domingo, 16 de novembro de 2008

[True Blood] Primeira Temporada

Esse post é longo: comentários dos primeiros dez episódios da nova série da HBO "True Blood", criada por Alan Ball, roteirista vencedor do Oscar por "Beleza Americana" e criador de uma das grandes séries de todos os tempos, "A Sete Palmos". A série é sobre vampiros e tem feito a cabeça de muita gente com uma abordagem mais séria dos seres mais amados do mundo do Terror.



Há bastante sangue e mortes, como deveria ser, mas o que importa é o retrato de um mundo em que a existência desses charmosos mortos vivos interfere diretamente na vida dos seres humanos, que no fim das contas continuam os mesmos, intolerantes ao que é diferente, curiosos e sedentos por sexo, tentando buscar conforto nas drogas e na religião para seus demônios pessoais.



Os comentários abaixo são breves e tentei evitar spoilers ao máximo. De qualquer forma, se você não conhece a série, sugiro que veja primeiro. Há quem não goste dos primeiros episódios, por achar que "True Blood" flerta descaradamente com o trash, mas o conceito e a proposta da série ficam claros pra mim desde seu início. Inclusive com a bela abertura, a melhor elaborada desde "Dexter": o estranhamento causado por imagens desconexas que nos remetem a sexo, violência, rituais religiosos e lutas pelos direitos civis, ao som de "Bad Things" de Jace Everett, mostra que não estamos diante de uma série qualquer.



Vejam e tirem suas próprias conclusões:









1x01 - Strange Love (Piloto)

Pilotos sempre são episódios difíceis: os autores da série precisam estabelecer conceitos, apresentar personagens, criar algo na trama que faça com que o espectador retorne para os episódios seguintes; atores nem sempre acham o tom certo para seus papéis, etc. Nesse sentido, o piloto de “True Blood” tem mais acertos do que erros. Todo o conceito é bastante interessante e ele já nos é apresentado antes mesmo dos créditos iniciais quando ficamos sabendo que os vampiros não só existem como lutam por direitos de convivência com os humanos. Algo possível apenas porque foi criado um sangue sintético que alimenta os mortos vivos sem que haja a necessidade de fazer dos humanos suas vítimas. Com uma representante dos vampiros em rede nacional defendendo seus direitos, impossível não pensar nos X-Men e sua luta pela aceitação dos mutantes. Ou seja, a série estabelece desde já uma tensão entre raças diferentes que obviamente trará discussões sobre diferenças e preconceitos. Os créditos iniciais também deixam isso claro, trazendo imagens estilizadas que nos remetem ao sul dos EUA (onde a discriminação contra os negros sempre foi maior), local onde a série se passa. Os créditos, aliás, fazem um belo apanhado que nos remetem a sexo e violência, elementos igualmente explorados neste primeiro episódio, flertando muito com os gêneros trash e gore que fazem a alegria de muitos fãs de filmes de terror. Os efeitos especiais são toscos e a oscilação por esses gêneros talvez seja o aspecto mais crítico do piloto, certamente afastando muitos espectadores, mas o estranhamento (possivelmente até pela dificuldade em já determinar um tom para a série) me pareceu positivo. Junta-se a isto a protagonista Sookie Stackhouse (vivida justamente por Anna Paquin, de “X-men”) que, apesar de humana, não é nada comum, tendo o dom de ler pensamentos. É a relação de Sookie com um vampiro que chega na cidade onde ela mora, o cerne da série, que nos apresenta fatos sobre a realidade abordada de forma tranqüila e aos poucos. A série ainda traz outros personagens, mais interessantes (o engraçado irmão de Sookie que logo de cara se mete num grande problema) ou menos (a melhor amiga da protagonista, um tanto “engraçadinha” demais cuja atriz não tem o timing necessário). No final, uma situação bem ruim para a protagonista, mas não muito original, onde já sabemos o que irá acontecer. Para um primeiro episódio, era necessário algo mais impactante. Ainda assim, estimulou o interesse pela série.

