"Heisenberg. Heisenberg!" - Hank
Na
abertura de “Full Measure”, o episódio final da terceira temporada de Breaking
Bad, temos um flashback onde Skyler mostra a Walt a casa em que eles viverão
pelos próximos 17 anos. Na ocasião, Walt sugere procurar algo melhor, pois dali
em diante as coisas só poderiam melhorar. Um flashback, portanto, que nos fazia
lembrar do quanto o protagonista se distanciou dos planos que tinha pra si e
pra família.
E
agora, em “Blood Money”, que inicia a reta final da série, temos novamente
aquela casa representando o percurso desastroso de Walter White, mas em um
flashforward mostrando sua situação alguns meses após o tempo presente (algo em
torno de oito ou nove meses, como sugere uma fala de Marie). Um flashforward
que nos lembra que em “Breaking Bad” as coisas não só não podem melhorar, como
nada é tão ruim que não possa piorar.
É
uma abertura fantástica esta, que dá continuidade ao que vimos na premiere do
ano passado (Walt com nova identidade, um ano depois, voltando a Albuquerque
com armamento pesado), acrescentando informações que aumentam incrivelmente a
tensão pelo que está por vir: seja lá o que aconteceu, a identidade de
Heisenberg é revelada ao mundo e, parece, com consequências das mais terríveis.
Não há mal algum em uma série que já deixou sua marca na história, usar em sua
reta final um recurso que eleva expectativas, já enormes, a níveis ainda
maiores. Bela forma de dar início ao fim, que só reforça a confiança que Vince
Gilligan e seus roteiristas têm na conclusão de tudo.
E
como em todas as outras vezes que a série nos brindou com situações chocantes e
surpreendentes, mais uma vez deram continuidade de forma não só eficaz, mas com
desdobramentos inesperados: foram longos os meses que aguardamos para saber
como Hank sairia daquele banheiro, e fomos recompensados com um trabalho
impecável de direção (do próprio Bryan Cranston), atuação, fotografia e som. Este último, aliás, chama a
atenção. Do momento em que Hank aparece até o acidente de carro, o design de
som ilustra perfeitamente a confusão mental e desespero do personagem – além,
claro, de Dean Norris garantindo sua indicação ao Emmy do ano que vem.
O
desdobramento inesperado aqui é que Walt e Hank já se confrontam ao fim do
episódio, quando podíamos imaginar um jogo de gato e rato entre os dois ainda
por algum tempo. A série sempre teve essa característica de mover algumas peças
da trama de forma mais rápida do que se esperaria em outras séries e agora, com
calendário tão curto, mais do que nunca. Felizmente, ao contrário de alguns
momentos do ano passado, não ficou a sensação de correria. Se Hank é inteligente
o suficiente pra montar todo o quebra-cabeça (quando podemos rever vários
momentos da sua investigação, da câmera de segurança que mostra Walt e Jesse
roubando metilamina de um depósito na primeira temporada, vista em 2x01 “Seven
Thirty-Seven”, à eliminação das testemunhas na prisão), Walt também é, e logo
percebe o que está acontecendo quando nota o sumiço do livro que Gale lhe deu.
A diferença é que o orgulhoso Walter White precisa mostrar o que sabe.
Não
duvido, aliás, no quanto este embate deve fazer bem a Walt e que deve ser
responsável por mais uma vitória (mesmo que passageira) sobre o câncer: já em
quimioterapia, sabemos que o personagem estará vivo depois dos seis meses que
ele estima e diz a Hank, além de fisicamente menos debilitado do que se espera
de alguém que esteja morrendo – seu cabelo e barba no flashforward não me
parecem falsos, o que significaria distância da quimio também. Obviamente que a
série não lidará com causas da doença, mas numa opinião bastante pessoal,
acredito que é um momento propício para o retorno do câncer. Pois não importa
estar no ramo do império das drogas ou do império de lava-carros. O vazio
emocional e existencial de Walt persistirá. Sua vida só parece ter sentido com
a adrenalina e o perigo, e Hank acaba de lhe dar isto.
