“Walter White, you have the right to remain silent. Anything
you say can and will be used against you in a court of law. You have the right to
speak to an attorney and have an attorney present during any questioning. If
you cannot afford an attorney, one will be provided for you at the government's
expense. Do you understand these rights as I have just recited them to you?” –
Hank Schrader
Eu poderia começar o post
com outras tantas citações marcantes, como algum trecho da conversa entre Walt
e Jesse pelo telefone (o desabafo irritado de Walt, a provocação de Jesse – “Fire
in the hole, bitch! Oh, nice orange flames!”), ou a ênfase do Walt em dizer que
Jesse não é um rato delator, ou ainda a outra importante conversa telefônica do
episódio, entre Hank e Marie.
Mas eu tinha que deixar
apenas esta aí em cima, o momento que a gente não sabia se aconteceria, mas
suspeitava que pudesse ser um final possível para a série. Um momento preparado
com todo o tempo e o peso necessários. A demora pra Walt se entregar, o tempo
que leva pra ser algemado, a breve discussão com Jesse, o telefonema pra Marie.
Tudo apropriadamente longo, parecia mesmo o fim. E para os personagens, era
mesmo. Um fim com a ironia que já conhecemos, encerrando onde tudo começou (e os
dois primeiros planos do último bloco do episódio, aos 36min, são semelhantes a
dois dos três primeiros planos do piloto da série).
Mas como tudo em “Breaking
Bad” tem dois ou mais sentidos, a duração da sequência também se justifica pela
conveniência, pois é preciso de tempo pra “cavalaria” chegar. Não me canso de
admirar o que os roteiristas fazem: é conveniente, mas sabemos o quanto Hank
está aliviado e orgulhoso, o quanto é importante para ambos, ele e Marie, aquele
telefonema; e porque não há pressa nenhuma em sair dali, pois Jesse se
assegurou de manter Walt ocupado na linha até chegar no meio do nada, onde não poderia
pedir ajuda (pra qual endereço?). Hank só não contava com aquele bilhete de
loteria, o bilhete de Chekhov.
E aí os roteiristas, com a
preciosa ajuda da diretora Michelle MacLaren, capricham no sadismo. Imagino que
a maioria das pessoas esperou pelo pior quando Hank soltou um “eu te amo” ao
telefone. Imaginei um tiro na cabeça a qualquer momento, um desses choques que
nos habituamos a ver em tantas séries e filmes. Mas eis que os carros surgem
lentamente, a trilha sonora crescente, o desespero de Walt, tudo prolongando
nosso sofrimento e aumentando a taquicardia. Claro, talvez o choque de uma morte
inesperada não veio porque não haja a intenção de matar Hank, mas não deixa de
ser uma solução muito mais eficiente que deveria servir de lição pra tanta
gente da área. Hitchcock manda lembranças.
É engraçado, aliás, ter lido
tantas pessoas com a mesma opinião de que se Hank não morre, é covardia da
série. Mas me pareceu que terminar um episódio no meio de um tiroteio é dizer “preparem-se
porque há uma solução para o impossível”. E nesta solução, o que mais me deixa
curioso é o destino de Jesse, porque a vida de Hank interessa a Walt, é
negociável. Mas Pinkman certamente deixou de ter uma morte rápida e indolor,
para uma lenta e extremamente dolorosa nos planos de Heisenberg.
Essa decepção de Walt com
Jesse é o fim definitivo de qualquer laço afetivo que o primeiro poderia ter
pelo segundo. Sim, Walt já havia encomendado sua morte, mas havia uma
racionalização por trás, de autodefesa, da impossibilidade de parar seu pupilo
por qualquer outro meio. Aliar-se à polícia é tanto um golpe para o pai Mr.
White quanto para Heisenberg – entre criminosos, poucas coisas são tão
detestáveis quanto o “dedo-duro”, algo que já vimos na figura de Hector
Salamanca, tanto na sua recusa em colaborar com Hank na 2ª temporada como ao
fingir colaboração na 4ª temporada para atrair a fúria de Gus.
