
Acho que ficou bastante claro que este episódio tratou basicamente de diversas modalidades de vergonha, seja no papelão de Roger frente aos japoneses da Honda como na pequena Sally cometendo obscenidades na casa de sua amiga. Aproveitando esse tema e tomando como base a "cartilha" dos japoneses, Don Draper executa um plano para reverter a má impressão deixada por Roger e de quebra eliminar um de seus mais novos concorrentes. O grande problema é o quanto essa trama precisou ser enxuta para caber em um só episódio, algo até pouco comum na série. Além disso, estas questões de desonra e decepção são sempre recorrentes no cinema oriental e ainda mais quando vista sob o olhar estrangeiro. Entendo que essa superficialidade pode ter sido intencional, principalmente numa época em que recomeçava a aproximação entre americanos e japoneses, até mesmo através do livro que dá nome ao episódio. Porém, nada justifica a forma como Ted e os japoneses foram mal tratados pelo roteiro, servindo apenas de meros recursos para Don Draper prevalecer. É preciso algo mais elaborado para reestabelecer sua genialidade, como sempre reconheci. Terminou parecendo um episódio tradicional de House, com uma certa benevolência com o protagonista que normalmente me preocupa, embora Mad Men sempre tenha lidado com isso de maneira bem natural.
Mas houve outra cena quando isso também me incomodou. Após dois episódios longe da série, Betty aparece em sua primeira cena desferindo um tapa no rosto da pequena Sally. Apesar de claramente transformá-la em vilã para assim Don parecer com uma imagem de pai "melhor", confesso que ainda fico em cima do muro para interpretar essa atitude. Até porque isso provavelmente seria visto como algo normal na época, assim como a grosseria de Roger quando invade a reunião com os japoneses. De qualquer forma, faltou sutileza durante grande parte do episódio, como Pete entrando na sala de Roger para tirar satisfação e escancarando que ele estaria com receio de ser deixado pra trás. Como se já não ficasse ambiguo o suficiente quando Roger deixa a reunião dizendo estar satisfeito com a Lucky Strike. Outra participação que me irritou bastante foi a constante presença de Mrs. Blankenship como alívio cômico, quebrando o ritmo de várias cenas. Se era para transmitir leveza no roteiro, passaram do ponto. Até porque sem chance de Don Draper aguentar viver com esse tormento por tanto tempo, ainda que conformado com a punição por não saber lidar com uma secretária mais jovem. Já todo o rancor guardado por Roger durante tanto tempo me pareceu adequado. Além de ser consequência também da propaganda na época da guerra, seu sarcasmo sempre mostrou certa dose de intolerância, como na vez que cantava com a cara pintada de preto.
O que achei mais interessante foi como aquele tema de privado/público da semana anterior apareceu também na trama envolvendo Sally. Afinal, ela se escondeu para cortar o cabelo e foi acusada (injustamente) de masturbar-se em frente à amiga. Posso imaginar como deve ter sido difícil dar instruções à pequena atriz de como reagir em cena. Enquanto Sally se mostra cada vez mais rejeitada pelo pai, a ponto de chamar atenção e querer ficar parecida com uma de suas namoradas, ela está cada vez mais exposta a todo tipo de situação que ainda não é capaz de compreender. Some isso às constantes ameaças e mesmo agressões para termos um legítimo caso a ser tratado pela Dra. Edna. Na breve entrevista em seu consultório, Betty reforça suas inclinações infantis não só se mostrando à vontade com a psicóloga -- que faz questão de ser chamada pelo nome --, como ao final olhando fixamente para a casa de bonecas, ao mesmo tempo satisfeita por ter colocado tudo em ordem em sua própria casa e irritada pela filha não reconhecer/valorizar isso. A decisão de focar a tensão na sala de espera em sua primeira visita, quando Betty também não faz questão de estar presente, também pareceu um acerto, principalmente por manter a privacidade de sua sessão.
