segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

LF Carvalho quis ser maior do que é...

A minha expectativa para com Capitu era a melhor possível. Não ouso questionar o talento e a maestria de LF Carvalho. Ele é um homem profundo, convicções sólidas e, indubitavelmente, é dono de uma estética própria.


Mas eu já temia a possibilidade dele querer ser maior que Machado de Assis. Ele quis. A presunção já começara em "A Pedra do Reino", daí meu temor. Mas achei que depois daquele tropeço, daquele elitismo absurdo e patético, ele iria "cair na real" e dirigir algo com a inteligência, o respeito e a competência que sempre teve. Ser autoral não significa ser maior que o autor. :)

Lembro-me especialmente de "os Maias", texto difícil, mas com um elenco soberbo e com a humildade de jamais se tornar maior que a obra, ele conseguiu realizar um dos maiores momentos da TV brasileira.

Também há de se lembrar "Hoje é Dia de Maria", nunca me esquecerei da cena na qual Maria torna-se mulher. Ali aquela "teatralidade" já estava na nossa cara, mas parecia tão coerente, tão fresca...tão acessível.

Mas não funcionou em "Capitu". Já questiono o título, afinal, se é fiel (apesar de mutilado, claro) ao livro, se é Bentinho o narrador. Se é sob os seus olhos que "enxergamos" a história. Porque diabos colocou o nome da moça no título?

Mas esse é o menor dos problemas da microssérie. O que pegou mesmo foi a arrogância de LF Carvalho. Detesto concordar com o Diogo Mainardi, mas ele tem razão. Capitu foi circense e isso não cabe em Machado de Assis. Toda aquela caricatura, todo aquele teatro. Não, não em "Dom Casmurro". Nuances foram perdidas, atores ficaram sem função. O texto foi absurdamente fragmentado. Cinco dias de série? Sendo que três na infância? Que risco! Que má escolha. Que decisão boba.

Destaco Michel Melamed como Dom Casmurro em alguns momentos, sobretudo os mais tocantes, quando ele se dissipava da roupagem cartunesca que Carvalho o aprisionou. E o seu Bento claramente seguiu a doçura do jovem ator, César Cardadeiro. Letícia Persiles me encantou. E, pasmem, ao contrário do que eu pensava, foi ela a responsável pelo caráter dúbio de "cigana oblíqua" e "olhos de ressaca" de Capitu. Maria Fernanda foi engolida por Melamed. Pena. Lindíssima, mas perdeu texto e espaços muito importantes. O que um diretor egocêntrico não faz...prefere que a estética sobreponha o trabalho essencial de seus atores.

Ahh Luis Fernando, quanta vaidade! Os melhores momentos da série não lhes pertence. Exagerei. Pertencem sim. A trilha sonora divina e emocionante. Beirut com Elephant Gun pontuando o romance, acho que poucas pessoas não se emocionaram. A escolha do elenco. Mas infelizmente não deixou que seus atores defendessem os papéis com o que Machado colocou no seu texto.

Eu esperava mais. E a partir de agora espero menos, cada vez menos, do senhor.


Danielle M

7 comentários:

e.fuzii disse...

Dani,

Não sei se a intenção do Carvalho era ser controverso, mas ele conseguiu movimentar toda a crítica do país com sua micro(mini, nano, sei lá)série.
Não acho todo esse desastre e toda essa "apropriação indevida", apesar de concordar que seria facilmente utilizado como base para um espetáculo do Cirque du Soleil...

Devo colocar minha opinião aqui no blog ainda essa semana.

Anônimo disse...

Ah, Dani, eu gostei.

Apesar de A Pedra do Reino ter sido quase indecifrável (parecia um David Linch, algo como Cidade dos Sonhos) eu não me decepcionei com o LFC. Desde que ele começou a fazer experiências em telenovelas eu confio nele. E o que ele fez em Lavoura Arcaíca é de não esquecer nunca.

Uma coisa que gosto no particlar estilo dele é que, embora constante, não é repetitivo. Talvez Capitu ficasse muito bom de fosse adaptado à maneira de Os Maias, que foi ótima, mas seria para mim o óbvio: "século antigo, homens de cartola e mulheres de vestido armado". E é sempre bom lembrar que ele foi "obrigado" a enfiar no meio da trama de Os Maias um outro livro do Eça, A Relíquia. Tanto é que no DVD essa parte está totalmente cortada. O cara, convenhamos, é perfeccionista ao extremo e sofreu para entregar o primeiro capítulo de Os Maias editado de um jeito que gostasse. Ou seja, já havia o risco dele ousar com alguma maluquice daquela vez.

