terça-feira, 30 de março de 2010

[LOST] 6x09 Ab Aeterno

por e.fuzii
A primeira vez que Richard Alpert apareceu em Lost foi recrutando Juliet Burke fora da Ilha, no episódio Not in Portland da terceira temporada. Desde então, seu personagem mostrava-se cada vez mais intrigante, principalmente por sua misteriosa condição de não envelhecer. Cercado por imensa expectativa, Alpert ganhou seu esperado episódio apenas nessa última temporada -- que segundo os produtores é o momento "certo" -- e tinha toda a responsabilidade de ser um acertar de contas desse passado remoto da Ilha. Com mais de 150 anos de existência, histórias interessantes não faltariam. Porém, chega a ser triste constatar que escolheram um período sem apelo algum, mostrando os acontecimentos que levaram Ricardo até aquela Ilha "maldita". Sua história começa em Tenerife, que não por acaso é uma das Ilhas Canárias em que ocorreu o maior acidente aéreo de todos os tempos (como citado por Walter White no episódio de Breaking Bad da semana passada). Além disso, entre o povo local corre uma lenda que garante a existência de uma ilha fantasma, conhecida como San Borondón, que muitos confessam ter visto mas nunca ninguém conseguiu provar. Porém, esse fato não seria suficiente para prender minha atenção nessa história ingênua da época Vitoriana, relatando um caso de amor e perda na vida de Ricardo, tantas vezes vista em outras oportunidades. A questão não é a simples repetição, mas não me garantir envolvimento suficiente para, por exemplo, acreditar nesse caso de amor. Aliás, só mesmo o talento de Nestor Carbonell, que passou por tantos problemas para decididamente voltar à série, para salvar esse longo flashback do desastre completo.

Após ser condenado por um assassinato acidental e buscar pelo perdão nos caminhos da fé, sua grande oportunidade surgiu no "Novo Mundo" (que já nem era tão novo assim), embarcando como prisioneiro no navio Black Rock. Mas sua conturbada chegada à Ilha, em meio a uma dramática tempestade, não foi o final de seu sofrimento. Acompanhamos todo o intrigante suspense vivido por Alpert enquanto ainda preso no porão da embarcação. Provavelmente o momento mais interessante do episódio (além da discussão sobre "o que é a Ilha?" que tratarei mais adiante), quando todos os mistérios da Ilha apresentavam-se diante de seus olhos, mas ele continuava absolutamente imóvel sem poder explorar nada além de seu cativeiro. Um teste de fé, que depois converte-se no seu principal motivo para manter-se por tanto tempo nessa Ilha. Depois de batizado por Jacob, Alpert decide servir como seu representante e pede pela vida eterna, podendo assim finalmente redimir-se de seus pecados. No entanto, em razão de revelações insatisfatórias e um roteiro pouco inspirado, esse episódio infelizmente não conseguiu me cativar. Em respeito à série acabei até reassistindo antes de escrever, principalmente depois de tantos elogios que li da crítica especializada. Não costumo fazer isso, mas para manter uma certa organização e concisão, citarei aquilo que mais me incomodou em tópicos:

1) "Estamos no Inferno". Desanimei assim que Alpert disse que todos estavam mortos, o que provavelmente se estendeu pelo resto do episódio. Essa foi uma das primeiras teorias que surgiu por parte dos fãs -- apenas substituindo por Purgatório -- e nem consigo acreditar que a essa altura alguém ainda ouse brincar com isso. Mais inacreditável ainda é ver Alpert depois de 150 anos regredir a esse ponto, principalmente quando já vimos ele mesmo recrutando Juliet no mundo exterior e até visitando John Locke durante a infância. Fora isso, é no mínimo estranho que Alpert cogite mudar de lado repentinamente, quando há poucos dias atrás estava disposto a desistir de viver. Óbvio que essa crise só serviu para motivar seu flashback.
2) Richard Alpert é apenas outro peão. Depois de tantos anos ao lado de Jacob, minha última esperança era que pelo menos Alpert tivesse alguma noção do propósito de cada um ali. Mas ele decidiu surtar e sair correndo pela floresta. Pra dizer a verdade não chega a me incomodar esse jogo milenar, ou mesmo que Jacob e seu antagonista tenham sido introduzidos tão tarde nessa história. Até por dedicarem tanto tempo a essa realidade alternativa já é indício que os personagens tem importância nessa conclusão. Afinal, foi na geração deles que Jacob sucumbiu. Mas nesse ritmo não sei mais em quem confiar, se o próprio UnLocke parece continuar com suas manipulações. Se só nos resta confiar no que Widmore estiver disposto a revelar, aí sim estamos definitivamente todos perdidos.