Outros dois momentos brilhantes do episódio aconteceram exatamente quando os personagens puderam "respirar" melhor em cena. No primeiro deles, Joan aproveita sua intimidade de longa data com Roger para convencê-lo de que deveria se orgulhar por ter ajudado a fazer um mundo melhor. Ela mostra novamente toda sua competência sabendo separar seu lado profissional do pessoal e agindo com extremo otimismo, mesmo que a iminente partida de seu marido à guerra seja tudo o que ela mais teme na vida. No outro momento, Don Draper encontra Faye Miller na cozinha da SCDP após um longo dia de trabalho. Se a relação dos dois sempre esteve abalada por divergências profissionais, ambos encontram um ponto em comum quando começam a compartilhar seus segredos. E Don aproveita como nunca se viu (ao menos com uma mulher) para revelar seus receios e aflições em relação aos filhos. Ainda fragilizado, ele termina sozinho sem nem mesmo tentar chamá-la para sair. Parece questão de tempo para aprofundar esse envolvimento, que começo a considerar cada vez mais benéfico para Don. Seria por saber agora a verdade por trás do falso anel de casamento? Ou porque, como diria Peggy no grupo de pesquisa, ela é muito boa para lidar com as pessoas?Falando em Peggy, não posso deixar de destacar minha cena favorita do episódio, quando ela finge estar gravando o comercial no estúdio. Uma garota sobre uma motocicleta vermelha andando em círculos num cenário branco. Poderia ficar horas e horas vendo essa imagem e posso garantir com certeza que é melhor do que grande parte da publicidade veiculada atualmente.
(retirado de bestweekever.tv)Fotos: Reprodução.
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Fiquei bastante impressionado logo na primeira cena pela 


Todo o episódio foi construído através de paralelos, não só no mais notável deles, carregando cada diálogo e gesto de Pete com seu passado envolvendo a gravidez de Peggy, mas também em situações mais abrangentes como casamentos e negócios. Joan se sente rejeitada por não participar da pesquisa de grupo com as solteiras, enquanto Peggy tenta provar o anel de Faye sob o olhar surpreso de Don Draper, que por sua vez continua a se afundar em sua vida pós-divórcio, sem nem mesmo conseguir colocar em palavras. Allison tenta comparar sua situação com a de Peggy, que trata de deixar bem claro que nunca teve os mesmos problemas. E em lados opostos sentam-se os dois antigos oponentes Pete e Ken, comparando a visão de suas atuais empresas. Mas é motivado pela estratégia de Ken que Pete descobre finalmente como reverter a rejeição à Clearasil, chantageando seu sogro para conseguir uma conta ainda maior.

Se o pilar no meio da sala não permitia que Pete tivesse visão clara das coisas (e é interessante que ele só consiga resolver seu problema quando deixa o escritório), para Peggy o pilar serve de confortável encosto na festa, apresentando a contra-cultura em toda sua essência. Logo que percebi o interesse de Joyce pensei que sua provável investida serviria para pegar Peggy de surpresa, mas pelo contrário, ela prontamente responde com uma sacada desconcertante. Mesmo que muito à vontade, ela ainda se mostra insegura diante de tantas ameaças ao seu conservadorismo. Apesar de apreciar o filme e as fotos de nudez por exemplo, Peggy logo se reprime dizendo ser católica e imaginando a reação da mãe de uma das modelos.





Já dizia aquele batido poema que circula todo final de ano por e-mail (erroneamente atribuído ao Drummond), que trata-se de um gênio aquele que teve a ideia de industrializar a esperança através da divisão do tempo em anos. É cercado por este espírito de renovação que acompanhamos na Sterling Cooper Draper Pryce os dias que antecedem o ano de 1965, normalmente ocupados com ponderações, balanços e resoluções para o futuro. Porém, que esperança resta quando o novo ano já chega prometendo inevitáveis más notícias? Se é fato que elas sempre são as primeiras a chegar, os três personagens principais deste episódio fazem de tudo para tentar adiá-las. Após sua reprovável conduta no episódio anterior, Don Draper busca refúgio na Califórnia para reencontrar Anna, a única pessoa a demonstrar por ele amor incondicional. Mas depois de revelada sua grave condição de saúde, Don acaba preso nos mesmos dilemas que o levaram até lá, e foge de volta a Nova York. Lane Pryce continua tentando colocar a empresa em ordem e sua fixação pelo trabalho acaba afastando cada vez mais sua esposa. Na tentativa de reparar seus erros, termina por agravá-los, chegando ainda mais próximo do divórcio. Já Joan tenta cumprir todos os preparativos para poder engravidar, mas seu futuro com Greg continua incerto. Parece questão de tempo até que ele seja mandado para o Vietnã e sabe-se lá que fatalidade lhe aguarda assim que chegar.
