quarta-feira, 5 de setembro de 2012

[Breaking Bad] 5x08 - Gliding Over All

  “How much is enough? How big does this pile have to be?” – Skyler

“Tagging trees is a lot better than chasing monsters.” - Hank



Um grande acerto desta quinta temporada de Breaking Bad foi começa-la com aquele flashforward. Foram oito episódios em que não aconteceu nada que pudesse levar àquele momento. Pelo contrário. Enquanto a quarta temporada foi um verdadeiro inferno para Walter White (temendo ser morto por Gus, afastando-se de Jesse cada vez mais, Hank mais próximo da verdade), aqui tudo parece dar certo: destrói evidências da polícia, consegue fazer Mike e Jesse seus sócios, cria um laboratório à prova de investigações, rouba um trem e, por fim, elimina todas as pessoas que poderiam envolvê-lo com Gus Fring – inclusive Mike.


E, ao fim de “Gliding Over All”, as perguntas que aquele flashforward deixava, permanecem: Por que Walt parece tão acabado? Onde está sua aliança? Por que usa uma identidade falsa? A tosse é um sinal de que o câncer voltou? Pra que aquele armamento pesado? Seria frustrante não termos respostas se fosse o final de uma temporada “normal”, mas com esta divisão é preciso relevar muita coisa. Importa é que, além de servir como uma sombra que paira sobre cada ação vista nesta temporada, elevou a tensão de um episódio em que aparentemente não era pra ter tensão alguma. 


Sabíamos que os nove homens de Mike não seriam problema porque Walt teria ainda um ano pela frente – daí mais uma boa montagem que mostra rapidamente a eliminação de todos, no melhor estilo O Poderoso Chefão. E parecia óbvio que a passagem do tempo só poderia ser mostrada daquela forma, provavelmente a mais bela que a série já realizou (como se os realizadores tivessem esperado cinco anos por aquele momento para usar Crystal Blue Persuasion), no momento em que nada ameaçava o império do protagonista. 


O que não sabíamos (e não sabemos ainda) é que tragédia ocorre meses depois, fazendo cada sequência, a partir dali, ser carregada de tensão e perigo: Skyler, Walter Jr., Holly e Marie reunidos, com Jr. atendendo uma ligação e saindo; Skyler chegando em casa e encontrando luzes apagadas e aberta a porta que dá para a piscina; Skyler na cozinha e a porta de casa se abrindo; Jesse ouvindo alguém chegar em sua casa; e, claro, todos reunidos na piscina a poucos minutos do fim do episódio, sequência de parar o coração que me lembrou situação semelhante no final de Sopranos. Em todos estes momentos achei que algo aconteceria, graças à tragédia anunciada no início da temporada, mas também, em relação à família na piscina, a uma grande sacada. Walt desistindo dos negócios guia nossas expectativas e acreditamos matar a charada: algo terrível vai acontecer porque alguém não aceita a desistência de Heisenberg. E, para surpresa absoluta, algo totalmente diferente encerra o episódio.


Mas primeiro falemos sobre Walt desistindo dos negócios. Há uma história amplamente conhecida (e, confesso, não sei se é verdade ou mito) de que Alexandre, o Grande teria chorado ao perceber que não havia mais nada para conquistar. Cabe perfeitamente na história de Walter White: após cinco temporadas de pura adrenalina, tensão, medo, desespero, coisas hediondas e grandes conquistas, Walt consegue estabelecer seu império e nada tem a temer. É o que ele queria, bem explicitado na conversa com Jesse alguns episódios atrás, mas uma vez almejado o objetivo, e agora? A brilhante sequência da passagem dos três meses nos mostra um Walt que muito trabalha mas se vê à noite cansado e entediado, em uma casa imersa na escuridão, convivendo com uma esposa que o odeia e sem a presença dos filhos.


Ver o dinheiro que conseguiu (e que nunca gastará todo) talvez tenha sido o empurrão que precisava para perceber o vazio de sua existência. Ele até procura Jesse, não só porque se importa e quis pagar uma dívida (sabemos que por mais monstruoso e manipulativo, nunca houve nada que desmentisse o fato de que Walt gosta e se preocupa com Jesse), mas porque ele precisava manter um elo com o momento de sua vida que mais teve sentido; relembrar as aventuras com o trailer é se apegar a um passado que parece distante e que deu lugar ao tédio e a uma rotina que pouco envolve as pessoas com quem ainda se importa.
Mas é possível também que a desistência de Walt esteja relacionada a algo não visto (descarto a possibilidade de que ele mentiu para Skyler, pelo simples fato de que ele precisa dela para lidar com o dinheiro que ganha), como o resultado do exame que faz. Sabemos que a visita médica é rotina (também vimos isto na temporada anterior), mas o retorno do câncer é a forma mais contundente de mostrar ao personagem sua mortalidade. E que genial resgatar o dispenser de papel toalha, que continua lá, amassado, em um acesso de fúria de Walt quando recebeu boas notícias sobre a doença no momento em que já tinha aceitado sua morte (no episódio 2x09, “4 Days Out”). 


