terça-feira, 16 de agosto de 2011

[Breaking Bad] 4x05 - Shotgun


Tim - "You see Pinkman as a shooter?"

Hank - "That would surprise me."

“I had a guy, but now I don’t. You are not the guy.” - Mike


Nada de execução, reabilitação, choque de realidade ou ameaça a seu irmão caçula. Mike leva Jesse simplesmente para um dia de trabalho fora do laboratório. Breaking Bad, como sempre, está a alguns passos à nossa frente e qualquer tentativa de imaginar o que vai acontecer (e como acontecerá) acaba sendo frustrada. E normalmente é uma solução mais interessante, coerente, que a nós, pobres mortais, só resta admirar.


No início, ainda a tensão do que aconteceria, elevada pela geografia do lugar (a fotografia, pra variar, é linda), deserto, cujo único som é de um moinho aparentemente abandonado. Nem mesmo Jesse foi capaz de se manter na indiferença e finalmente começou a temer por sua própria vida. Depois, quando revelado o que estão fazendo no meio do nada com uma pá, ficamos tão perdidos quanto Jesse, e mais adiante percebemos que o próprio Mike só está recebendo ordens sem saber exatamente o motivo de tudo.


Durante o episódio, é possível imaginar algumas razões para aquilo. Primeiro, é bom lembrar que sabemos o porquê de Jesse ter transformado sua casa em um inferno, mas não é algo que necessariamente os demais personagens saibam. Mas uma coisa Mike e Gus imaginam: Jesse está usando drogas. É uma questão curiosa, porque até agora vimos o personagem cheirando (cocaína, imagino) uma única vez, quando convence Badger e Pete a usarem, e nada mais é mostrado neste sentido. Mas seria óbvio que Gus pensasse na droga como um problema e imaginei que um dos motivos para colocar Jesse naquela viagem seria comprovar até que ponto estaria sua dependência (verdade que é apenas um dia de trabalho, mas no laboratório há os intervalos e com Mike a jornada durou até a noite). O outro motivo que vi seria aproveitar a situação para observar como Walt se sai sem um assistente, e até que ponto seria necessária a presença de Jesse, com Tyrus resolvendo o único "problema" aparente daquele dia.


Mas então temos aquela encenação, em que Jesse se sai muito bem, acreditando que salvou sua vida e a de Mike, e ainda retornando para buscar seu "parceiro" (aqui aproveito pra linkar uma breve entrevista do ator Jonathan Banks, onde diz que nesta temporada passará muito tempo com Aaron Paul; não mencionei no post anterior para não acabar com as expectativas de quem achou que Jesse morreria). Não sei até que ponto Mike está sendo irônico ao usar a palavra "heroi", mas com esta solução, Gus não apenas resgata a autoestima de Jesse, como é um primeiro passo para quebrar a aliança entre ele e Walt. Já que não pode se livrar desta dupla, separá-la parece ser uma jogada de mestre. E fica claro como Gus está certo, ao vermos a descrença de Walt quando Jesse diz o que fez. Walt é desprezível em muitos sentidos (mais sobre isso logo abaixo), mas não há dúvidas de como se importa com Jesse tanto quanto com sua família, preparado para morrer no início do episódio ao mesmo tempo em que se preocupa em deixar seu dinheiro para Skyler. O problema é que sua atitude paternal o impede de enxergar Jesse como um igual, apenas como alguém dependente dele. Seria possível surgir um conflito a partir disto.


A improvável parceria entre Jesse e Mike também é responsável pelo humor do episódio, com o primeiro morrendo de tédio e o último claramente insatisfeito com a companhia (hilário Jesse vendando seus próprios olhos e tirando sarro de Mike). Não sou fã de montagens aceleradas, mas Breaking Bad faz isso bem (aqui sob a direção de Michelle MacLaren, responsável também por "One Minute", última vez que vimos Hank falar de Jesse e que vimos uma ré sendo dada enquanto um homem armado se aproxima do carro), embalando a viagem dos novos parceiros e de Walt sozinho no laboratório, ambas, ao som de "1977", de Ana Tijoux (que viciados em games reconhecerão da trilha do FIFA 11 e pode ser baixada aqui).


Outro aspecto que não pode ser ignorado é o desabafo de Mike, claramente irritado ao Jesse sugerir que seria “o cara”, e que o faz lembrar de Victor. Mais uma vez a insatisfação dele manifestada sutilmente na série, também na cena com Gus, e já não tenho dúvidas que isso só crescerá e explodirá no futuro.



“We have to promise each other… no more secrets.” - Skyler

“Ah, this genius of yours… maybe he’s still out there.” - Walt

“Since when do vegans eat fried chicken?” - Hank


O outro grande evento do episódio é ainda mais surpreendente, ao mesmo tempo em que parece ser tão óbvio de acontecer. Hank não se interessa em investigar a morte de Gale, e com razão. Sua obsessão era prender Heisenberg e é compreensível sua frustração ao ver seu arqui-inimigo morto. Ele também descarta Jesse como o assassino pelos mesmos motivos que todos nós teríamos antes do personagem se ver obrigado a atirar em Gale (ajuda o fato de haver um retrato falado de Victor, eliminando de vez os nomes de Jesse e Badger da lista de suspeitos). Mas aí vem Walter White.


