de sua sogra. A última cena talvez justifique o ganho de peso de Betty ao longo desse período, além de denunciar que Sally está atenta -- e reprova -- a obesidade da mãe, quando rejeita o resto do sorvete. Não à toa, no sonho de Betty em estilo Sopranos, é Sally quem faz questão de virar a cadeira da mãe na mesa de jantar.

Essa relação entre pais e filhos permeia ainda o restante do episódio, desde o orgulho do pai de Michael Ginsberg pela sua contratação até Roger sentindo-se traído pelas molecagens de Pete no caso Mohawk. É o constante conflito entre gerações que essa temporada vem anunciando, e que apareceu bem claramente na visita de Don e Harry aos bastidores do show dos Stones. Se Roger espera no conforto de sua ampla sala que as coisas voltem a ser como antes, Don ao menos tenta se mexer fazendo uma "pesquisa de campo". Porém, ainda que curioso com a garota que lhe dá um mínimo de atenção, Don parece estar sempre fazendo as perguntas erradas, numa atitude quase paternal. Impossível também que não passe pela sua cabeça que Sally também faz parte dessa geração -- ao menos beatlemaníaca já sabemos que ela é --, o que gera um desconforto não só em relação ao consumo de drogas como por ela em breve se tornar uma jovem tão indecifrável quanto estas. Quem também passa a se sentir ameaçada é Peggy com a chegada de Michael à agência, um sujeito excêntrico que parece tão talentoso e socialmente privado quanto ela. Sua contratação surge primeiramente como uma exigência de Roger, que enxerga nele uma oportunidade de "modernizar" a agência com a presença de um judeu (embora nem ele entenda exatamente o porquê), mas passa depois também pelo aval de Don Draper, para decepção de Peggy. Apesar do medo de ser substituída, por enquanto ainda não fica muito claro qual postura ela espera de seu chefe-mentor, mas desde já é o confronto que mais estou ansioso para ver nesta temporada. Por outro lado, Don ainda conta com o otimismo de Megan ao seu lado, que é capaz até mesmo de convencê-lo a viajar para esquecer os problemas de Betty (uma pena aliás, não mostrarem sequer um trecho dessa viagem a Fire Island). O amplo contexto histórico presente em Mad Men, que nos permite antecipar as mudanças que estão prestes a ocorrer, é intrigante justamente por servir como ameaça ao futuro desses personagens, que lutam a todo custo para se adaptar antes de serem deixados para trás. E esse parece ser o momento mais crítico até então. Afinal, ao contrário de Megan, são poucos aqueles que ainda podem se gabar por ter o tempo a seu favor, infelizmente.

Fotos: Reprodução.

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