“Gliding Over All”, aliás, é uma coletânea de referências a vários momentos da série, sem nunca chamar atenção para eles (a não ser, claro, que tenha função dramática, como o caso do dispenser), como podemos ver neste link. Ainda podemos citar a fala “Learn to take yes for an answer” de Walt para Lydia, mesma coisa que ele ouviu de Mike em 4x02, “Thirty-Eight Snub” e também Walter Junior brincando de peekaboo com Holly.


E, por fim, temos a ida de Hank ao banheiro. Provavelmente o momento mais esperado da série, que sabíamos que chegaria um dia (mas não quando e nem como), é este em que Hank descobre sobre Walt. Até parece óbvio encerrar uma temporada assim, porque cliffhanger maior não poderia haver. Mas a situação é tão inusitada e inesperada que me fascina a coragem de Gilligan e seu time de roteiristas.


Primeiro, o erro de Walt. Mais uma vez vale lembrar a frase de Hank dois episódios atrás, sobre profissionais também cometerem erros. Critiquei a forma como conduziram os erros de Mike, porque destoavam do personagem. Mas não me parece ser o caso aqui: Walt é orgulhoso demais para não guardar o presente de um químico brilhante que, em dedicatória, diz ser uma honra trabalhar com ele. Ele fez questão de manter aquele livro como recordação de seu triunfo (e realmente é interessado na poesia de Whitman – Walt está lendo este livro logo após ganha-lo de Gale no momento em que Hank liga para ele em 3x06, “Sunset”) e não creio ser descabido pensar que circulou por cômodos na casa de Walt tantas vezes nos últimos meses que há muito tempo deixou de ser visto como evidência contra ele – se é que algum dia chegou a ser visto desta maneira. E nem quero entrar em questões do inconsciente, como Walter ter o desejo de ser pego ou viver perigosamente, como quando colocou Hank de volta às investigações ao falar que haveria alguém por trás de Gale...


A incrível coincidência, então, parece estar ligada àquela noção de carma e azar que tantas vezes rondou a série. Se Gilligan chamou o acidente aéreo de “Lucifer-ex-machina”, aqui nem é preciso mudar o nome do recurso, mas ao contrário, tornar literal o conceito: trata-se de uma verdadeira "Justiça POÉTICA". Se o castigo veio do céu quando os aviões colidiram, agora vem diretamente do inferno, mensagem especial de Gale. Que esta descoberta de Hank tenha se dado naquela situação, é alcançar um novo nível de tragicomédia. Além do fato de vir no exato momento em que Walt desistiu dos negócios.


As implicações disto são fascinantes. O que Hank fará ao sair do banheiro? Que tipo de investigação poderá fazer e o que mais pode descobrir, uma vez que Walt se tornará um pacífico dono de lava-a-jato? O quanto descobrirá sobre o envolvimento de Skyler (imaginem Hank seguindo-a e descobrindo a pilha de dinheiro)? Que tipo de reação esperar do homem obcecado por Heisenberg e que descobre tratar-se de seu cunhado, pai dos filhos que ele cuidou por um tempo e que ama como se fossem seus? Que teve seu tratamento pago por dinheiro vindo da “blue meth”? O que pensariam seus colegas de trabalho se descobrissem que o homem mais procurado do DEA vive tão próximo e intimamente dele?


E isto ocorre alguns meses antes de Walt completar 52 anos e estar com uma identidade falsa e armamento pesado. Será Hank a vítima que ficará entre Walt e algum criminoso (De Phoenix? Da República Tcheca?) que exige o retorno de Heisenberg para os negócios? Não dá para esquecer também a sequência no episódio anterior em que a polícia revista a casa de Mike enquanto este assiste a “Os Corruptos”, obra-prima de Fritz Lang. Um policial comete suicídio no início do filme e é a este acontecimento que os personagens se referem e que ouvimos em off quando há um close em Hank (e mais tarde ele simula se matar ao sair de sua sala para pegar café para um Walt choroso, com um tiro na cabeça, da mesma forma – e do mesmo lado – que o policial do filme).


São muitas especulações e apenas uma certeza: a de que um ano nunca demorará tanto para passar como este próximo. Sobreviveremos?




