quarta-feira, 17 de julho de 2013

[Emmy 2013] Melhores Séries - Drama (Novatas - Parte 2)


Completando o top 10 de novas séries do ano (sem spoilers):






5º - Les Revenants (Canal+)

Com a popularização cada vez maior das séries americanas na última década, é questão de tempo para que haja um fenômeno mundial vindo de outro país. E a série francesa “Les Revenants” é uma ótima candidata a isto. Baseada em um filme de 2004 com mesmo título, nela temos o retorno de mortos a uma pequena cidade. Não são fantasmas ou zumbis: voltam com a mesma aparência de quando morreram (que pode ter sido recentemente ou anos ou décadas atrás), sem a lembrança da morte. Algo parecido com “Incidente em Antares” de Érico Veríssimo, que se tornou minissérie da Globo no início dos anos 90. Talvez por ser francesa, a estética é diferente do que estamos habituados mesmo na diversidade de estilos e formas da tv americana: os planos são mais abertos, duram por mais tempo e não há muito blábláblá. Personagens parecem falar apenas quando necessário e seu silêncio é preenchido por uma trilha sonora perfeita para o clima mórbido e de mistério que se instala naquela cidade. Não há pressa na narração, usando uma estrutura que parece herdada de “Lost”, com as informações que nos chegam aos poucos e cada episódio centrado em um personagem (recebendo o nome dele como título), de quem saberemos um pouco mais a respeito.  O elenco é ótimo, com alguns já conhecidos nomes do cinema francês (a bela Anne Consigny, Frédéric Pierrot e Clotilde Hesme), não só bem dirigido como muito bem filmado, sendo uma série que valoriza o rosto de seus personagens (o menino Victor é particularmente assustador). Sem apostar em sustos, escatologia ou acontecimentos espetaculares, “Les Revenants” consegue prender a atenção calmamente nos guiando pelo mistério e fantástico da sua história até atingir um clímax dramático, mas menos empolgante do que deveria ser – talvez aí fosse necessária uma boa dose de adrenalina que nos foi recusada durante seus oito episódios. Ao menos deixa pontas soltas para uma nova temporada que, espero, não demore a chegar.

Chances no Emmy: Apesar de lançada no período (final de 2012), “Les Revenants” ainda não foi exibida por um canal da tv americana, o que a torna inelegível para o Emmy.




4º - Orphan Black (BBC America)

Uma pequena produção canadense com elenco quase que totalmente desconhecido tornou-se uma das melhores surpresas da temporada. A grande diversão de “Orphan Black” está em como vamos descobrindo o que está acontecendo junto com sua protagonista, e como os roteiristas são capazes de criar situações que a colocam em enrascadas gradativamente maiores. E não é porque trata-se de uma ficção barata de conceitos simples (e às vezes absurdos), que não se pode ter respeito à nossa inteligência: alguns segredos são mantidos, com personagens sendo enganados até onde é possível; ninguém é convenientemente burro, e isso faz com que a trama se mova constantemente. O prazer em se ver a série me lembrou dos bons tempos de “Alias”, uma aventura divertida e empolgante que me fazia querer ver logo o episódio seguinte. E como a série de JJ Abrams tinha Jennifer Garner, “Orphan Black” tem Tatiana Maslany, uma jovem e desconhecida atriz canadense que se tornou a maior estrela do ano. Como Garner, Maslany tem carisma, energia e consegue alternar força e fragilidade (além de linda e gostosa, como algumas cenas calientes podem deixar claro). Mas com um importante diferencial: a série permite que Maslany interprete várias personagens, todas bem diferentes entre si em comportamento, personalidade, jeito de andar e até sotaque. Como se não bastasse, há situações em que uma personagem se passa por outra, o que resulta em uma performance totalmente nova: se Alison precisa fingir ser Sarah, conseguimos sentir que é Alison (a dona de casa comportada) se esforçando pra parecer Sarah (a “boca-suja” britânica). Essa perfeita aliança entre trama bem escrita/dirigida (cômica, boas cenas de ação e tensão) e uma verdadeira estrela supera e muito a pretensão de grandes temas e refinamento técnico que marca muitas produções ambiciosas de grandes emissoras.