Sabemos do orgulho de Walt, que preferiu arriscar a vida cozinhando metanfetamina a receber dinheiro de seus antigos parceiros para o tratamento de câncer. Sabemos de sua arrogância, sempre disposto a mostrar seu conhecimento, de continuar nos negócios, simplesmente porque sua produção não pode parar. E sabemos também de sua fragilidade quando exposto a substâncias entorpecentes, como quando falou de seu segundo celular para Skyler na mesa de cirurgia ou como quase falou sobre Jane para Jesse em "The Fly".


Estas características mais o vinho tomado potencializam toda a frustração de Walt, que passou o episódio vendo perder o controle de tudo: ele não consegue se encontrar com Gus, encarando apenas câmeras de vigilância no lugar; Mike não lhe explica o que está acontecendo; compra o lava-a-jato e faz sexo com Skyler (aqui um momento genial, a mensagem de quem pensava que ia encarar a morte confundida com uma mensagem de afeto e declaração de amor) pensando no que pode ter acontecido a Jesse; ameaça parar a produção por estar sozinho, mas é intimidado por Tyrus; consegue voltar para casa, como há muito tempo queria, mas não como imposição dele, com Skyler até mesmo decidindo qual o dia para isso (e ver Walter Jr. tomando café numa caneca com BENEKE escrito não ajuda muito). Ao ouvir que seu trabalho é coisa de uma mente genial e rara, mas atribuído a Gale, não era algo que Walt poderia suportar calado.


Inicialmente, achei que a sequência serviria para Skyler descobrir sobre a morte de um fabricante de metanfetamina. Mas assim que Hank começa a falar sobre o caso, a câmera foca em Walt e se aproxima lentamente, sem cortes, até que ele começa a falar, enquanto eu esperava ansiosamente por um plano mostrando a reação de Skyler à história contada. Depois de pedir para que não haja mais segredos, não duvido que ela queira saber o envolvimento de Walt, que por sua vez talvez nem faça mais questão em esconder, não só pela nova relação com a esposa, mas seu orgulho e arrogância já não devem permitir que fique calado por mais tempo.


Falando em nova relação, as coisas também estão melhores entre Hank e Marie, como mostra a cena final, pouco antes da descoberta do papel com a marca do Los Pollos Hermanos. Walter White pode ter colocado Hank de novo em sua cola (e na de Gus), mas ao menos também ajudou a revigorar um casamento. Que lindo.




Hélio Flores
twitter.com/helioflores


4 comentários:

[ Alison do Vale ] disse...

Episódio fantástico. Adoro essa sensação angustiante que a série nos causa; é como estar à bordo de um caminhão sem freio. E a gente fica achando que já conhece os personagens, que já entendeu como a mente do Gilligan funciona e de que modo as ideias dele fluem mas aí a gente se pega torcendo "Não, Walt! Pelamordedeus não vai falar mais do que deve!" hahahah

Ótimo comentário, como de costume.
abraços

e.fuzii disse...

Realmente excelente a continuação do passeio pelo deserto de Jesse e Mike, mostrando principalmente a mente genial de Gus ao colocar Jesse sob controle. Recuperou o rapaz em tempo recorde, algo que Walt teria demorado meses (como no começo da temporada passada).

Já Walt começa a ameaçar a si mesmo com seu orgulho sem fim, e já passo a acreditar que um final em que ele terminasse preso e assim revelado ao mundo, não seria de todo mau. Agora que ele voltou a ser aquele cara pacato, submisso a Gus e a sua mulher, quero saber quanto tempo ele será capaz de aguentar.

Único porém do episódio foi o tal recado na secretária eletrônica, que por mais romântico que tenha sido, era claro que Walt estava em apuros. Mas enfim, não é toda ironia também que se pode acertar.

Hélio Flores disse...

Pois é, acho um absurdo o que Gilligan tem feito, a cada episodio a confiança so aumenta e a esta altura nao dá pra imaginar o nivel da série caindo.

Como de costume, esqueci de comentar algumas coisas, como duas relações frutíferas que vao ficando claras:

Jesse & Mike - o momento em que Mike permite que Jesse fume é muito bom, ha um orgulho na expressao de Mike, chamando-o afetuosamente de "kid". Bom lembrar que Jesse tem um fraco por crianças, que conhecemos muito bem, e Mike também, ou no minimo uma relação forte com sua neta. Ha algo de pai e filho aí que parece mais saudavel (pra Jesse) do que com Walt.

Walt & Skyler - acho que Skyler ja está pronta pra ouvir alguns podres mais de Walt e depois deste jantar na casa de Hank/Marie, ela sabe que o cunhado está numa investigação que pode levar a seu marido. Consigo visualizar no futuro alguma situação em que Hank so nao descobre a verdade graças a alguma intervenção de Skyler, que irá suprir as deficiencias de Walt no que diz respeito a mentir e dissimular.

Hélio Flores disse...

Fuzii, nao achei tao claro assim que Walt estava em apuros. Estava exacerbado, mas isso podia ser consequencia tanto de uma confissao amorosa dificil ou ate mesmo de uma embriaguez (ja que é tipico de Walt falar o que nao deve sob efeito de alcool hehe). Tambem vale lembrar que Skyler estava apreensiva e ansiosa por conta da compra do lava-a-jato e numa situação dessas a gente ouve o que quer, né? :P