1x02 - The First Taste

Após no primeiro episódio Sookie descobrir que não pode ler os pensamentos dos vampiros (o que torna Bill ainda mais fascinante para ela), é a vez de Bill descobrir que o poder de hipnose dos vampiros não funciona em Sookie. Uma das coisas que mais me agrada neste início de série é como a mitologia dos vampiros e as características dos protagonistas são entregues em pequenas doses, a depender da necessidade da trama. Aos poucos vamos percebendo que tudo que já conhecemos sobre vampiros está lá, inclusive o fato de que só podem entrar numa casa se forem convidados. Também aos poucos ficamos sabendo a relação dos familiares e amigos de Sookie com seu dom, além de rápidos flashbacks elucidarem algumas questões. Mas enquanto o relacionamento de Sookie e Bill se intensifica, o maior interesse fica por conta do crime envolvendo Jason, cuja resolução é surpreendente e engraçada. Também estabelece um mistério que deve ser central nesta temporada. Um episódio com menos elementos trash que o anterior, explorando também a tensão que causa a presença de um vampiro dentro de casa e aproveitando ao máximo situações “reais”, caso realmente os vampiros existissem: o interesse da avó de Sookie em uma pessoa tão velha que possa contar sobre a Guerra Civil, e a irritação de Tara por Bill ser uma prova “viva” de uma época em que os negros eram escravizados. Para completar, o episódio explicita o aspecto “sangue” da série: se já sabíamos desde sempre da importância do sangue humano para os vampiros, agora ficamos sabendo porque Mack e Denise queriam o sangue de Bill – não só é um potente estimulador sexual para os humanos, como é capaz de cicatrizar rapidamente ferimentos graves e aguçar os sentidos.


1x03 - Mine

Sookie tem o desprazer de conhecer alguns amigos vampiros de Bill, sendo um deles o homem que Jason conhece do vídeo de Maudette. Nesta seqüência, mais uma descoberta: uma certa Hepatite D é a única doença que afeta os vampiros, deixando-os fracos e à mercê dos humanos. O episódio é o mais próximo até agora do que fãs de Alan Ball esperam do criador de “A Sete Palmos”: lento, apostando em muitas cenas de diálogos que constroem relações entre personagens e nos dá a oportunidade de conhecê-los melhor. Não que as conversas tenham sido brilhantes, mas “True Blood” começa a ter um rumo mais distante do terror trash que parecia seguir. Ainda assim, continua um divertido flerte com o nonsense, em especial quando a série foca em Jason, como quando ele é expulso da casa de Dawn à base de tiros ou a forma como consegue de Lafayette um pouco de sangue de vampiro. Um bom episódio que com narrativa lenta vai desenvolvendo situações que certamente terão relevância no futuro. E como os dois episódios anteriores, este acaba com Sookie em mais uma situação delicada, desta vez enfatizando o que já sabíamos: um possível serial killer ronda a cidade. Humano ou vampiro?


1x04 - Escape From Dragon House

Um episódio mais coeso, que equilibra bem humor, mistério e tensão. Finalmente conhecemos o bar para vampiros, Fangtasia, já mencionado por Maudette e Dawn em episódios anteriores. Sookie e Bill vão até lá para tentar descobrir alguma pista sobre o verdadeiro serial killer e livrar a cara de Jason. O bar, como não poderia deixar de ser, é um antro de sexo e alguma violência, onde humanos buscam saciar suas fantasias mais perversas com vampiros. Conhecemos Eric, dono do bar e o vampiro mais antigo do local. Personagem misterioso, acho que o episódio falha apenas em fazê-lo assustador, já que o ator Alexander Skarsgard não faz uma caracterização das mais interessantes. A idéia de vampiros vivendo entre nós rendeu mais situações curiosas, como quando Bill pede O Negativo no bar e a garçonete responde que só está tendo A Positivo. O episódio ainda traz a inusitada (e dolorosa) conseqüência de Jason ter tomado uma enorme dose de V (sangue de vampiro), além de colocar Sam no centro das atenções em relação ao assassinato de Dawn. O fato de Sookie poder ler pensamentos pode trazer dificuldade para os roteiristas: mesmo com a promessa que ela faz de evitar ler pensamentos de amigos e parentes, é incômodo aceitar que ela não faça isso quando o irmão corre o risco de ser preso. E ficou claro que ela percebeu que Sam tem a chave da casa de Dawn, o que no mínimo o torna suspeito. De qualquer forma, por enquanto é aceitável. Vamos ver como isso se sustentará durante a série.


