“– Does that make you happy?” – Walt
“– I can't remember the last time I was happy.” –
Skyler
“You have to get him!” – Marie
“…maybe our
best move here is to stay quiet.” – Skyler
Vendo no IMDB a ficha
técnica dos episódios que faltam, “Buried” é o último trabalho de Michelle
MacLaren na direção de “Breaking Bad”. Nada mais apropriado que uma das
principais mulheres da série (é também produtora) se despeça com o melhor
episódio já feito para as personagens femininas.
É, claro, um episódio de
Skyler, protagonizando três memoráveis sequências (com Hank, com Marie e com
Walt) e este texto só pode ser sobre ela. Mas Marie tem seu grande momento na
série, enquanto Lydia continua uma personagem com curiosa e interessante
caracterização (Frágil? Louca? Perigosa? Mike obviamente não estava errado em
querer matá-la e é uma pena que não teremos muito mais tempo com ela). É
verdade que Betsy Brandt sempre mostrou ser uma boa atriz, mas Marie nunca teve
nada tão diretamente ligado ao centro da trama e seu confronto com Skyler é
mais um momento (e muitos outros virão) que há tempos sabíamos que aconteceria
e que a série consegue superar expectativas na realização. Gosto de como Marie
descobre aos poucos desde quando a irmã sabe sobre Walt, em sequência parecida
com a de Skyler descobrindo que o marido trafica metanfetamina no início da 3ª
temporada.
Mas é de Skyler que
precisamos falar. Ao contrário da série, Mrs. White está longe de ser uma
unanimidade, despertando reações extremas de ódio (e bastante machistas), que
resultam também em defesas apaixonadas. A personagem tem causado muita
discussão, e poderia levar a reflexões sobre representação e percepção da
mulher nas séries americanas.
(Enquanto escrevia isso, o
New York Times publicou um texto de Anna Gunn, em que ela fala sobre a
repercussão de sua personagem, que pode ser lido aqui)
Aqui abro um parênteses:
muito se fala sobre a tendência dos últimos 10 anos de protagonistas masculinos
falhos, de posturas moralmente condenáveis (Tony Soprano, Walter White, Don
Draper, Jack Bauer, Vic Mackey, Dexter Morgan, etc, etc) e agora, em um período
fértil para protagonistas femininas, parece começar algo parecido, mas
relacionado a transtornos e comportamentos “estranhos”, não necessariamente no
aspecto moral. A bipolar Carrie Mathison de Claire Danes, em “Homeland”, parece
ter aberto portas, resultando em coisas bem interessantes (Gillian Anderson em
“The Fall”) ou questionáveis (Diane Kruger em “The Bridge”). São mulheres muito
diferentes daquelas que assumem papel de esposa do protagonista (Skyler,
Carmela Soprano, Betty Draper).
Mas voltando a Skyler, o
crítico Alan Sepinwall dedica os primeiros parágrafos de seu texto sobre
“Buried” para falar de sua trajetória, e acho que vale a pena fazer isso
também.
Até certo ponto é fácil não
gostar da personagem. Sua caracterização no piloto parece ter esse propósito.
Ela é controladora (o bacon vegan em sua primeiríssima cena na série) e isso é
amplificado pra que aumente nossa simpatia por Walt e entenda sua necessidade
de fazer o que faz (assim que ele descobre ter câncer, Skyler aparece
perguntando sobre débitos na fatura do cartão). Na segunda temporada há sua
relação com Ted, inclusive de atividades ilícitas no trabalho, além de
constantemente pressionar e querer saber o que o marido anda fazendo (ela
descobre um segundo celular). Atitude perfeitamente natural de uma esposa, mas
novamente nossa simpatia e torcida continua com Walt e o que ele menos precisa naquele
momento é de uma mulher desconfiando do que não existe (uma traição). E uma
cena como a que encerra “Down”, em que a personagem muitíssimo grávida fuma,
certamente incomoda muitas pessoas, ainda que ela tenha seus motivos para
aliviar o stress dessa forma.
Mas o motivo principal pra
todo esse ódio, e que demonstra o quanto a repulsa pela personagem está ligada
ao puro sexismo, vem na terceira temporada com o episódio “I.F.T.” (abreviação
do singelo “I Fucked Ted” e dirigido pela mesma Michelle MacLaren), quando
Skyler faz sexo com Ted e diz ao marido com enorme satisfação de quem se sente
vingada. Na época, os fóruns pela internet foram entupidos de mensagens de ódio,
não por acaso de uma maioria masculina que parecia não se importar com nenhuma das
atrocidades cometidas por Walt, mas rapidamente considerou ultrajante a traição
de sua esposa. Pior ainda: ignorava que Skyler só faz isto após Walt forçar sua
permanência em casa de um modo que a tornava uma vilã sem motivos aos olhos do
filho.