 

Hélio Flores

10 comentários:

Daniel Souza disse...

Ótimo texto. Acredito que a ida do Walter até a casa do Jesse tenha sido por um outro motivo além de pagar a sua dívida. Acredito que o Walter queria contar pra ele que o Câncer voltou,mas acabou desistindo por algum motivo. Vai ser duro esperar!!!

Hélio Flores disse...

Pois é, Daniel, a volta do cancer parece ser algo esperado por quase todo mundo. So que a serie nunca foi pelos caminhos que a gente pensava que iria. Acho que a cena do exame tambem estava la pra deixar todo mundo especulando...

abços!

Hélio Flores disse...

Duas coisas que acabei esquecendo de comentar no texto:

- Mais uma vez a ricina nao é usada. Ja foram tantas tentativas frustradas que parece meio obvio que quando finalmente matar alguem, será algo grandioso.

- O flashback no final parece recurso facil e desnecessario. É conhecido o caso do piloto de The Wire, que acaba usando algo parecido e destoa do restante da serie (como em Breaking Bad). No caso, decisão dos produtores da HBO que queriam deixar tudo as claras pro espectador mais desatento. Mas agora eu gostei porque termina a temporada com Walt erguendo as mãos e dizendo "You got me". Essa sequencia no banheiro é toda carregada de ironia.

[ Alison do Vale ] disse...

hank descobriu tudo ~na cagada~ =S

acho q a ricina ele vai acabar usando é em si mesmo =/

Roger disse...

Belo texto, mas ao contrário de você, não gostei do final. Achei que na vontade de surpreender a todos, Vince Gilligan acabou por forçar uma situação. Os primeiros trinta minutos iniciais são perfeitos, mas aí o cara decide parar com tudo? Até entendo os motivos, mas e a "logística" do empreendimento, como ficou? Walter estava fornecendo a droga para todo o estado e, de quebra, ainda supria a Rep. Tcheca e seus milhares de viciados para, de repente, aposentar? E seus parceiros de negócio deixariam por isso mesmo? Quem estava cozinhando? Todd? Sozinho? Impossível, visto que a meth "perfeita" era quase uma exclusividade do senhor White. Ele podia ter feito um estoque. Mas seria bem improvável um sujeito com a ajuda de apenas um ajudante, suprir um mercado gigantesco (o que fica evidente na absurda quantidade de dinheiro que ganhou) e ainda assim arrumar tempo para estocar. Não dá pra crer também que continuava trabalhando escondido da mulher. Skyler teria que ser muito burra para acreditar que o marido parou, mesmo com ele saindo todos os dias e ficando horas fora de casa sem um trabalho fixo sequer. Quanto ao final, acho que o momento "hank-descobre-a-verdade" seria o maior (ou um dos) clímax da série, ela meio que nos preparou para isso, aí o cara senta no vaso, pega um livro, tem um flashback, junta os pauzinhos e (oh! oh!)... Na boa, pareceu enredo ruim de novela das oito.

Anônimo disse...

Olá Hélio. Para falar a verdade não tinha gostado muito desse final, talvez em função também de grandes expectativas que tinha em relação ao final de meia temporada , porém o seu texto me ajudou a colocar algumas coisas em perspectiva e também me fez reparar em algumas coisas que deixei passar. Acompanho seu twitter para pegar algumas dicas de filmes também , muito bacana.

Abraços, João

Laura. disse...

Seu poder de observação e atenção a detalhes e a costurá-los com a trama me fez gostar mais desse episódio, que eu tinha achado fraquinho (pela primeira vez).

Hélio Flores disse...

Alison, tambem ja pensei nessa possibilidade da ricina ser o fim do Walt. Seja como for, acredito que será usada mesmo em um dos personagens principais.

Roger, repare que todas as críticas que voce faz ao suposto abandono do Walt nao podem ser feitas ainda simplesmente porque a única coisa que vimos foi ele dizer a Skyler que saiu dos negócios. O episódio nao aborda as consequencias disto, ate porque nao dá tempo. Toda essa historia deve ser contada nos proximos episodios ou, se ficar por isso mesmo (o que duvido), aí sim podemos condenar.

João e Laura, que bom que o texto ajudou ampliar perspectivas. Maior elogio que quem escreve pode receber! :)
Quanto ao twitter, Joao, pra pegar dicas de filmes tem que ler muita bobagem, hein? :P

abços!

marcelo disse...

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Rudá disse...

Texto muito bem feito, análises muito profundas também. Aliás, textos. Pois li 4 posts em seguida. Aguardo ansioso por suas análises quanto a temporada que está chegando (julho, salvo engano).

Bons dias e belas noites.