1x05 - Sparks Fly Out

Finalmente o grande evento ocorre. Bill vai discursar na igreja local, falando sobre sua experiência na Guerra Civil. Uma seqüência interessante que serviu para conhecermos um pouco de seu passado (principalmente como ele se tornou vampiro), quebrar mais alguns mitos sobre vampiros de forma divertida (símbolos cristãos não os atingem, e eles aparecem sim nas fotografias) e flertar um pouco com a ambigüidade: prefiro acreditar que a história que Bill conta sobre o antepassado de um dos moradores seja mentira, um subterfúgio que usa para ganhar a simpatia da população. Sim, porque foi piegas demais e quero crer que a série destila um certo veneno na sociedade americana, podre de patriota quando diz respeito à guerra e memória de seus mortos. Ambíguo também é a relação de Sookie com seu dom de ler mentes: ela realmente não se importa ou não consegue diferenciar o que é dito e pensado, ou ela é simplesmente burra? Revelar que lê mentes para o detetive Andy no momento em que tenta inocentar o irmão foi de uma bobagem incrível. Falando em Jason, o personagem continua protagonizando os momentos mais divertidos da série, desta vez totalmente chapado com o V que bebeu mais uma vez. Ou, como diria Lafayette, pela primeira vez realmente. Os efeitos do sangue de vampiro é um dos pontos fracos até agora: uma enorme dose fez apenas aumentar sua libido, enquanto uma gota alterou sua percepção da realidade. Mas não aguçou seus sentidos, como a grande quantidade de sangue de Bill fez com Sookie, que, aliás, se livrou dos efeitos muito rapidamente (durou apenas um episódio). Enfim, o uso do V nos personagens está variando de acordo com a finalidade dos roteiristas. Quanto ao mistério que envolve a morte de Maudette e Dawn, os detetives vão interrogar Bill, que derruba em definitivo as suspeitas de que o assassino seja um vampiro: se fosse, os corpos teriam o sangue totalmente drenado, o que direciona nossas atenções para Sam, que Sookie diz pensar de forma diferente dos seres humanos “normais” (pensa como um psicopata, talvez?). No mais, destaque para a atenção dada ao cachorro antes dos créditos iniciais (por que o animal interessa tanto à série?), e o momento romântico de Bill, que chora sangue ao relembrar a esposa. Foi outro momento piegas que parece ter o objetivo de criar empatia do personagem com o público – saber que se tornou vampiro por ser um cavalheiro só aumenta isso. O final foi o mais surpreendente até agora, por não esperarmos quem seria a próxima vítima.


1x06 - Cold Ground

Mais um bom episódio da série que desenvolve algumas subtramas que, por enquanto, não dá pra saber no que vai dar: Sam e Tara mais uma vez encontram conforto no sexo, Jason mostrando dependência do V, e a mãe de Tara que ressurge com a estranha idéia de “diabo no corpo”. Em uma série como “True Blood”, sabe-se lá no que isso vai resultar. Quanto a Sookie, o assassinato de sua avó a fez se sentir mais isolada, com Jason e toda a comunidade a culpando por ter se envolvido com um vampiro. Pelo visto, nem toda a simpatia que Bill gerou com seu discurso no episódio anterior fez com que o preconceito diminuísse. Algumas cenas foram muito boas: a tristeza e o isolamento de Sookie representados pela limpeza do sangue na cozinha e pela torta da avó; o desespero de Bill por não poder ajudá-la enquanto a noite não chegasse; e, claro, a entrega final com direito a degustar o sangue de uma telepata. Sem dúvida, um episódio de transição para coisas maiores que estão por vir.




1x07 - Burning House of Love

Um episódio cheio de tensão, focando em três tramas: Tara e sua mãe buscando solução para um demônio; Jason e seu vício por V; e o retorno dos amigos de Bill. Quando a mãe de Tara já estava se tornando extremamente irritante, fomos presenteados com uma seqüência de exorcismo que torna a presença do sobrenatural na série algo bem ambíguo. Tudo indica que se trata de mais um comentário social que a série faz, em especial a dúvida que a exorcista coloca na cabeça de Tara (a religião culpando um mal externo pelos nossos problemas), mas será interessante ver como os personagens vão lidar com isto. Na outra referência crítica a outro ponto-chave de nossa sociedade (drogas), Jason está passando de personagem cômico para trágico na sua obsessão por V, que o fez tomar a perigosa decisão de ir ao “Fangtasia”. Lá conhece uma maluquete que o apresenta a uma nova forma de uso do V, curiosa alusão a cocaína. Também é outra trama que espera por maior desenvolvimento. Por fim, os vampiros amigos de Bill foram responsáveis pelo momento mais tenso do episódio, quando uma chacina no Merlotte parecia ser inevitável. A decisão de Bill foi o clichê dos clichês, até que o resultado final nos levou a um bom cliffhanger. Outro destaque do episódio foi a descoberta do ódio de Sookie por seu tio, que mostrou um Bill bonzinho, mas nem tanto. Poderia ser um gesto moralista dos autores da série (o vampiro bom só mata aqueles que merecem), mas é de se notar também como a protagonista tem feito coisas que seriam impossíveis numa série moralista: em apenas sete episódios, Sookie já se envolveu com dois homens na série, transou com um deles (um vampiro), deixou que ele sugasse o seu sangue e anuncia isso para as pessoas feliz da vida, sem arrependimentos. Uma mocinha moderna, sem dúvida.