Chances no Emmy: Não é uma série com perfil da premiação, mas não tenho dúvidas: críticos e especialistas assistirão às indicações com a maior expectativa na categoria de Melhor Atriz, aguardando ansiosos para ouvir o nome de Tatiana Maslany. Há alguns meses, a indicação era impossível. Mas “Orphan Black” começou a ser comentada nas redes sociais e todas as atenções se voltaram a Maslany. A atriz ganhou recentemente o Critic’s Choice Awards, disputando com Claire Danes e Julianna Margulies, e está indicada a Melhor Performance do ano, masculina ou feminina, pelo prêmio da Associação dos Críticos de TV, e é considerada favorita (onde concorre com Bryan Cranston). Prêmios da crítica não costumam influenciar a preferência do Emmy, mas o boca-a-boca acabou gerando elogios mais do que entusiasmados de gente como Damon Lindelof, Shaw Ryan e Patton Oswalt. O quanto de membros do Emmy acompanham as redes sociais, tiveram tempo para ver uma desconhecida série e estão preparados para sacrificar uma atriz queridinha pra votar em Maslany? Logo vamos saber.





3º - Hannibal (NBC)

Quando soube que fariam uma série sobre Hannibal Lecter, tinha certeza que não daria certo. Felizmente, não poderia estar mais errado. Não conheço os trabalhos anteriores de Bryan Fuller (os dois primeiros episódios de “Pushing Daisies” não me empolgaram), mas está claro que certos temas e conceitos visuais são seus motivadores (seria ele um “autor” no sentido que autoria tem na crítica de cinema inaugurada pela Cahiers du Cinema?), já que “Hannibal” tem uma identidade muito própria, na forma como representa o dom de Will Graham, na encenação que constantemente enquadra seus protagonistas de perfil confrontando uns aos outros, no clima de morbidez construído pela presença de uma trilha sonora instigante, na beleza plástica e sempre impressionante com que filma as refeições de Hannibal e os assassinatos de serial killers que são verdadeiros artistas. Tudo isso para mergulhar fundo na nossa obsessão pela morte e pelo macabro, e não numa necessidade de reverenciar, homenagear e copiar as obras anteriores que trataram do personagem que mudou o modo do cinema lidar com a sociopatia – um episódio como “Entrée“ impressiona por ser o máximo de inspiração e homenagem que se pretende fazer a “O Silêncio dos Inocentes”: há cenas e situações que evocam o filme, mas nunca deixa de ser um episódio da série que continua avançando sua trama e personagens. Este avanço, aliás, significa não suavizar ou retroceder a deterioração da saúde mental de Will; tornar crível a relação de todos com Hannibal, a ponto de que ninguém suspeite de sua verdadeira natureza; manter uma unidade da história principal (a que envolve Abigail) ao mesmo tempo em que precisa cumprir uma necessidade em ser serializada (com “casos da semana”). De modo geral, a série alcança esses objetivos, não sendo eficaz apenas em momentos isolados, seja por uma investigação apressada ou por algumas artimanhas de roteiro que salvam a pele de Hannibal. Pequenos pecados diante de um todo estimulante, com personagens inteligentes e bem construídos, que vão desde os investigadores de Jack Crawford a terapeuta vivida por Gillian Anderson (a ideia de que Hannibal faça terapia parece péssima e só funciona porque a escrita é muito boa).

Chances no Emmy: Apesar dos elogios da crítica, a série foi um fracasso de audiência, sendo possível sua renovação para a segunda temporada apenas porque há investimento estrangeiro, o que reduz os custos da emissora. Fracassos assim não costumam receber atenção no Emmy. Ainda falam de que seria “pesada” demais para os votantes. Com este argumento não concordo, já que nunca tiveram problema em indicar séries como “Dexter” e “Breaking Bad”. “Hannibal” seria tão diferente, nesse sentido? A categoria principal parece uma impossibilidade, mas Hugh Dancy como Melhor Ator e Mads Mikkelsen como Ator Coadjuvante seriam mais do que justos (Laurence Fishburne tem momentos excelentes atuando com sua esposa – na vida real e na série -, mas não se submeteu). Mikkelsen em especial, pela dificuldade que é dar vida e tornar fascinante um personagem imortalizado por Anthony Hopkins, e de forma tão distinta. Votantes do Emmy tem uma queda por vencedores do Oscar, teriam também por vencedores de Cannes?




2º - The Americans (FX)

O que mais me impressiona nesta primeira temporada de “The Americans” talvez seja a sensação que passa de controle absoluto que os criadores da série têm sobre o material. É verdade que algumas arestas mereciam maior polimento: há mais idas e vindas no casamento dos protagonistas do que deveria, e os filhos nunca se tornam personagens interessantes. Mas ao final do último episódio, temos a certeza que conhecemos bem esses espiões da KGB que se passam por americanos de classe média, de como eles mudaram ao longo da temporada, de como a trajetória até chegar àquele final – tensa, com ação, reviravoltas e surpresas – estava, no fundo, contando uma história de amor, das mais inusitadas. Nada de “duas pessoas se conhecem, se apaixonam, se casam”, e sim duas pessoas que se casam, não se conhecem e... convivem por 15 anos até se apaixonarem. E, como toda grande série, não deixa de ter bons coadjuvantes que, como os protagonistas, também só crescem a cada episódio: Stan tem sua vida completamente mudada graças ao trabalho, Nina passa pelo mesmo graças a Stan, e Claudia, que pouco sabemos durante todo o tempo, tem um momento fantástico no season finale que lhe dá mais vida. Todos os excitantes acontecimentos de “The Americans” (que têm um charme especial por serem de uma trama de espionagem dos anos 80) nunca perdem de vista essa atenção e necessidade de afetar profundamente os envolvidos na história. E a segurança com que fazem isto numa trama tão bem amarrada e redonda, me conquistou.