Quando ele fez Hoje é Dia de Maria ele então tinha cacife para fazer o que bem quisesse. E para uma obra que não era conhecia ele pegou todo mundo de calça curta. Quando fez a Segunda Jornada vi muita gente reclamar porque era diferente da primeira. A vontade de inovar estava mais uma vez ali na cara e provocando sem economias. Na época vi muitos comentários de pessoas que brindavam a inovação televisa da primeira jornada e reclamavam da segunda. Ora, como brindar por inovar uma vez e depois reclamar porque re-inovou o que já fizera?

Mas, a despeito do novo, A Pedra me venceu pelo sono e nem gravei tamanha a sensação de perdido que eu fiquei naquilo, inclusive abandonei no segundo episódio. Um dia verei o DVD, como prometi pra mim mesmo. Não sei se vou entender, mas vou tentar com a calma que a pausa do controle remoto proporciona. :)

Quanto a presunção creio que o LFC não tem nenhuma. Eu vi uma apresentação especial do Lavoura com ele e o Raduan comentando respectivamente o filme e o livro. Ele só demonstrou sensatez naquela noite e aparentava uma reverência profunda com o verdadeiro dono da obra, sentado ao lado dele. Para mim foi bom saber que ele não é um autor-persona chato.

Depois desse tete-a-tete entre criador e adaptador eu não vejo ele como alguém que tenta ser maior que o Machado. Muito pelo contrário, mesmo com as modernices provocativas que colocou (de moderno trem suburbano à mp3) ele respeitou Dom Casmurro no que tinha de mais profundo, a visão unilateral.

Primeiro que usar apenas os diálogos do original e não inventar nada, como é comum em adaptações, ele se livrou de críticas referentes ao revisionismo. De novo, se fosse fazer tal qual Os Mais seriam uns vinte e tantos capítulos e com centenas de diálogos inventados para contextualizar e dar corpo dramático para as cenas.

Outro acerto é o Bento idoso, moribundo, que narra e assombra a própria história. Como também é certo a fragmentação. O livro é fragmentado por natureza (foi publicado aos pedaços, diariamente) e ele somente acelerou para a velocidade dos nossos tempos. Tornasse, por exemplo, o narrador uma voz off e aquilo seria um tédio radiofônico.

Quanto aos erros eu temi quando descobri que a Maria Fernando Cândido seria a Capitu. Ela é de beleza invejável, mas não sabe atuar no campo das sutilezas. É o tipo de atriz que cai bem apenas para um tipo específico de personagem. Por outro lado, que boa surpresa foi a Leticia Persiles, não é? Eu fiquei tão vidrado em sua atuação e nos seus olhos que nos quatro episódios não vi a polêmica tatuagem dela. Juro. E vi a dita cuja no primeiro dar de ombros desnudos da Maria Fernanda. kkkk

Talvez a coisa que mais se perdeu foi a irônia. Claro que o Melamed resgatou o que pôde com a sua indescutível competência. Contudo, no livro você vê os toques irônicos e se mata de rir, ali na série não dá, porque o sabor da ironia pede uma pausa e não é como uma piada que se ri e se parte para a seguinte. Ironia é o sentido da vida. Coisa mais machadiana não há.

Quanto a um lado cartunesco não o vi. Circense talvez. O que vi foi teatro. E voltando ao que o LFC tem como estilo, é um teatro que não funciona num palco. É um teatro para ser feito com a cumplicidade de uma câmera, com a manipulação da edição de imagens. Desde sempre o LFC manipula o ambiente/locação para valorizar os personagens e as idéias por trás deles.

Essa "montagem" de Dom Casmurro pode ser comparada a uma ópera (como frisou o próprio protagonista), mas eu concordo somente se for uma ópera bufa, onde talvez o circo se faça presente. Mesmo assim nâo considero o tom tragicómico um erro aqui, tem tudo a ver com a cumplicidade entre o narrador e expectador.

Agora, tem o erro inexistente, que eu também caí quando soube da escalação da Maria Fernanda e me preocupei à toa. Todo mundo sabe que a obra trata do ciúme por Capitu, acontece que a maior parte dela fica nas lembranças da infância. Em certo momento, lá no livro, o narrador pede desculpas por ficar tempo demais nas lembranças da juventude e não ir direto ao "assunto". E dando uma de Escobar na aritmética, em 148 capítulos a fase adulta começa no de número 98, restando somente 50. Esses quase um terço foram praticamente proporcionais na série. Em termos de páginas é menos que isso, vinte por cento. Nessa brevidade, Capitu adulta, perdeu apenas três diálogos curtos. Fica a dúvida. LFC escolheu Maria Fernanda por causa estética? Pode ser, ele sabia que o original determinava apenas uma fala extensa, de mais de cinco linhas; o resto era o Casmurro, e nisso ela já possuía o Melamed.

