quinta-feira, 17 de maio de 2012

[Mad Men] 5x09 Dark Shadows

"This could change everything."

Para quem levantava suspeitas desde que foi revelado o título do episódio dessa semana, já que iria ao ar justamente na mesma semana em que o filme de Tim Burton chegava aos cinemas americanos, tudo não passou de mera coincidência. Na verdade, trata-se da novela original (a qual o filme atual é adaptado) bastante popular na época, que alcançou verdadeiro sucesso depois de enveredar por caminhos sobrenaturais. Além da colega de Megan ter conseguido um papel nesta novela, o título ainda pode estar relacionado a um intenso nevoeiro que cobriu a cidade de Nova York no ano de 1966. E num clima sombrio como esse, os personagens lidam com as dificuldades de manter segredos e controlar seus sentimentos quando são enfim revelados. Muito conflitos surgem a partir disso: Sally perde o respeito que tinha por Megan, Peggy sente-se traída por Roger e Ginsberg fica furioso por Don prejudicá-lo numa concorrência criativa. Megan é quem consegue melhor encarar essa situação, enxergando de longe o plano manipulador de Betty, mantendo a calma antes de desfazer as confusões na cabeça de Sally. Suas aulas de interpretação acabam sendo úteis até quando Sally precisa contar para a mãe como eles reagiram. Mas a presença de Betty no episódio, como sempre, divide opiniões. Embora tente controlar o peso através de um programa de ajuda mútua, Betty continua mostrando a mesma insatisfação com sua vida e invejando todas aquelas que alcançam melhores resultados que ela. O esperado encontro com Megan é cheio de rancor, ainda que totalmente compreensível. Além das invejáveis curvas da nova senhora Draper, o apartamento moderno no fervor da cidade é oposto a todo aquele isolamento no subúrbio que Betty aturou enquanto casada com Don. E o bilhete improvisado, repleto de amor, com certeza seria um golpe duro demais para Betty suportar, principalmente por estar mais que evidente que seu casamento com Henry foi outra aposta errada. Tomada pelo ódio, Betty é capaz de tramar um plano tão diabólico, que envolve até a própria filha para se vingar de Don. E fica cada vez mais difícil entender seus motivos, pelas poucas vezes que aparece, sempre com atitudes tão sórdidas. Deve ser razão de preocupação para os produtores, porque com essa postura de vilã, Betty tem sido o que mais aproximou a série até hoje daquele rótulo que eles tanto tentam evitar: a telenovela de luxo.

Porém, Don Draper também não deve se orgulhar de suas atitudes neste episódio. Os negócios na SCDP parecem estar melhorando -- até porque Lane Pryce está ausente há vários episódios -- e finalmente Don está de volta à criação, embora ainda mostrando claros sinais de falta de prática. Além disso, durante sua ausência, Ginsberg tem ganhado tanto espaço na agência, assinando a maioria das campanhas, que começa a se tornar uma potencial ameaça. Até entendo que a intenção de mostrar ideias tão distintas para o SnoBall, em termos de encaminhamento e principalmente qualidade, sirvam para guiar o espectador que não esteja familiarizado com a área de publicidade. Mas bem que poderiam ter criado uma ideia melhor para Don, ao menos que convencesse que ele teria chances mesmo se tivesse apresentado também os cartazes de Ginsberg. Ainda reforçaria mais o desespero de Don, apelando para um golpe tão desleal antes da reunião. O que deveria permanecer em segredo, acaba sendo revelado na primeira oportunidade por Harry (sempre ele) e desperta o temperamento explosivo de Ginsberg. Ele não hesita em confrontar Don, que responde mostrando poder controlar até suas ideias, e não dando a menor atenção para seu inflado ego.