Chances no Emmy: O consenso geral é de que “House of Cards” é a novidade com mais cara do prêmio, e que “The Americans” seria a segunda escolha. Gosto de acreditar que a ordem é inversa, com a série da FX causando uma empolgação muito parecida com a que “Homeland” teve ano passado – ambas tem espionagem, suspense, um casal protagonista intenso, um coadjuvante forte, surpreenderam na recepção crítica e de audiência. Se houver mesmo este entusiasmo, e a série da Netflix fracassar, é possível vê-la presente em quase todas as categorias: Série, Ator, Atriz, Ator Coadjuvante (Noah Emmerich) e em Direção e Roteiro. Emmy gosta de indicar pilotos nessas categorias e, apesar da estreia de “The Americans” ser mesmo muito boa, o season finale me parece mais impactante, que é basicamente o final de “Argo” estendido por 45 minutos de episódio.




1º - Rectify (Sundance Channel)

A primeira série produzida pelo Sundance Channel tinha todas as probabilidades de cair em algum dos cacoetes vistos em boa parte dos filmes que saem do Festival do mesmo nome do canal: obsessão pelo excêntrico na vida ordinária, sarcasmo, ironia ou até mesmo superioridade ao retratar pessoas comuns, visão excessivamente (ou pretensamente) poética ou exploração de sofrimento dos personagens. Mas não é o que acontece com “Rectify”, embora a série pareça correr este risco o tempo todo. A história do jovem condenado por assassinato e que passa 19 anos no corredor da morte até que novas evidências o colocam em liberdade poderia cair em armadilhas nos dois aspectos que fazem a série ser excelente. O primeiro, o próprio retorno de Daniel Holden para casa e sua readaptação: de coisas básicas como descobrir as mudanças nesses quase 20 anos (na sua cidade, e as tecnologias, filmes, videogames, etc.), passando por coisas mais complexas (relação com a família, sexo), a transformações fisiológicas (19 anos preso em uma cela causa problemas na visão pela falta de uso para distâncias maiores), Daniel reage a tudo em silêncio, isolado e experimentando as coisas a seu modo. Talvez seja tentador (e o próprio espectador pode querer que algo nesse sentido aconteça) colocar o personagem em alguns conflitos dramáticos, e lidar mais diretamente com o caso de assassinato (que continua em aberto, sua culpa ainda é considerada e pessoas farão de tudo para conseguir colocá-lo de volta na prisão), mas há uma surpreendente sensibilidade na decisão de transformá-lo quase num autista. Daniel é um total estranho no mundo e o risco de “poetizar” demais suas tentativas de se encontrar e conhecer este mundo são diminuídas por direção e fotografia precisas, e por um excepcional ator como Aden Young. São apenas seis episódios, e por mais que queiramos saber mais sobre o mistério principal (o piloto nos provoca neste sentido e o restante da série nos frustra), não é o momento para isto. A segunda armadilha que “Rectify” foge é a de uma visão superior ou julgadora dos habitantes daquele local. Pessoas religiosas, conservadoras e caipiras, nunca são retratadas com desdém, nem mesmo aquelas que podem ser vistas como vilãs. Isso permite desenvolver personagens e relações mais fortes, e é muito bonito o que se constrói a partir do encontro entre Daniel e Tawney na segunda metade da temporada. A conclusão é corajosa, pois não havia garantia ainda de que a série fosse renovada e não seria um final gratificante. Felizmente, veremos muito mais no ano que vem.

Chances no Emmy: Uma série pouco vista em um canal pequeno que não investe em divulgação. Poderia dizer nenhuma, exceto que consigo enxergar material perfeito para prêmios e que há precedentes: “Rectify” é anunciada como “dos produtores de ‘Breaking Bad’”, série que também quase ninguém conhecia e foi descoberta justamente no Emmy. É verdade que Bryan Cranston já era uma pessoa conhecida e querida, então acho que já posso dizer que a ausência de Aden Young da categoria de Melhor Ator será das maiores injustiças do ano.



 




Hélio Flores


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