segunda-feira, 20 de setembro de 2010

[Mad Men] 4x08 The Summer Man

Com a chegada do verão de 1965 e a mudança de clima, Don Draper finalmente sente a necessidade de também mudar. Nadar, inspirar, expirar. Aproveitar o silêncio confortável quando imerso. Apreciar novos perfumes e sabores. Enfim Don Draper sente-se livre, até mesmo quando dormindo, estirando-se na cama como se estivesse voando em uma asa-delta. A mudança mais significativa, até no tom da própria narrativa, talvez sejam as palavras escritas em seu bloco de notas, procurando entender melhor suas impressões do mundo. Confesso ter certa resistência com esses voice-overs pontuando cada ato, mas entendo como sendo um exercício (e não uma "muleta") para o protagonista. A medida que vai desintoxicando seu corpo, evitando a constante embriaguez, Don passa a ganhar uma maior clareza, sensibilidade. Até um breve convite para apreciar uma bebida gera um efeito de vertigem, através do conhecido dolly zoom de Hitchcock. Mas não espere que será mais fácil desvendar Don Draper neste estado sóbrio e revelando o que se passa em seu interior. Logo de cara ele já alerta para sua pouca habilidade com as palavras, que se traduz no frequente uso de taglines publicitárias ao longo de suas memórias. Finalmente ele tem de encarar as consequências do final de seu casamento quando encontra Henry e Betty num jantar e acaba forçado a buscar suas últimas coisas na antiga casa. Don abandona todas essas lembranças no primeiro lixo que encontra pela cidade, como se quisesse esquecer de todos aqueles anos perdidos. Mas depois de ouvir os conselhos de Faye Miller, ele passa a reconsiderar e provavelmente valorizar aquilo que ainda é capaz mudar: o futuro de seus filhos. Nada mais admirável do que este homem independente aparecer na festa do pequeno Gene, enfrentar os olhares mais suspeitos dos antigos vizinhos e se mostrar disposto a reverter a condição confusa e desesperadora de seu nascimento.

Por outro lado, Betty não pode nem sonhar em desfrutar desta mesma independência, como bem reforçou a primeira visita nesta temporada de Francine, a vizinha que serve de voz para o pensamento da sociedade suburbana da época. O que parece despertar todo esse ódio em Betty é a impressão de que seu ex-marido estaria "vivendo a vida" mesmo enquanto ela ainda mantém a família unida, razão que deveria causar em Don a mais profunda depressão. Nem é preciso dizer o quanto Betty é imatura, até mesmo quando repreendida por Henry pelo mesmo motivo, mas não deixa de ser compreensível sua reação no restaurante diante da digressão de Don com uma versão mais nova de si mesma. Se por um lado ela se sente ferida por ser tão facilmente substituída, por outro lado se esquece que foi a primeira a buscar por um substituto para seu próprio marido. Mas assim que Don aparece de repente na festa do filho, Betty sente certo alívio por reconhecer a preocupação dele com a única coisa que ainda tem em seu poder. E para Betty isso já é suficiente para ficar com a falsa impressão de ter tudo na vida.
Porém, Betty não foi a única mulher a enfrentar problemas com o sexo oposto neste episódio. Na SCDP, aquela tensão existente entre Joan e Joey desde o início da temporada finalmente veio à tona agora. Joey abusa de sua condição de freelancer para não se prender às antigas e burocráticas convenções de trabalho. Até mesmo sua perplexidade ao ser demitido por Peggy demonstra uma tendência a tratá-la de igual para igual, encarando esta decisão como uma traição a sua amizade. Mas fica impossível justificar qualquer uma de suas pesadas brincadeiras e principalmente a denúncia de que Joan andaria pelo escritório pronta para ser estuprada. Além disso, essa lembrança chega numa péssima hora para ela, justamente quando deveria aproveitar os últimos momentos ao lado de seu marido, preparando-se para ser enviado a um treinamento de guerra. Se já era frustrante perceber que estava perdendo a influência dentro do escritório, Joan chega a se desesperar por sua vida pessoal também estar saindo de seu controle e se sentir cada vez mais sozinha. Quando Joan enfim decide responder à altura, com um discurso atacando o orgulho daqueles rapazes, descarrega também todas as suas frustrações em relação à guerra no Vietnã. Por isso, em qualquer outra série a demissão de Joey seria vista como o triunfo final para essas mulheres. Mas em Mad Men basta um simples encontro de Joan e Peggy no elevador para essa situação transformar-se num delicado anti-clímax. Ponderando sobre a influência dessa decisão precipitada de Peggy, Joan está certa em concluir que ela acabava de admitir tudo aquilo que os outros funcionários desconfiavam. Talvez essa demissão poderia ter sido contornada com atitudes mais sutis e persuasivas para obter os mesmos resultados, conforme a fábula de Aesop citada por Faye Miller durante seu primeiro encontro com Don.

Interessante como Don decide adotar este mesmo método cauteloso para tentar conquistá-la. Depois de ter sido rejeitado por tantas vezes, e ouvir por acaso a discussão acalorada com seu ex-namorado, basta um convite providencial para Don acabar recompensado com um encontro de verdade. Faye não é um mero passatempo como Bethany, aquela que espera ansiosa pelo próximo chamado de seu pretendente. Ela precisa de cuidados. Por isso, é sinal de clareza que Don consiga se adaptar, surpreender oferecendo seu casaco e até recusar uma proposta de selar esse encontro. Afinal, Don Draper está disposto a saborear até seus novos relacionamentos. Ou simplesmente porque prefere continuar dormindo sozinho mesmo. Se todas essas mudanças serão duradouras e suficientes para uma redenção ainda é muito cedo dizer. Principalmente porque mesmo que se esforce para adquirir a velha forma há sempre alguém já preparado para uma próxima volta.

Confira também o texto do Hélio Flores para esse episódio.

Fotos: Reprodução.

e.fuzii
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