domingo, 6 de junho de 2010

[Spartacus: Blood and Sand] S01E09 - Whore

por Rafael S


Quando já era costume ver Spartacus: Blood and Sand e seus títulos sempre pomposos, eis que esse nono episódio subverte essa regra, com um simples (mas potente) Whore. Ou simplesmente Puta, na nossa língua materna. Um capítulo, como era de se esperar, focado nas gloriosas mulheres da série. Afinal, aquela sociedade não vivia apenas de sangue e areia, e o sexo era o grande responsável por desencadear os mais diversos acontecimentos. Aliás, não só naquela época, mas isso é assunto para outro texto.

Depois de tempos difíceis, a sorte voltou a sorrir para Lucretia. A falência já era um fracasso distante, desde que o ludus do seu marido tinha se enriquecido graças aos triunfos de Spartacus. Crixus, seu amante, já estava recuperado e não ia mais ser vendido, e sua amizade com Ilithyia havia lhe rendido sua entrada no círculo de amizades influentes dela. E a prova desse sucesso foi cair nas graças de Licinia (Brooke Harmon), prima do famoso Marcus Crassus. Um contato muito mais poderoso do que a própria Ilithyia e seu marido Claudius Glaber. E ambiciosa do jeito que é, ela começou a cultivar essa nova amizade como lhe fosse a coisa mais preciosa, já pensando nos frutos que podia colher no futuro. E enquanto domina daquele ludus, com todos aqueles saudáveis guerreiros a sua disposição, ela viu a oportunidade de satisfazer todos os desejos sexuais reprimidos de Licinia. E assim, com toda a discrição e sigilo possíveis, ela começou a exercer seu papel de "cafetina".

E para servir como objeto sexual, foi escolhido ninguém menos que nosso personagem principal, o campeão de Cápua. Já tendo aparentemente enterrado o antigo Spartacus, e consequentemente, as memórias de Sura, ela aceitou o duro trabalho. E para garantir que o gladiador na falhasse na hora H, lhe foi designada uma escrava para ele treinar. E assim foi introduzida Mira, que já apenas em um episódio mostrou não ser mais uma mera figurante, e sim uma potencial personagem a mudar a vida de Spartacus, já que depois dos desentendimentos iniciais, alguns laços já foram criados entre os dois. Tudo se encaminhou para ela ser um possível interesse amoroso para o herói, mas nesse mundo cruel da série, nunca se sabe se ela viverá o suficiente para isso. Vale destacar também a coragem da atriz Katrina Law em se entregar logo de cara a tantas cenas de nudez total em apenas um episódio, já se equiparando (e em alguns casos, superando) todas as outras atrizes do elenco regular em quantidade de pele mostrada.



Foi bem interessante como o episódio trabalha a todo momento o fato de como o sexo como elemento de controle, em vários níveis e contextos diferentes. Além do já comentado uso dos gladiadores para satisfazer entediadas mulheres da alta sociedade romana, o capítulo mostrou como aos poucos Varro está perdendo as estribeiras depois da grave briga com sua mulher. Na esperança de um perdão, ele apelou para a ajuda do ganancioso Ashur, que cada vez mais se mostra o traidor que é, aqui vendendo informações a Solonius sobre o atentado que Batiatus planejava contra ele - vejam só - marcado para acontecer enquanto ele estivesse com uma de suas prostitutas. E falando no Ashur, me surpreendeu ao vê-lo tentando ser gladiador novamente, algo que realmente não esperava que acontecesse. Mas ao vê-lo tendo seus planos frustados, tudo me pareceu apenas um recurso para alimentar seu desprezo por Batiatus, e justificar sua ida para o lado do Solonius, em uma rivalidade que atualmente ocupa o segundo plano da série, mas que tem tudo para estourar com o fim da temporada se aproximando.

E como toda mulher ganhou seu espaço, era de se esperar que Naevia ganhasse um pouco mais de presença de tela. Ela, talvez a única personagem de toda a série que se encaixe naquele estereótipo romântico, continuou firme com seu amor proibido por Crixus, aguentando vê-lo transar com Lucretia quase que diariamente, mesmo com apenas pequenos momentos de contato com o lutador às escondidas. Mas aqui ela teve seu momento, ao finalmente ter uma oportunidade a sós com seu amado. É o núcleo mais chatinho da série, com direito até a crises de ciúmes, mas o fator Lucretia na jogada é uma bomba relógio prestes a explodir.

