domingo, 13 de junho de 2010

[Breaking Bad] 3x11 - Abiquiu



Abiquiu é uma pequena cidade do Novo México, próxima a Santa Fé. Foi lá onde a artista Georgia O´Keeffe viveu boa parte de sua vida, numa casa cuja porta da frente foi pintada várias vezes por ela, e que futuramente viraria motivo de discussão entre Jesse e Jane. E é assim a introdução deste episódio de Breaking Bad, que mais uma vez nesta temporada tem início com um evento do passado, ainda não visto por nós.


Não é que a série mostre algo essencial para entendermos ou mudar nossa perspectiva de um acontecimento. Duvido que alguém, a esta altura, estaria preocupado em saber como Jesse conseguiu o trailer (1ª temporada) ou como Turtle perdeu sua cabeça (2ª temporada). Mas são lacunas que os roteiristas tem utilizado muito bem para estabelecer o clima dos episódios, criando pequenas pérolas como introdução. No caso deste "Abiquiu", relembramos a relação de Jesse e Jane, interrompida por uma das (muitas) tragédias resultantes da parceria entre Jesse e Walt. Com ótimo lero discutindo a importância da percepção de uma porta e uma linda e sedutora Jane, a abertura poderia ter sido coisa de Quentin Tarantino. Mostra também a origem daquela ponta de cigarro com o batom, visto no episódio anterior, que faz Jesse lembrar do quanto ele perdeu. E para quem não conseguiu situar este momento entre os dois, Jane queria levar Jesse para esta exposição, quando Walt o forçou para um trabalho de 4 dias perdidos no deserto (2x09 "4 Days Out"). Provavelmente ocorre imediatamente após seu retorno.


Já o episódio em si, foi mais uma aula de síntese e capacidade de avançar a trama da forma mais coerente e surpreendente possível. No comentário do episódio anterior, eu disse que o que movimentaria este fim de temporada era Jesse roubando as sobras da droga para vender por fora, e concluí: "Ou não, já que ser imprevisível é característica única de Breaking Bad". E, de fato, os roteiristas tiraram inesperadas cartas da manga, com a tentativa de Jesse apenas levando pra algo muito mais intenso.



É incrível a retomada do assassinato de Combo. Lembro que tinha achado curioso mostrar um garoto assustado como assassino (em 2x11 "Mandala"), pensando imediatamente nestes rituais de iniciação a que estamos acostumados nos filmes/séries que abordam o tráfico. Na época, parecia um detalhe sem maior importância. Agora, Jesse se envolver com Andrea, irmã de Tomás, é mais uma prova de que TUDO e TODOS nesta série importam, nada é irrelevante.


O acaso, a sorte ou o destino. Não importa. Se por um lado, Breaking Bad sempre deixa claro as conseqüências dos atos de seus protagonistas, há este componente quase místico que é uma constante na série e que permanece como elo mais forte de ligação entre os eventos, um resultado que emerge e que é muito maior que a soma das partes. Como a combinação certa de palavras que poderia fazer o casamento de Walt funcionar (episódio anterior) ou a combinação certa de ingredientes que produz um cheiro especial para Gus (neste episódio). Jesse e Andrea, Walt e o pai de Jane, a queda do avião, a bala que salva Hank: encontros/colisões/ligações que produzem algo novo, fascinante e misterioso. Algo como a química.


E como todo encontro é uma novidade, isso vale também para os encontros que se repetem. Como Jane nos lembra no início do episódio, sobre a porta de O´Keeffe nunca ser a mesma, embora Gus, ao final, pense exatamente o contrário, ao lembrar Walt que não dá pra cometer os mesmos erros.


E a tônica do final de temporada será esta, com a aparente paz de Walt sendo ameaçada pelos novos planos de Jesse, que com uma vingança em execução torna tudo bem mais estimulante (e provavelmente sanguinário) do que a mera contravenção de vender a "blue meth" para dependentes em recuperação.