De volta a Nova York, a história toma um rumo completamente diferente quando Don Draper convida Lane Pryce para conhecer seu estilo de vida, buscando por diversões pela cidade. Bêbados, os dois partem para perturbar uma sessão de Gamera, com um hilário Lane gritando em falso japonês para o público. Depois de jantarem e assistirem a um show de stand-up, ambos terminam no apartamento de Don na companhia de duas prostitutas. Se isto poderia representar o perigo de Lane cair nas mesmas tentações que Don, na manhã seguinte essa preocupação parece dissipada quando ele faz questão de pagar por sua acompanhante e indaga como é ter esse nível de intimidade com uma delas. Don, obviamente, não sabe responder. Lane agradece as distrações, mas volta a focar sua atenção aos problemas da empresa e de seu casamento. Assim, damos adeus a 1964 sem grandes celebrações, cumprimentos ou contagens regressivas, apenas com a ressaca do primeiro dia do ano, tomando conta de todos ao redor da mesa de reuniões da SCDP. Sejam então todos bem vindos ao ano de 1965, esperamos que apesar de tudo seja mais um ano magnífico.
Joan liderando uma fila de Conga, o que mais preciso dizer?
Enquanto isso, Don Draper mostra que apesar de sua bem sucedida entrevista para o jornal, tudo não passou de uma performance muito bem ensaiada e pouco mudou na sua vida prática. Assim que as perguntas do questionário psicológico ganharam um caráter mais pessoal, até Lane Pryce previa com um sorriso maroto que Don daria um jeito de escapar da sala. Ele é o retrato perfeito de alguém fragilizado por essa época do ano, a ponto de um dos funcionários pela primeira vez considerá-lo patético. Talvez a admiração mostrada por Peggy no episódio anterior também fosse a forma que ela encontrou para agradá-lo, ou ela ainda é uma das poucas a depositar confiança no chefe. Depois de todos os casos que acompanhamos de Don Draper enquanto estava casado, era difícil prever que seu comportamento mais reprovável viria quando já estivesse divorciado. Ainda mais envolvendo sua secretária, motivo pelo qual já havia se desentendido com Roger na época em que se separava pra ficar com Jane. Mas por incrível que pareça, tudo não passou de um mal entendido. Afinal, se Don Draper havia falhado nos encontros com sua vizinha enfermeira e a mulher da empresa de pesquisas, principalmente por elas sempre se anteciparem às suas investidas, por que Allison seria convencida então? A intimidade entre os dois que só vinha crescendo -- a ponto dela se envolver até nos seus assuntos familiares pós-separação --, a promessa de uma "bonificação" no final de ano, a partida súbita de Don da festa esquecendo a chave no escritório, um pedido de ajuda no meio da noite. Não seria capaz de condenar Allison por considerar essa sucessão de eventos uma elaborada cantada de Don para chegar àquele momento a sós em seu apartamento. Acredito que até passou pela sua cabeça que esse relacionamento teria desdobramentos futuros, ou pelo menos para que Don não passasse as comemorações de Ano Novo sozinho. Mas se este evento não passou de um equívoco, o mesmo não pode ser dito da atitude de Don Draper no dia seguinte. Allison veste-se com suas melhores roupas, trata de providenciar os presentes de seus filhos e mostra uma alegria contagiante, mas é recebida por Don como se nada tivesse acontecido. E para piorar, ele ainda entrega com a maior frieza o bônus por seus "serviços" prestados ao longo do ano. Com certa ênfase nos serviços, a secretária foi rebaixada ao posto de prostituta nas horas vagas. Pobre, Allison.