1x08 - The Fourth Man in the Fire

A resolução do problema criado no final do episódio anterior não foi dos mais interessantes e o romance entre Sookie e Bill continua. Claro que fazer com que os protagonistas tenham uma noite de sexo no meio de um cemitério torna tudo melhor e ousado. O casal também tomou conta dos filhos de Arlene, momento cute-cute da série. O evento principal do episódio foi o pedido de ajuda que Eric fez a Sookie. Embora o motivo não tenha sido dos melhores, as conseqüências levam a série a outros rumos e o misterioso serial killer se torna apenas um dos muitos caminhos que o roteiro pode seguir. Tara e Jason também avançam para suas próprias complicações. Ela chega ao ápice de seu nervosismo e o resultado positivo do exorcismo de sua mãe a leva a pensar seriamente em fazer o mesmo. A discussão entre ela e Lafayette sobre o suposto golpe foi interessante, em especial o sábio comentário de Lafayette sobre o exorcismo ser mais barato que anos de Zoloft: no fundo, o que importa é se a crença leva a bons resultados. Já Jason está na situação dramática clássica do personagem que se mete em encrencas por conta do vício. Desta vez, sua mais nova amiga quem o leva para o mal caminho e os problemas só se acumulam. De resto, é interessante como a série consegue arranjar espaço para todos os coadjuvantes: Arlene sendo pedida em casamento, o comportamento suspeito de Sam investigado por Andy, como Lafayette consegue V e o trágico fim do rapaz que, já sabíamos, se relacionava com vampiros. Uma das grandes qualidades de “True Blood” é esta capacidade de explorar coadjuvantes interessantes, sem sacrificar o ritmo da trama principal.


1x09 - Plaisir D´Amour

A seqüência inicial foi bem ruinzinha, capenga de ritmo e tensão, com Bill salvando a vida de Sookie e entrando numa enrascada por matar um vampiro. Ao menos serviu para vermos Anna Paquin banhada de sangue a la Carrie, A Estranha. O problema dessa enrascada é que em nenhum momento do episódio, as ameaças de Eric soaram assustadoras e mesmo o adeus de Bill não ficou com cara de despedida. Jason, por sua vez, também caminha para uma trama não muito interessante. Sua conversa com o vampiro seqüestrado serviu apenas para plantar a idéia de que Amy é bem mais perigosa do que aparenta, no caso mais que clichê do mocinho que se apaixona por mulher boazinha que no fim das contas vai se mostrar uma psicopata. No mais, o episódio ficará marcado pelo seu final surpreendente que amplia o universo da série. Eu já sabia que aquele cachorro ia ter bastante relevância na trama, mas até onde isso vai parar? Muito do que acontece em “True Blood” só pode ser avaliado ao final da temporada, pois cada novo elemento que surge, cada desenvolvimento bizarro que aparece só deve fazer sentido ou ter uma justificativa quando o todo estiver completo. E aí sim, vamos saber o quão boa foi toda a história. Enquanto isso, fico satisfeito pela curiosidade que a série me deixa para acompanhar os próximos episódios.


1x10 - I Don´t Wanna Know

Com o segredo de Sam finalmente revelado, a mitologia da série se estende. Certamente em breve veremos até mesmo lobisomens (espero que apenas na segunda temporada). Este foi um dos melhores episódios até agora, com todas as tramas muito bem amarradas. Com as revelações de Sam, o exorcismo de Tara ficou ainda mais interessante, por não sabermos até que ponto aquilo faria sentido dentro do mundo de “True Blood”. Mas a conclusão não parece fazer conexão com todo o resto da série (eu já estava esperando que Tara levasse Sookie para um exorcismo), de qualquer forma foram momentos tensos e de boa atuação de Rutina Wesley. Já Jason continua se complicando no relacionamento com Amy, que mostrou suas garras neste episódio, no segmento que acho menos estimulante da série. O julgamento de Bill, por sua vez, foi muito melhor com um cenário ideal para o que imaginamos ser um julgamento de vampiros. Tudo bem que a pena do Magistrado não foi muito dura com uma justificativa das menos plausíveis (e ele nem quis saber por que Sookie é especial e Eric precisou de sua ajuda!). Mas a melhor notícia foi a participação de Zeljko Ivanek no papel do Magistrado. Ele, que acaba de ganhar um Emmy pelo belo trabalho na série “Damages”, cumpre perfeitamente a função de um vampiro assustador que Alexander Skarsgard não consegue no papel de Eric. Espero que apareça mais vezes. Sookie não teve muita participação neste episódio, além de se irritar com Sam e Tara, mas a perseguição final ao menos revela que o serial killer não é mesmo um vampiro, com seus pensamentos “lidos” por Sookie através de imagens. Só espero que os roteiristas não queiram ser apenas surpreendentes e não elejam um coadjuvante gente boa como Terry ou Rene, por exemplo, para cumprir essa função.





Hélio.

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