Se isso é o que mais chama a atenção neste momento da trama, não menos importante é a participação cada vez mais ativa de Skyler nos negócios de Walt, já sedimentando as bases para a quarta temporada. Após passar duas temporadas grávida e preocupada com um marido com câncer, a personagem teve maior evolução este ano, descobrindo (parcialmente) a verdade sobre Walt, vingando-se (não tão) friamente de tudo que sofreu, ao mesmo tempo satisfazendo seus desejos por Ted Beneke, flertando com a ilegalidade e, tal como o marido, escondendo da família tudo que vem fazendo - e, não tenho dúvidas, com bem mais sofrimento que o Mr. White. Agora, após fazer com que Walt pague as despesas médicas de Hank, usa esta preocupação como desculpa para ajudar o marido na lavagem de dinheiro.


Claro, a preocupação de Skyler com o fato de o cunhado ser financiado por dinheiro ilegal certamente é legítima, mas já a vimos tentada a perdoar Walt, logo quando ele assinou os papéis de divórcio, mostrando que ainda existe afeto - e ela, por sua vez, não assinou, já antecipando a lei que prevê que um cônjuge não pode depor contra o outro. Skyler se preocupa e diria que é até submissa aos homens de sua vida (lembrem-se de que se dispôs a ajudar Ted na sonegação fiscal sem exigir nada em troca) e me parece um percurso natural da personagem.




Disto, resulta um dos momentos mais engraçados do episódio, que é quando ela conhece Saul. Skyler não sabe o que sabemos dele, então sua reação não poderia ser outra. Se já não basta os diálogos serem inspirados, ficam ainda melhores por não termos como duvidar de que Saul já deve mesmo ter convencido alguém de que é Kevin Costner, ou que a estúpida ideia de que cientistas gostam de lasers realmente pode funcionar. Bob Odenkirk faz valer cada segundo em tela, e eu poderia ver uma série só sobre Saul Goodman.


Falando em humor, não dá pra deixar de citar Badger e Skinny Pete que, na tentativa de vender a droga, estão (de maneira meio torta) entrando no programa de reabilitação - e Badger só conseguiu vender para Pete! Um episódio como este é para aplaudir os roteiristas que, após um episódio focado em apenas dois personagens, consegue condensar em 46 minutos subtramas que envolvem todos os personagens que mais importam na série. Pois ainda tivemos o início da recuperação de Hank (tão irritado que nem mesmo questiona com que dinheiro estão pagando os equipamentos médicos instalados em sua casa) e mais uma presença de impacto de Giancarlo Esposito que, como Gus, consegue meter medo mesmo quando é para ele que uma faca super afiada está apontada.




Mais dois episódios para o final.




Hélio Flores

twitter.com/helioflores

3 comentários:

Bruno Maciel disse...

Saul Goodman deveria ter uma série propria mesmo! huahuahahuaha

Unknown disse...

Vim em 2016, dizer que seu desejo é uma ordem!

Tips en finanzas disse...

Eu gosto de cada uma das temporadas. Um fator que coloca essa série acima das demais é a proposta original de seus criadores para o protagonista Walter White (Eu certamente sabia que Bryan Cranston terá uma participação especial em Curb Your Enthusiasm ). Em tempos de múltiplas telas conectadas, em que a disputa pela atenção do espectador passa por um vaivém frenético entre redes sociais, canais de televisão e sites, Breaking Bad fisgou a todos com uma mistura antes vista apenas em grandes obras da literatura e do cinema. Enquanto a maioria das séries de TV começa sem saber onde vai parar, dependentes do humor implacável da audiência, Breaking Bad teve início, meio e fim definidos desde o primeiro dia. Seus criadores tiveram a coragem, e a sagacidade, de seguir o plano original, construindo tijolo por tijolo uma história convincente e angustiante, que pega o telespectador pela gola e o obriga a assistir a cada episódio com frequência religiosa. Breaking Bad não teve o destino de tantas séries que foram canceladas antes de florescer, como Firefly, muito menos teve seu prazo de validade prolongado e por consequência uma queda brutal de qualidade por fazer sucesso demais, como Prison Break. Não. Breaking Bad caminha para um pouso perfeito.