E falando nela, é inegável como o brilho maior do episódio é dela. Ela pode aparentar toda aquela classe e calma, mas no fundo é uma mulher ambiciosa em plena ebulição, sempre pensando dois passos a frente de todos. E mesmo ao lado de um oportunista tão grande quanto Batiatus, ela provou dessa vez porque é superior. Ao trazer Licinia para perto, despertou toda a inveja de Ilithyia, que após ter apresentado as duas, começou a se sentir rejeitada (isso sem contar no fracasso do seu plano do episódio passado). Mas pior que qualquer atentado, o grande erro de Ilithyia dessa vez foi ter mexido com o homem de Lucretia - Crixus - e pedir por uma noite de sexo com ele. Foi o bastante para a Domina despirocar de vez e executar talvez o plano mais engenhoso de toda a série até agora, e botar em uma mesma cama Ilithyia e Spartacus.



Sim, os dois personagens que mais se odeiam. Ela, responsável por influenciar Claudius Glaber a se vingar do trácio, e tramar sua morte. Ele, responsável por humilhá-la na frente de todos. Um ódio declarado, mas que se transformou em um sexo selvagem, com suas identidades cobertas por máscaras (cena que lembrou muito o filme De Olhos Bem Fechados, do Stanley Kubrick), em uma conveniente troca orquestrada por Lucretia. E quando a troca foi descoberta, lá estava ela ao lado de Licinia, para rirem da desgraça dela ao entregar seu corpo para seu maior desafeto. E o que veio a seguir foi na minha opinião a cena mais forte da série até agora. Posso estar até soando repetitivo, muitos dos meus textos destacam uma nova "cena mais violenta", mas é incrível quantas barreiras os diretores, roteiristas e produtores estão dispostos a atravessar para mostrar todo esse grafismo. Em um torpor de puro ódio, ao se ver violada pelo homem que tanto odeia e ver sua amiga Licinia gargalhando de sua desgraça, ela simplesmente esfacelou o crânio dela em um degrau, batendo sua cabeça repetidas vezes contra o chão até tudo virar um grande amontoado de sangue e carne desfigurados. No meio de tantas batalhas sangrentas nas arenas, o ápice da violência veio do encontro entre duas mulheres, fruto dos jogos sexuais orquestrados por Lucretia. De cair o queixo a cena.

E em uma cena arrebatadora, Lucretia tomou Ilithyia em seu colo, lhe prometendo abrigo e proteção. Também assustadora pelo turbilhão de emoções que é Lucretia, indo da fúria a aparente calma, mas nunca sem deixar de estar pensando adiante em seus planos ambiciosos de poder. E o grande mérito vai para a Lucy Lawless, que teve seu grande momento na série nesse capítulo, dando toda a dimensão a essa personagem. Em um episódio praticamente ausente de lutas, as mulheres mostraram sua força e fúria de um jeito arrebatador, deixando os homens em mero segundo plano, como marionetes nesse turbilhão de emoções.



Em uma época lembrada nos livros por grandes governantes e guerreiros, as mulheres com certeza foram mais importantes do que a História tratou de lembrar, e foram responsáveis por muitos acontecimentos nas entrelinhas. Controle o sexo e controlará o mundo. Viva as putas.

Fotos: Reprodução



Rafael S
http://twitter.com/rafaelsaraiva

Um comentário:

Rodrigo Ferreira disse...

Mais uma ótima crítica.

Concordo que o plano de Lucretia foi um dos mais elaborados e cruéis da série. E a frieza com que lida com a situação após esta sair do controle é de deixar qualquer um de boca aberta (ou continuar com ela assim, depois da cena do assassinato brutal).

Aliás, sobre a violência explícita da cena, ela me lembrou muito outra morte brutal que ocorre no início do filme Irreversível, onde um sujeito mata o outro com um extintor de incêndio, e a cena inteira é filmada sem cortes, e sem a câmera se desviar da cabeça da vítima, que é destruída diante dos nossos olhos.