Neste ponto, a imagem de
Skyler está tão manchada que nem o que se segue parece ser capaz de mudar a
opinião de muitos fãs da série: é ela quem inventa a história do vício de Walt
no jogo de cartas para pagar a reabilitação de Hank; é ela quem dá a ideia do
lava-a-jato, melhor do que qualquer empreendimento bizarro inventado por Saul;
é ela quem lava o dinheiro da forma mais eficiente possível; e é ela a autora
de algumas frases tão boas quanto às de Heisenberg, como “Alguém tem que
proteger essa família do homem que protege essa família”, “Achava que VOCÊ era
o perigo”, “Só me resta esperar... que o câncer volte”, no momento em que Walt
perde nossa simpatia cada vez mais, e ela a vítima que faz o que pode para
manter a família.
E eis que chegamos a este “Buried”,
onde Skyler deve tomar a decisão mais importante até aqui: colaborar com Hank
ou permanecer ao lado de Walt?
É fascinante que tudo visto
nos primeiros episódios da quinta temporada levam a entender que Skyler
escolheria o lado de Hank e Marie, e sua escolha por Walt em nenhum momento
parece inverossímil. Toda a excelente conversa com Hank deixa claro, não em
palavras mas no rosto de Anna Gunn, o quanto ela está envolvida e que não há
retorno. É preciso seguir com Walt até o fim. Não à toa o seu “maybe our best
move...” ser tão parecido (na entonação, inclusive) com o “maybe your best
course...” dito pelo marido no episódio anterior. Já criaram até mesmo o termo “Skysenberg”.
E é preciso ressaltar que a
série nesta reta final parece querer revisitar situações e cenários, algo já
notado no episódio anterior (o ataque de pânico de Hank, a desorientação de
Jesse, Walt mimetizando Gus Fring) e que continua aqui (o deserto, o ferro
velho, um laboratório em péssimas condições), mas principalmente não esquecer
da motivação inicial do protagonista: família. Hank não pode “fazer uma viagem
para Belize” porque é família; Walt se entrega desde que os filhos recebam o
dinheiro; Skyler sabe que deve seguir em frente no silêncio também pelos seus
filhos, e sai do torpor, do sentimento de culpa e vergonha diante de Marie
quando há a ameaça de ter sua filha levada embora; uma das ponderações de Hank
é que, no momento em que se tornar um civil, não poderá ajudar a cunhada.
Família é a coisa mais
importante do mundo e um episódio que trata da divisão dela, só deixa mais
amarga a tragédia que está por vir.
Mais umas coisinhas:
- O que mais gosto da
sequência que abre o episódio nem é a bela imagem representando o estado mental
de Jesse, mas como a série não se rende à vontade de abrir todo episódio com
algo chocante e vibrante;
- O Carlton Cuse (criador de
“Lost”) tuitou que estava adorando Breaking Bad porque tem flashforwards,
números de loteria e pessoas gritando “Walt!”. Esqueceu da escotilha;
- Walt enterra todo seu
dinheiro no mesmo local em que ele e Jesse produzem metanfetamina no piloto da
série. O local se chama To’hajiilee, e dá nome ao episódio 13 desta temporada;
- 34, 59, 20, 106, 36, 52.
Óbvio que já foram pesquisar se essas coordenadas são verdadeiras. E, sim, elas
apontam para o local onde a série é filmada, assim como várias outras produções:
a Albuquerque Studios;
- Gosto como uma cena de
humor como a de Huell e Kuby deitados na pilha de dinheiro não serve apenas
como alívio cômico. Heinsenberg matou dez testemunhas em dois minutos: é essa a
imagem que o medíocre Walt deixou;
- No duelo Hank x Walt (ver
imagens abaixo), o primeiro ganha, sacando o telefone mais rápido. Assim que a
máscara Heisenberg cai, o pânico toma conta de Walt e só depois se lembra de
ligar para Skyler;
- MacLaren se despede com uma porta se fechando, que marca o encontro entre Hank e Jesse. O primeiro desde "One Minute" (3x07), também dirigido por ela.
Algumas imagens do episódio:
O faroeste
Vermelho: dinheiro, morte, inferno.
Balança
Humor
Hélio Flores
3 comentários:
Parabéns! Suas reviews de Breaking Bad são ótimas!
Obrigado, Ellen! Volte sempre :)
Postar um comentário