3) Black Rock atropelando a estátua de quatro dedos. Como muitos já sabem, minha implicância com essa parte da mitologia pesada é antiga. Mas realmente espero que todos aqueles que gostam sejam ao menos recompensados com resoluções dignas. Essa situação, com certeza, não deve servir de exemplo. Se há alguns meses atrás algum fã tivesse aparecido com a teoria de que a estátua seria destruída na chegada do Black Rock, provavelmente seria ridicularizado. A questão não é dar respostas simples, como muitos tentam defender os produtores, mas ser útil no contexto geral da série. Afinal, antes mesmo do episódio, todo mundo já sabia que ali era a morada de Jacob e um indício de que outra civilização havia passado pela Ilha. Até o final, nada mudou. Mesmo o fato de Richard Alpert ter chegado a bordo da embarcação já podia ser deduzido há alguns episódios atrás, quando ele dizia estar revisitando aquele lugar. Também não me agrada que usem sempre essa mesma justificativa de que tudo foi desejo de Jacob, como no caso da tempestade que "atraiu" o barco. Aí já parece desculpa de roteirista preguiçoso…

4) Isabella. Com o perdão da comparação, essa personagem me lembrou a Harper que surgiu como terapeuta de Juliet em The Other Woman e nunca mais voltou a aparecer. Pelo menos sua aparição naquela ocasião, tentando convencer Juliet que deveria impedir a liberação de gás na estação Tempestade, foi bastante parecida. Sobrou até para Hurley bancar o intérprete sobrenatural e passar a mensagem do além para Alpert, usando a velha fórmula que já estamos cansados de ver: revelar um segredo que só os dois conheciam para assim convencê-lo da aparição verdadeira de sua amada. E antes que venham com pedras, sim acredito em casos assim, então não adianta vir reclamar de má vontade.
Diante de todas essas razões, diria que o episódio praticamente se anulou, deixando um saldo quase zero no final. Fiquei com uma sensação de desperdício, como se tivessem forçado Alpert a surtar pela floresta para no final reestabelecer sua condição inicial. Embora reconheça que seria difícil encaixar esse flashback anteriormente, acho que de certa forma o foco dado até aqui às realidades paralelas acabou sendo desviado também. A única coisa que realmente me pareceu interessante foi saber mais sobre essa dinâmica envolvendo Jacob e o Homem de Preto, revelando a estratégia de cada um para vencer esse duelo. Se não fosse até falta de respeito pedir pela saída de Terry O'Quinn, diria que faz falta ver Titus Welliver atuando também em 2007. Enquanto Jacob tenta trazer novos habitantes para a Ilha e provar que eles escolherão o "melhor" caminho, o Homem de Preto tenta a todo custo corrompê-los e eliminar seu antagonista. Numa inspirada comparação com a rolha que não deixa a maldade espalhar-se pelo mundo, Jacob acredita que mantém isolado o problema na Ilha. Mas falta entender por que estando morto, o UnLocke ainda precisa buscar pelo seu substituto. É interessante também tentar encaixar as histórias que acompanhamos até aqui nas regras desse jogo. Sabemos, por exemplo, que Locke recusou-se a matar seu pai, embora fosse um requisito para tornar-se líder dos Outros na época, e acabou fazendo Sawyer vingar-se de Anthony Cooper. No entanto, vemos que Locke teve seu nome riscado da lista de candidatos e James não. Talvez fosse uma questão de balancear o mal, retribuindo aquilo que sofreu, mas ainda tenho dúvidas se aqueles nomes na caverna são mesmo de substitutos de Jacob. Embora, como disse antes, acredite nesses personagens como peças fundamentais para sua conclusão -- e o plano independente de Sawyer só vem confirmar isso --, meu único receio é exagerarem demais nesse embate de "bem contra mal" e a série descambar para uma lição de moral no final. Seria provavelmente a forma mais frustrante de terminar a série, principalmente por tanto tempo proporcionar tamanha discussão a partir dos mais variados pontos de vista.

Fotos: Reprodução.

e.fuzii
twitter.com/efuzii

Um comentário:

Fellipe disse...

Olha também vou ser sincero, não fiquei tão impactado com o episódio quanto todo andou falando. A sensação que tive quando li os comentários nas comunidades foi que o errado era eu....rs

O que mais me incomodou foi a total falta de propósito do episódio! Tudo bem, desenvolveu mais um personagem e tal mas po, num flashback de 46 min custavam tambem ter coisas importantes?

Porque todo mundo já sabia que Richard veio do Black Rock! O que salvou mesmo o episódio foi o ator que faz o richard que passou muito bem a sensação de solidao, por exemplo na cena da em que ele fica sozinho no barco.