Claro, na fase adolescente César Cardadeiro, como Bentinho, transmitiu toda a manipulação que sofreu das pessoas que amava.

Sobre os outros atores e personagens todos caem no mesmo padrão. Coube a eles o que as falas do texto determinavam. Com tão "pouco" eles se sairam muito bem. Qualquer algo mais para eles cairia no problema de inventar, de ações as falas, para passar ao expectador aquilo que somente o narrador Casmurro relatava deles. Acontece que as falas eram as caricatura dessas pessoas, ou o que era público, o resto era análise do Bentinho. Machado sempre faz a crítica da sociedade nas falas dos personagens.

Quando soube que Dom Casmurro seria adaptado por LFC já imaginava algo assim, e depois que vi os teasers tive a absoluta certeza que seria mais uma vez fora do padrão comum. No final, fiquei feliz ao descobrir que não era uma obra hermética.

Resumindo, eu gostei do que vi. Adorei o muro riscado no chão. Apaixonei-me pela Leticia. Nunca mais poderei ouvir Elephant Gun sem achar que Capitu entrará sala adentro para palpitar meu coração, pulei do sofá com Ezequiel no caixão ou quase bebendo o veneno. E as nuances de Melamed foram de grande contribuição ao texto.

Luiz Fernando Carvalho não traiu seu estilo, seja ele simplificado de supra-teatral ou circense. Creio também que não ofendeu Machado de Assis, pois um autor de texto moderno não gostaria de ser adaptado de forma comum. Em todo caso seria interessando ver o encontro desses dois e o Machado perguntar para o LFC: - Por que você fez desse jeito?

Ooops, escrevi demais.

Unknown disse...

Pois é Paulo, o livro é uma miscelânia das reminiscências de Dom Casmurro. Os capítulos são curtos mesmo, sim. Mas a obra na TV ficou ainda mais fragmentada e o recurso da infância por 3 dias, mesmo que no livro a maior parte da história fique nesta fase, não cumpriu, na minha opinião, a idéia de "vai e vem" da história, daí a dúvida persistente. Convenhamos, desta maneira que foi mostrada por LF, fica clara a traição de Capitu. E de onde ele tirou tal clareza, for God Sack?

No primeiro capítulo fiquei encantada, mas o "circo" me cansou mesmo. Como leitora de Machado, esperava que a "estética" do autor que ficasse. O gênio é ele.

Unknown disse...

Moderno por moderno, que contasse a história sob a ótica de Capitu, o que me fez pensar num primeiro momento, devido ao título.


O texto estava lá, mas pareceu manco, mutilado. Voltei ao livro várias vezes. Sinceramente, não sou uma purista no texto, mas Machado de Assis merecia que a visão unilateral como vc diz, fosse contada com todas as nuances possíveis, seca, sombria, irônica e, muitas vezes, reflexo de um homem que admite-se fraco. Não vi isso lá. Vi uma Capitu culpada. Isso pra mim já é crime suficiente.Pq LF preferiu ser moerno, ser teatral, ser não sei o que. Saí frustrada sim.

Porém, fiz ressalvas, pq realmente gostei do elenco.

Anônimo disse...

Também escrevi um texto sobre CAPITU no blog e confesso que concordo com quase tudo o que a Danielle escreveu.

Para mim, a série pareceu tecnicamente correta, porém cansativa demais, já que essa visão teatral (quase circense) já está mais do que saturada.

Anônimo disse...

Dani, isso do LFC ter tomado partido do Casmurro na traição eu não sei se é correto. Na verdade, é uma questão sem fim.

Quando ele nos mostrou, por exemplo, um Ezequiel com a cara de Escobar não necessariamente ele "matou" a charada secular.

Qual seria a solução? Mostrar uma feição parecida com Bento? Aí seria tomar partido de Capitu.

E qual seria a solução imparcial? Não mostrar o rosto do filho?

Eu prefiro crer que tudo o que foi mostrado na série é da mesma maneira que se lê nas páginas do livro, ou seja, é a versão de um pertubado e não se pode acreditar como lei.

Polêmicas à parte, deixa eu voltar para meu livro de páginas amareladas, porque o que vale mesmo está aqui dentro. O resto é outra coisa que nunca será igual ou fidedigno.

bjs

Fellipe disse...

Bom, confesso que não li o livro e nem conseguir ver um capitulo inteiro!
Isso porque posso dizer que estava chato! Muito forçado, gosto de uma produção mais elaborada mas..essa só estava tentando parecer intelectual! Duvido que tenha dado boa audiencia!
Os únicos pontos bons foram as escolhas de camera.
Ah! ainda teve aquele cabelo nada ver do moleque!