segunda-feira, 11 de outubro de 2010

[Mad Men] 4x11 Chinese Wall

alguns episódios atrás, Faye Miller cita a muralha chinesa, que evita o conflito de interesses entre diferentes empresas, quando Don Draper pede informações sobre sua reunião com outros clientes. Pete Campbell, numa cena incluída nas recapitulações do próprio episódio, reforça a dificuldade de manter os negócios separados de sua vida pessoal. Estas parecem ser as duas leituras possíveis para o título do episódio dessa semana. Desde o começo da temporada, até mesmo através da nova estrutura do escritório com suas divisórias transparentes, a transgressão destas barreiras vinham sendo bastante exploradas, estabelecendo-se como um de seus principais temas. Don enfrentava um processo de separação que ocasionou todo tipo de desconfiança e insegurança dentro e fora de seu trabalho. Na semana passada, a investigação do departamento de defesa sobre seu passado quase gera um escândalo capaz de colocar todos os negócios da empresa em risco. Por isso até me espanta que um episódio busque a essa altura examinar de forma tão escancarada este tema, até certo ponto trivial na maioria das séries de televisão americanas. Mas sinto que o principal interesse era estabelecer este paralelo entre todo o histórico de Roger e as atitudes mais recentes de Don.
Roger sempre teve problemas para respeitar essa linha que separa sua vida pessoal da profissional, como no seu caso com Joan que se estende até hoje e o casamento com Jane, a ex-secretária de Don. Chega a ser irritante acompanhar sua postura de rendição, mostrando-se tão ultrapassado para lidar com esse abandono que ainda parece preso ao episódio anterior, esforçando-se para proteger um segredo que nem existe mais. Mas vale destacar a habilidade de interpretação de Roger ao fingir falar ao telefone ou mesmo arrumando uma falsa viagem para renegociar com a Lucky Strike. Curioso também notar como Roger é o único entre os personagens principais a ainda fumar em cena -- Joan ameaça, mas não chega a acender um cigarro. Por toda a influência que a Lucky Strike exercia sobre a empresa e nos próprios personagens, sua saída deve certamente significar novos rumos para muitos deles, talvez até uma chance de aproveitar a própria metáfora de se enxergar com maior clareza além de toda a fumaça. Roger procura pelo conforto nos braços de Joan, mas ela decide dar um basta nessa relação por precisar de tanta ajuda quanto ele ("não sou a solução de seus problemas, sou apenas mais um problema"). Resta a Roger voltar para casa, onde é logo recebido por Jane com uma surpresa: a publicação por conta própria de sua biografia. Mas isso não seria capaz de consolá-lo. Aliás, talvez o maior golpe a sua moral fosse justamente não conseguir vender os direitos nem de sua vida pessoal e nem de suas experiências profissionais. Assim, Roger entrega o livro com a dedicatória mais impessoal possível para Jane, valorizando seu papel apenas como esposa, e tem de engolir toda sua vaidade antes de finalmente abraçá-la.
Apesar de ser uma cena já recorrente dentro da série (basta lembrar de Pete e Trudy na semana passada), não é coincidência que Don Draper termine da mesma forma abraçando Faye Miller. Mas ele vive uma situação bem mais turbulenta. Afinal, é ele quem tem de segurar o rojão enquanto Roger e Lane estão ausentes e Cooper continua servindo apenas como mera figura na SCDP. Em meio a toda essa confusão, além de tentar forçar Faye a quebrar sua ética profissional para ajudar a empresa, Don cai nas graças de sua secretária Megan. E por fim, acaba bem sucedido nos dois casos: Faye resiste mas marca uma reunião com um de seus insatisfeitos clientes e Megan age com extremo desapego em relação ao sexo casual em sua sala. Assim como Allison, ela também desconfia que Peggy tenha usado do mesmo plano para alcançar sua posição atual, mas não se ilude esperando por um compromisso sério. Assistir Don Draper colocando em risco o relacionamento mais sólido que teve desde sua separação chega a ser doloroso, principalmente pela mudança de Faye Miller ao longo da temporada. Se antes ela bloqueava todas as suas investidas e previa cada um de seus truques, agora está disposta a arriscar tudo por essa paixão. Nem é preciso se esforçar muito para prever que esse relacionamento deve terminar de forma desastrosa, trazendo prejuízos tanto para Don Draper quanto para a SCDP.
Mas não foi apenas neste paralelo entre Don e Roger que os limites pessoal/profissional foram testados. Para começar, a faísca que desencadeia todo esse incêndio na SCDP surge justamente quando Ken Cosgrove está jantando com a família de sua noiva (e espero que Ray Wise tenha maior presença daqui pra frente) e encontra um colega da DDBO que resiste antes de contar sobre a mudança de agência da Lucky Strike. Já Peggy reencontra Abe através de Joyce (outra vez) e terminam selando as pazes em seu apartamento. Se não me engano é a primeira vez que Peggy acorda no dia seguinte com tanta satisfação estampada no rosto. Mas ela mesma constata que sua felicidade pessoal precisa ser deixada de lado enquanto a empresa vive esse momento de crise. Evitando o assédio de Stan e até superando mais uma de suas brincadeiras, Peggy consegue impressionar os clientes com uma apresentação digna de Don Draper, usando suas próprias sensações para valorizar a campanha. Enquanto isso, Pete divide seu tempo entre a SCDP e a sala de espera da maternidade. Depois de perder a conta da Glo-Coat, Don chega a acusar Pete de estar displicente para lidar com tantos problemas, esquecendo de tudo que ele foi capaz de fazer para salvar sua pele na semana passada. A ironia maior é que mesmo após receber a notícia do nascimento de sua filha, Pete decide seguir ao funeral de um respeitado publicitário em busca de novos clientes ainda fragilizados. O discurso de seus colegas descrevem um homem que se entregou ao trabalho e teve poucas oportunidades de mostrar carinho por sua família, assim como a maioria dos personagens que conhecemos na série. Para aumentar ainda mais o clima de terror, Ted Chaough aparece na maternidade oferecendo a Pete uma oportunidade de se tornar sócio da CGC. Talvez fosse o caminho mais fácil para assegurar o futuro de sua família, antes de ser tragado junto de uma possível falência. Mas certamente Pete seria a última pessoa que a SCDP gostaria de ter como concorrente, já que ele seria um dos poucos a ter informações confidenciais suficientes para derrubar quaisquer muralhas chinesas que fossem colocadas em seu caminho.

Fotos: Reprodução.

e.fuzii
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