Já Pete continua fracassado tanto em suas fantasias envolvendo Beth quanto ao criar ilusões de grandeza para aparecer em uma matéria especial sobre publicitários na revista do NY Times. Nem Howard leva Pete a sério, mesmo que ele revele sarcasticamente suas façanhas com Betty. Enquanto isso, Roger tenta fisgar por conta própria um cliente judeu interessado em expandir seus negócios, para isso utilizando a companhia de Jane. Para esse encontro, eles precisam manter em segredo sua futura separação e ao mesmo tempo tomar proveito da origem judia de Jane, que Roger tanto tentava esconder. Não sem precisar mais uma vez colocar a mão no bolso e comprar um novo apartamento para Jane morar. Mas ele acaba estragando a possibilidade de um recomeço para sua ex-mulher após preenchê-lo com novas memórias suas. Peggy também fica extremamente decepcionada por Roger ter confiado esse serviço extra a Ginsberg, por mais que ele fosse o mais indicado. Ela esperava ao menos algum tipo de lealdade de seu chefe, até em uma parceria inusitada. Mas Roger deixa bem claro que cada um deve defender seus próprios interesses. E esse parece ser outro tema recorrente ao longo do episódio: indivíduos preocupados apenas em satisfazer seus próprios egos. Essa temporada parece estar conduzindo todos os personagens ao isolamento, com exceção obviamente do casal do momento: Don e Megan. Por isso, não parece à toa que Don consiga lidar tão bem com as dúvidas de Sally, explicando honestamente os motivos que levaram-no a casar-se com Anna, respeitando também os limites de compreensão de sua filha. "Dark Shadows" pode não ter sido o episódio mais memorável da série, mas continua a reforçar que os altos e baixos do relacionamento entre Don e Megan tendem a virar a principal razão de Mad Men ser reconhecida de agora em diante.

Fotos: Reprodução.

e.fuzii
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quinta-feira, 10 de maio de 2012

[Mad Men] 5x08 Lady Lazarus

"Surrender to the void."

Depois de cinco temporadas acompanhando Don Draper em Mad Men, era possível que qualquer espectador antecipasse sua reação quando colocasse para ouvir a última canção do revolucionário disco dos Beatles, Revolver. Sozinho em seu apartamento, confortavelmente reclinado em sua poltrona, entre o som de cítaras, cantos de pássaros e vozes distorcidas, Don certamente iria preferir o barulho da cidade entrando por suas janelas. Ele chega a confessar pouco antes para Megan que não entende o apelo da música pop na publicidade da época, e sente que está ficando ultrapassado. Pode parecer uma constatação explícita demais, indo direto naquilo que temos acompanhado, mas essa temporada tem apresentado cada vez mais esse tipo de discurso, como por exemplo, Roger analisando seu casamento com Mona no episódio anterior. Os tempos são outros e todas as mudanças tornam-se mais evidentes, fica impossível tentar contornar. O episódio piloto mostrava Don revertendo os malefícios do cigarro criando uma campanha em que provocava e confundia seu consumidor, mas nos últimos tempos ele mesmo teve de se render aos apelos da sociedade do câncer e publicar sua famosa carta anti-tabaco. O cliente, já seduzido pelas comerciais de televisão, não se contenta mais apenas com uma ideia, ele quer também entender a execução. Ginsberg chega a arrancar aplausos de seu cliente pela performance do clipe dos Beatles. Novos negócios chegam à empresa pela promessa de uma atuação convincente do casal do momento, Don e Megan. Mas Megan, como vinha demonstrando nos episódios anteriores, não está satisfeita com esse sucesso.

Era previsível que ela abandonasse a carreira publicitária, mas não deixa de ser uma decisão corajosa por parte dos roteiristas, principalmente pela comodidade de ter Megan sempre presente, convivendo com Don e os outros funcionários da SCDP. Embora não houvesse necessidade de prolongar tanto sua "despedida", o mais interessante foi a reação dos outros personagens diante dessa decisão, cada um refletindo sua própria condição na agência. Stan, que tem aparecido como coadjuvantes em todas as apresentações para clientes, culpa a profissão pela sua desistência, por não valer a pena se preocupar por tão pouco. Peggy acredita que tenha sido dura demais, mas também não enxerga outro modo de lidar com essa situação que Don lhe colocou. Para Joan, Megan está apenas aproveitando as boas condições que seu casamento oferece, algo que ela também procurava quando se uniu a Greg -- caso ele fosse bem sucedido em sua carreira. Já Don vive durante o episódio um longo processo de aceitação. Em um momento de fúria, após o fracasso da apresentação ao lado de Peggy, ele chega a culpar a pressão dos colegas na agência, lembrando que Megan havia reclamado deles no início da temporada, certamente transparecendo sua própria insatisfação com o trabalho.

