Pessoal, dando uma rápida pausa nos comentários das séries, quero dividir com vocês minhas impressões sobre esse magnífico filme que chega às salas de exibição na próxima 6ª feira. Trata-se de O Jardineiro Fiel, cujo resumo básico que vemos no site oficial diz: "A conspiração é global, a corrupção é contagiosa". Só mesmo um diretor como Fernando Meirelles teria coragem para fazer um filme que toca fundo na ferida que toda sociedade moderna insiste em esconder e tratar. Aquela da África perdida e isolada do resto do mundo, onde pessoas são tratadas como mercadorias e suas vidas/mortes são meras estatísticas de relatórios da ONU. Em O Jardineiro Fiel, baseado na obra de John le Carré, Meirelles nos leva ao Quênia onde grande parte da trama ocorre e onde vemos o quão vil, homens, corporações e governos se tornam quando dinheiro e poder estão em jogo. O filme é sim um belo thriller no melhor estilo le Carré, mas com um ingrediente a mais no pano de fundo: uma bela história de amor e descoberta.
A genialidade de O Jardineiro Fiel, é que o grande questionamento não é "Que coisas terríveis as grandes corporações estão cometendo contra humanidade com a ajuda dos grandes governos agora?", afinal já estamos cansados de ver homens poderosos agindo de forma nefasta mundo afora. A questão central é o que um homem não tão poderoso pode fazer contra isso. O filme é um thriller de consciência, já que é fácil ignorar todas as coisas terriveis que acontecem ao nosso redor o tempo todo, quando na realidade você não precisa olhar para elas; porém quando você é confrontado por evidências inalteráveis, quando a sujeira fica bem em cima do seu tapete, o que você faz?
Ralph Fiennes faz Justin Quayle, um diplomata britânico de baixo escalão no Quênia que demora um pouco até abrir seus olhos para a realidade que o cerca (basicamente o que todos nós fazemos). Ele tem um bom emprego, o respeito de seus colegas da embaixada e uma boa casa com jardim no qual passa horas se distraindo. Em suma, alguém que jamais se meteria em confusão. O que na verdade dá a ele uma dimensão ainda maior dentro da trama. Ele é completamente ignorante acerca de qualquer informação de má conduta na atuação das indústrias farmacêuticas britânicas que atuam na região... porque ele simplesmente não quer saber disso. A esposa dele contudo, é um grande problema. Tessa (Rachel Weisz) é uma ativista que faz um trabalho de prevenção com mães portadores de HIV nas favelas de Nairobi e uma criadora de encrenca por natureza. Ela não só é um problema para os chefes de Justin, porque faz perguntas embaraçosas demais em festas da embaixada, mas sobretudo para o próprio Justin a quem ela constantemente ataca pela complascência e a quem tenta insistentemente abrir os olhos.
Somente após a morte dela é que ele começa a despertar. (Não entreguei nenhuma surpresa do filme, porque isso acontece logo no início, e a história deles é contada através de flashbacks ao longo do filme) Tessa é encontrada morta numa beira de estrada e as autoridades sugerem que bandidos foram os responsáveis, ou que talvez ela estivesse tendo um caso com um colega de trabalho. É claro que ao longo do filme vai ficando evidente que a morte dela trata-se de queima de arquivo, mas em certos momentos dá pra duvidar do caráter dela em virtude de algumas ações no mínimo suspeitas.
O Jardineiro Fiel é sim um thriller em muitos aspectos como eu já disse antes, mas é ainda mais uma tragédia. Para Justin, é a tragédia de só descobrir e conhecer o amor de sua esposa depois que ela se foi, e ter de seguir os passos dela num esforço para entender a realidade na qual ela vivia e decobrir o complô de corporações e governos que exploram a pobreza e o desespero das pessoas para tirar proveito delas já que elas não tem voz para protestar contra tal tratamento. E é uma tragédia para nós, pois tendemos a ver Tessa como um modelo pitoresco fora de linha e Justin como o lógico e racional a se seguir, quando na verdade o mundo precisa de mais Tessas e aposentar os Justins do início do filme, para começar as mudanças que se fazem tão urgentes.
No final, Justin que em certa passagem do filme vez dera pouca importância à intenção de Tessa em fazer alguma coisa pelos outros com um "existem milhões de pessoas e todos eles precisam de ajuda", acaba por entender o imenso valor de se fazer algo para ajudar uma única pessoa que seja dentre estes milhões. E a mensagem vêm de forma bastante plausível pintada por tons de paranóia e conspirações, e que deixam no ar o leve sentimento da inevitabilidade. Se não chega a ser tão espetacular e surpreendente quanto Cidade de Deus, essa nova empreitada de Fernando Meirelles pelo menos dá reais mostras de que seu talento para retratar os descaminhos da sociedade e ainda por cima fazer cinema de qualidade permanece intacto e promete ainda mais. Fica aí a dica. Confiram esse belo trabalho.
Um comentário:
Vlw, salvou meu trabalho pra amn
Postar um comentário