Outras considerações:
-
No post sobre “Buyout” comentei como a divisão em duas temporadas menores fez
com que passassem rapidamente pelo efeito que a morte de uma criança causaria
em Jesse e que isso até era bom, pois evitava mais uma fase depressiva do
personagem. E eis que retornam a uma situação que, embora coerente do ponto de
vista do personagem, não é tão interessante em termos de narrativa - embora ainda consigam representar de forma intensa, seja a tela da TV atrás do personagem em sua primeira cena, ou a distribuição de dinheiro à noite. Por outro
lado, há uma diferença importante: Jesse deixa claro que já não acredita em
Walt, e sem esta e outras figuras paternas no passado (Mike e Gus), o que lhe sobra?
-
Walt quer ser o novo Gus Fring? Não só tem seu carro “grampeado” por Hank, mas
também se ajoelha em uma toalha para vomitar e até evita discutir negócios ilícitos
enquanto trabalha com muita simpatia no caixa de seu negócio legal. Qual seria
o próximo passo? Desafiar um sniper, andando em sua direção?
-
Mais elogios à abertura: fazemos essa visita à casa destruída apenas porque Walt
volta para buscar a ricina. Desde o início da segunda temporada aguardamos para
que seja utilizada e é óbvio que seremos recompensados antes de tudo acabar. O
fascinante é ele precisar dela ao mesmo tempo em que precisa de um armamento
pesado. Duas armas letais, mas totalmente opostas;
-
“You are the devil!”, diz Marie casualmente a Walt, no momento em que um
transtornado Hank volta à mesa. Que timing!
-
“...maybe your best course... would be to tread lightly” é mais uma pra galeria
de frases clássicas da série. Não é só questão de texto. É de entonação, pausa,
o silêncio mortal entre os personagens; O “I don’t know who you are” de Hank
também é incrível, um misto de choque, repulsa e perplexidade. Dois atores
espetaculares;
-
Sou pouco conhecedor de Star Trek e devo ter perdido várias referências, mas o
concurso de tortas me pareceu um ótimo episódio “filler” pra série. Sempre bom
ver Badger e Skinny Pete e me pergunto se ainda terão participação importante
na reta final;
- Jesse
Plemons (Todd) e Laura
Fraser (Lydia) aparecem nos créditos como regulares da série, ao invés de
convidados. Todd não aparece no episódio, mas é Lydia quem traz a indicação de
que o verdadeiro inimigo deve vir mesmo da República Checa, nada satisfeito com
a queda de qualidade do produto – provavelmente é Todd o responsável por algo
inferior a 70%;
-
“Blood Money” teve uma audiência recorde para a série: seis milhões, o dobro da
audiência conquistada na estreia do ano passado. A AMC já pode começar a se
arrepender em não dar mais episódios para Gilligan. Resta tentar capitalizar
algo para o spinoff com Saul Goodman. Imagino que aquela sua clientela vista rapidamente
no episódio renda boas histórias, mas não acho que faria muito sucesso...
-
O rastro de avião no céu acima da casa de Walt foi um belo toque. Mas e as
laranjas que Carol deixa cair ao ver seu antigo vizinho? A relação com “O
Poderoso Chefão” é velha conhecida, mas (e eu acho isso) às vezes laranjas são apenas
laranjas... ou Oranges are the new bad? (desculpa, nao pude evitar)
-
O episódio é dedicado à memória de Kevin Cordasco, jovem que lutou por sete
anos contra um câncer e morreu há cinco meses, aos 16 anos de idade. Cordasco
era fã de “Breaking Bad” e teve a oportunidade de conhecer Gilligan, Cranston e
outros membros da equipe.
2 comentários:
Cadê review do ep. 10?!?
Leio a do Série Maníacos e do Pablo Villaça, mas ainda assim faço questão da sua... rs
Grata,
Renata
Oi, Renata. Obrigado pelo "questão"! Desculpa a demora, tentarei nao repetir :P
Abços!
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