Megan vinha sendo nesta temporada uma forma de desviar a atenção de Don dos assuntos da agência, e os poucos momentos que ele se sentia motivado eram justamente ao lado de sua mulher. Mais do que isso, Megan era sua passagem para essa nova geração. Na simbólica despedida do casal, isso não poderia fazer mais sentido: enquanto Megan embarca no elevador em busca de novos desafios, Don termina encarando um fosso vazio. Poderia ser apenas obra do acaso, um destino irrevogável. Mas não foi o próprio Don Draper quem escolheu por esse destino? Joan estava certa em prever que Megan se tornaria uma nova Betty? Roger sugere que ele tente estabelecer uma rotina para esse relacionamento funcionar, mas bastam duas noites para Don perceber que isso não depende só dele. Na primeira, ele parece satisfeito em encontrá-la em casa preparando seu jantar, mas na segunda, o encontro é breve até que ela tenha de sair para sua aula de interpretação. Megan diz que era assim que imaginava que ele seria como marido, mas pela reação de Don, ele não parece ter essa mesma convicção.

Pete volta neste episódio, depois daquele nocaute sofrido, para ser confundido novamente pelas suas fantasias. Dessa vez elas surgem ao encontrar Beth (interpretada por Alexis Bledel, que me isento de comentar por Gilmore Girls ser uma de minhas séries favoritas), a mulher de Howard, seu companheiro de trem a caminho da cidade. Pete parece chocado com a indiscrição dele, que é capaz de alugar um apartamento na cidade para manter uma de suas amantes. Depois de uma carona e sexo casual na própria sala de Beth, Pete enxerga neste relacionamento a maneira ideal de solucionar os problemas dos dois. Afinal, ele assume que ambos estão infelizes em seus respectivos casamentos. Sua obsessão é tanta que até se arrisca ao demonstrar interesse pela oferta de Howard, só para ter poucos minutos com Beth, roubar-lhe um beijo, mandar um recado. Como um adolescente sufocado por uma paixão juvenil. Mas seus sonhos são dissipados como o coração desenhados por Beth no vidro embaçado. Durante toda a temporada um aspecto sombrio parece envolver Pete, nos seus pertences, suas conversas, seus desejos. Pelas constantes decepções, não seria demais esperar pelo pior. O próprio título do episódio é baseado em um poema de Sylvia Plath contemplando o suicídio. Por mais que alguns até torçam por isso, acho que a série só tem a perder com a saída dele, principalmente agora que a dinâmica na SCDP com Megan ficou para trás. Mas como Mad Men nunca se baseou em grandes acontecimentos dramáticos, deve ser apenas um mau presságio, como no caso do falso alarme com o câncer de Betty.

Fotos: Reprodução.

e.fuzii
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sexta-feira, 4 de maio de 2012

[Mad Men] 5x07 At the Codfish Ball

"Dirty."

Talvez seja cedo demais para garantir isso, só agora atingimos a metade da temporada, mas tudo leva a crer que Sally Draper será a principal voz desse ano. Afinal mesmo com curtas participações (no episódio anterior ela apareceu em uma única cena de flashback) Sally, em sua inocência ainda infantil, consegue sempre expor aquilo que todos parecem querer esconder ao seu redor. Ela lembra até um narrador-personagem, através de um ou outro recurso narrativo, comentando as mudanças acontecendo em seu mundo. Muitos espectadores ainda temem seu futuro, mas para mim, já que sua maturidade confunde-se com as próprias transformações dos anos 60, Sally é quem mostra maior capacidade de se adaptar enquanto cresce, ao contrário de quem precisa abandonar tantos vícios. Sua constatação final, sobre a condição suja da cidade, é algo aparente para todos os outros personagens mas que nenhum deles tem coragem de dizer, ou mesmo vontade de ver. Sally está cada vez mais solitária, com a mãe ausente (os roteiristas estão prestes a esgotar todas as desculpas possíveis para manter Betty fora da série) e seu pai mais preocupado com sua nova vida na cidade. Além disso, essa idade de transição é bastante delicada, tanto por suas fantasias serem desmanchadas pouco a pouco (a entrada triunfal no baile por uma escada enorme, por exemplo) como por ainda não poder se portar como adulta. Na festa em que Don recebe um prêmio pela sua carta anti-tabaco, ela termina esquecida na mesa, tendo de se contentar com o peixe que despejam em seu prato, e até uma simples ida ao banheiro representa o perigo de se deparar com a promiscuidade escondida por trás da primeira porta que se abre. Por mais traumático que isso possa ser, Sally ainda tem todo tempo para superar, ao contrário das outras filhas a aparecerem no episódio: Megan e Peggy.