A mudança na dinâmica e
relação entre os personagens também é admirável nessa reta final. Vince
Gilligan disse uma vez que chegaria o momento que não sentiríamos mais nenhuma
simpatia pelo protagonista, mas felizmente ainda não chegamos a este ponto. É
importante para uma experiência mais complexa do espectador com a série (ficamos
felizes por Hank e lamentamos por Walt; queremos que Walt saia dessa, mas não queremos
que Hank morra; não gostamos que Jesse seja um delator, mas entendemos seu
lado), mas não só. Transformar Walter White no demônio (como Marie e Jesse se
referiram a ele nesta temporada) exigiria uma perda total de valores, algo sem
coerência alguma.
Não significa que houve uma
suavização do personagem. Todos os momentos “honrados” de Walt nos últimos
episódios se tratam apenas da preservação da família. Algo tão importante que
ele prefere se entregar e perder todo o dinheiro a fazer algum mal a um ente
querido, ainda que este seja “apenas” o marido de sua cunhada (o legal é
relembrar toda a série e perceber que desde sempre os casais White e Schrader
são muito unidos e particularmente me lembro de “4 Days Out”, quando todos
entram com Walt no consultório para receberem juntos a notícia sobre seus
exames). E não é por acaso que neste mesmo episódio temos a volta de Andrea e
Brock, que serve para nos lembrar de como nosso protagonista também sabe ser
desprezível. Aliás, é o tipo de situação que em termos narrativos poderia ser
considerada gratuita (já que não leva a lugar algum), mas é tanto uma ação
óbvia de Walt para aquele momento, quanto uma forma de enriquecer o personagem.
Mais algumas coisas:
- Quando achava que a
despedida de MacLaren era com “Buried”, eu disse que era apropriado ser dela a
direção de um episódio em que brilham as mulheres. E o seu adeus na verdade é
justo com muita tensão, adrenalina e tiroteio. Veremos mais de seu trabalho na
próxima temporada de Game of Thrones;
- Eu já havia dito que é uma
pena não termos chance de conhecer Lydia um pouco mais e o mesmo vale pra Todd.
Pouco tempo de cena e sempre conseguem deixa-lo assustador. Seu jeito de
mostrar interesse em Lydia, a falta de reação ao saber quem é o alvo de Walt,
mantendo o olhar nela enquanto bebe do chá próximo à marca de batom, além
daquela luz vermelha sobre ele, quando está devidamente enquadrado acima do
ombro de Walt. É o tipo de coisa que faz pensar se ele ainda terá uma
participação fundamental ou se é apenas a excelência da série em construir personagens
periféricos;
- Não sei se há uma boa vontade
de fã ao aceitar que todo o plano de Hank envolvendo duas fotos montadas
funcione tão bem, ou se realmente há problemas em como Huell e Walt são
enganados. Como defesa, acho que Hank desarma Huell ao falar de Brock, enquanto
Walt realmente nunca soube lidar com o inesperado sem ter tempo necessário para
pensar a respeito. De qualquer forma, nice poker face, Huell!
- Betsy Brandt aproveitando
cada momento que tem nestes últimos episódios. Grande atuação com Dean Norris
(mesmo sem dividir a cena). Claro que só pude perceber a emoção dos dois quando
revi o episódio, já que naquele momento do episódio estava difícil até pra
respirar...
- Aaron Paul não teve muito
o que fazer, além de reagir, mas que impagável sua expressão de medo, alívio,
incredulidade e sei lá mais o que quando Walt está sendo preso. Já sua breve
ânsia de vômito com o “cérebro” e sangue que Hank despeja no chão é engraçada
pra alguém que já dissolveu mais de um cadáver;
- Obviamente veremos muito
mais brilhantismo de Bryan Cranston nos próximos três episódios, mas os últimos
20 minutos de “To’hajiilee” têm material suficiente pra ganhar qualquer prêmio
de qualquer ano que concorresse. Desespero, irritação, perplexidade, medo,
surpresa, ódio, impotência e a combinação de um ou mais desses sentimentos, por
mais de uma vez.
- Toda semana há muita
discussão sobre a existência do flashforward ser algo bom ou ruim. Só poderemos
afirmar com certeza após o final, mas ao contrário de algumas pessoas, tenho
achado bastante positiva, principalmente por se passar meses após o que estamos
vendo e a cada fim de episódio conseguimos especular muito pouco sobre a
relação que tem com este futuro próximo. No caso aqui, é provável que o
dinheiro continue onde está. Ou de que forma Walt poderia comprar uma arma tão
pesada?
Hélio Flores
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