Quando surgiu a primeira notícia sobre uma série de televisão baseada na franquia O Exterminador do Futuro, muitos torceram o nariz. O estranhamento foi ainda maior quando foi anunciado o título da série. As crônicas de Sarah Connor? Mas Sarah Connor não havia sido dada como morta em O Exterminador do Futuro 3: A Rebelião das Máquinas? O fato é que o criador Josh Friedman havia feito uma escolha arriscada: pelas decisões de roteiro impostas pelo terceiro filme (que trouxe além da morte de Sarah, o fatídico dia do Julgamento Final), ele educadamente resolveu desconsiderá-lo e fazer da série uma sequência direta do segundo filme.
Nesse ponto cabe fazer algumas considerações: à primeira vista, essa era uma decisão ilógica. Quebrar uma franquia de tanto sucesso em duas cronologias diferentes poderia despertar a ira dos fãs e causar confusão na cabeça dos espectadores casuais, que estranhariam o fato de Sarah estar vida, a não existência da Kate Brewster, etc. Mas desconsiderar o terceiro filme foi a opção mais coerente com a proposta do Friedman. Sem entrar nos méritos da qualidade de A Rebelião das Máquinas (mas só para registrar, gosto bastante), ambientar a história em um futuro apocalíptico, com uma trama cheia de soldados e grandes batalhas épicas tem mais a cara de um blockbuster do que de uma série (e está aí O Exterminador do Futuro 4: A Salvação para comprovar isso, seguindo esta linha grandiosa). Friedman queria um show mais intimista, acreditando no potencial da Sarah como a personagem altamente complexa que é.
Então, desconsiderado o terceiro filme, estamos em 1999, dois anos* após os explosivos (literalmente) eventos que resultaram na destruição da Cyberdyne, do T-1000 e do T-800. Ainda foragida do sanatório e procurada pela acusação de matar Miles Dyson, Sarah vive fugindo junto com seu filho John (Thomas Dekker), tentando estabelecer algo próximo de uma vida normal enquanto mudam frequentemente de cidade em cidade e se escondendo sob o sobrenome Reese (em homenagem ao Derek Reese, pai de John). Mas a chegada de dois exterminadores, um para assassinar John (Cromartie) e outro para protegê-lo (Cameron), traz todo aquele inferno mais uma vez de volta a suas vidas. E para piorar, eles ainda tem que lidar com a investigação do agente do FBI James Ellison (Richard T.Jones), ainda interessado em desvendar os incidentes de dois anos antes.
Seguindo fielmente a personalidade da Sarah Connor dos filmes, Lena Headey (mais conhecida por seu papel em 300) traz uma carga dramática fortíssima ao papel. Sarah foi uma mulher obrigada a amadurecer (e endurecer) à força. Quando era apenas mais uma jovem despreocupada com a vida, ela recebeu a notícia de que seria mãe daquele que no futuro seria o líder da resistência humana contra as máquinas, e abraçou esse destino desde quando estava com John em sua barriga. Desde então, ela carrega o fardo de ser a responsável pelo futuro de humanidade, não só apenas como uma protetora, mas acima de tudo como uma mãe. Atormentada pelo constante medo da chegada de mais robôs do futuro, ela está disposta a fazer tudo pelo filho, suprimindo qualquer necessidade individual em prol dele. E logo nesse piloto ela dá uma amostra a que ponto pode chegar, ao tentar dar um tiro na própria cabeça para que Cromartie não a use como isca para encontrar John.
A maior novidade desse piloto fica por conta de Cameron, a exterminadora interpretada pela Summer Glau (da excelente série Firefly). De um modelo ainda não identificado, ela parece ser mais avançada que o clássico modelo T-800, apresentando um comportamento mais próximo do humano, sendo capaz até de se passar como uma colega de sala de John para se aproximar dele. Mas na hora de defendê-lo ela parte para a briga do velho modo bruto típico dos exterminadores, em cenas de ação muito bem feitas, principalmente para uma série. Atropelamentos, explosões de veículos, paredes destruídas são algumas das peripécias só nesse episódio.
Mas depois de tanta ação, o piloto ainda reservou uma reviravolta em seu final. Pela primeira vez, vemos uma viagem no tempo para o futuro. Para escapar da implacável perseguição de Cromartie, Cameron localiza as partes de uma máquina do tempo previamente construída no passado por um membro da resistência e viaja para o futuro com mãe e filho, especificamente para o ano de 2007. Oito anos pulados, oito anos não vividos, e agora todos eles tem que se adaptar a esse mundo diferente, onde são dados como mortos, e construir uma nova vida do zero. Mas o que não esperavam é que a cabeça de Cromartie viesse junto...
O piloto respeita e está repleto de referências aos dois primeiros filmes da franquia - a família do Miles Dyson, a clássica frase "Come with me if you wanna live", Sarah e seu passado como garçonete, o pessoal aparecendo nu depois da viagem no tempo - prova que o Friedman realmente escreveu o roteiro com conhecimento de causa. Na época de lançamento houve bastante polêmica entre os fãs, pois quando a cabeça de Cromartie é transportada no tempo, ela está puro metal, o que contradiz uma das leis de viagens no tempo na série (só viajam tecidos orgânicos), mas o próprio Friedman explicou posteriormente que isso aconteceu pois ficaria muito forte para a censura do programa mostrar uma cabeça queimando, mas que subentende-se que a pele de Cromartie ainda estava se desintegrando quando entrou no vórtex temporal.
No final das contas, um ótimo capítulo para começar a série. E como um belo toque final, nada mais justo que Sarah encerrar o episódio com um monólogo. Um pequeno relato de como ela encara toda essa responsabilidade que carrega nas costas e os desafios que vem pela frente. O momento que temos para conhecer um pouco mais dessa brava mulher, e o início das suas novas crônicas.
* Infelizmente essa é a única parte que não bate com os eventos dos outros filmes. O segundo filme se passa em 1995, e não em 1997, como a série considera.
Rafael S
http://twitter.com/rafaelsaraiva
4 comentários:
Belo texto, embora faltasse algum toque pessoal introdutório. ;)
Na época do lançamento, fiz um breve texto desse piloto aqui no blog, e acho que tem algo mais desenvolvido na comunidade do orkut. Mas me diga, você vai comentar todos os episódios mesmo pós-cancelamento?
Abraços.
Putz, tem que ter disposição...
Mas enfim, seja bem-vindo rapaz.
Pois é...
Como faltou o 'toque introdutório', nem dei boas-vindas porque tive medo que fosse algum veterano, que comentasse aqui antes de mim.
Então, agora vai. Bem-vindo, Rafael. E parabéns pela primeira colaboração.
Gostei do seu texto. Só uma correção: o pai do John é Kyle Reese e não Dereck Reese. Este é irmão mais velho do outro ;)
Samuel
Palmas - TO
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