Megan finalmente recebe a visita de seus pais, que parecem viver um relacionamento bastante turbulento. Emile é o típico escritor decadente, que provavelmente escreveu uma grande obra na carreira e nunca mais fez sombra a esse sucesso em suas publicações seguintes. Já Marie aparenta uma constante frustração. Dá para entender por que ela se casaria com Emile, mas o tempo parece ter desgastado a relação a ponto dela não aguentar a implicância do marido com tudo. Mesmo que estivesse o tempo inteiro nesse fogo cruzado dos pais, Megan ainda arranja tempo neste episódio para se destacar em seu trabalho, ao sugerir uma nova abordagem para o comercial da Heinz, baseado no jantar em família da noite anterior. Impressionante não apenas pela ideia, mas também na apresentação improvisada frente ao cliente em um jantar informal, quando Megan percebe que a SCDP está prestes a ser dispensada. A virada de jogo é incrível, principalmente pela sintonia com Don -- num apelo nostálgico que é o estilo dele -- como se tivessem ensaiado por semanas, cada palavra, cada gesto, cada interação com o cliente. Eles chegam até a induzí-lo a pensar que a ideia de colocar os mesmos atores para interpretar mãe e filho em todas as cenas fosse inteiramente dele. Mas apesar de acender uma chama de amor nos Draper enquanto retornam para casa, o entusiasmo de Megan parece desaparecer aos poucos na manhã seguinte. Por um lado, mesmo que seja reconhecida pelos demais funcionários da agência, Megan teve de abrir mão da total autoria do comercial frente ao cliente, principalmente porque Don (ou outro homem qualquer, Peggy que o diga) certamente seria mais convincente para ganhar sua confiança. Por outro lado, Emile se mostra extremamente decepcionado na festa pela filha ter abandonado seus sonhos para escolher o caminho mais fácil, a vida de luxo que Don pode proporcionar. Em outras ocasiões Megan já havia hesitado quando ganhava espaço na agência, e agora entendemos o porquê: ela ficava cada vez mais distante da carreira de atriz.

Peggy também se mostra confusa quando Abe propõe que passem a morar debaixo do mesmo teto. Afinal, por mais moderna que possa ser, Peggy ainda não sabe lidar prontamente quando sente seu conservadorismo sendo ameaçado. A mensagem contida na tal campanha da Heinz, certos costumes que são passados de geração em geração, funciona como um excelente paralelo para a postura de Megan e Peggy em relação aos seus pais. São aquelas rígidas estruturas que regem nossa sociedade, que por mais que sejam chacoalhadas, sempre permanecem intactas. Peggy desafia um destes tabus quando convida sua mãe num jantar em seu apartamento, a fim de contar a novidade. Com certeza ela já era capaz de prever a reação de sua mãe, só não esperava que fosse além da questão da união pecaminosa vista aos seus olhos, mas uma preocupação pela filha não estar sendo valorizada como merece. Joan, agora a mulher madura da SCDP, tem papel fundamental para ajudar Peggy a entender seus sentimentos, tanto convencendo que o jantar especial com Abe é sinal de boas notícias, quanto provando depois que um documento assinado pode não ter valor algum. Peggy também oferece seu apoio a Megan na manhã seguinte ao triunfal jantar. Embora com um texto óbvio demais -- Peggy se esforçando para explicar que não deveria sentir inveja --, ela aconselha que Megan aproveite o máximo de prazer que esse trabalho poderia lhe proporcionar. Há um tempo atrás era Don quem dava esse conselho para sua aprendiz. Acho realmente admirável essa união feminina durante o episódio, porque mesmo em um contexto mais moderno, não deixa de representar esses ideais já sendo passados entre diferentes gerações. Afinal, entre tradições antigas e tentações modernas, somente unidas essas personagens serão capazes de atravessar essa época, saindo da penumbra dos bastidores ("Go get 'em, Tiger!") para finalmente abrir suas asas e voar livremente.

Fotos: Reprodução.

e.fuzii
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